No limiar do arranque dos anunciados Jogos Africanos em Maputo – estamos a seis meses da data prevista para o início do certame – no seio da Selecção Nacional de Boxe vive-se um ambiente conturbado. Os atletas acusam o treinador e os dirigentes federativos de “corrupção”. Falam em “enriquecimento ilícito dos dirigentes com base no esforço dos atletas” e reclamam pela “falta de condições de trabalho”. Na visita ao ginásio onde os atletas da selecção nacional de boxe se preparam para representar a bandeira nacional no mês de Setembro próximo, pude constatar que trabalham em condições miseráveis. Falta um pouco de tudo. Ringue em condições falta. Faltam luvas, protectores de dentes, conquilhas, alimentação adequada. Até “subsídios”. Tudo está escasso para os jovens que se treinam para defender as cores da tantas vezes badalada “Pátria Amada”. Os atletas que falaram contaram que as condições em que treinam no ginásio da Escola Secundária Francisco Manyanga, em Maputo, “são deploráveis”. “Luvas, sacos, conquilhas, protectores, até medicamentos para assistência dos atletas em caso de lesões nos treinos, não estão disponíveis”. “Só nos dão paracetamol e diclofenac”, disse um dos atletas. Depois desta informação reportada pelos atletas, uma deslocação ao ginásio onde treina a selecção nacional. De facto, a pobreza absoluta do País está reflectida na selecção nacional de boxe. Para o leitor ter a noção do que se passa com os atletas nacionais desta modalidade, basta dizer-se que alguns deles treinam descalços por falta de sapatilhas ou botas próprias. Quem tem equipamento de treino, tem-no por conta própria. Da federação da modalidade, os atletas nada receberam.“Disseram-nos que nos queriam levar para comprar sapatilhas das calamidades para os treinos, mas nunca se efectivou”, disse um dos atletas, informação esta que viria a ser confirmada pelo treinador da modalidade, Lucas Sinoia.Os atletas de boxe reclamam ainda pela “falta de alimentação adequada”. Segundo contaram, por dia, eles têm direito a um almoço e um lanche, para um dia repleto de treinos.“Treinamos das 5h às 7h. Saímos e voltamos a retomar os treinos das 15h às 17h, mas neste período só temos direito a um almoço e um lanche”, queixou-se um dos atletas perante o coro do resto do grupo.Os treinos da selecção nacional de boxe iniciaram em Outubro de 2010. O tempo de preparação dado aos atletas é de aproximadamente um ano, antes da realização dos jogos. Mas eles dizem que pouco puderam aprender neste período, devido às condições precárias em que trabalham.“Até sentimos vergonha do que fazemos. Não queremos que alguém saiba que somos atletas de boxe em preparação para representar a selecção nacional, a apresentarmo-nos nestas condições”, disse-nos um outro pugilista que tal como todos não quis ser identificado nesta peça.Se até aqui, as inquietações levantadas podiam ser consideradas muitas, o leitor vai entender que na verdade são enormes. O dinheiro, como sempre, está no centro das reivindicações. Os atletas dizem que ganham 75 meticais de subsídio por dia. Dinheiro que, segundo eles, só recebem no final de cada mês. Para além de considerarem “pouco” este valor, que ao final de cerca de 26 dias de treinos por mês, não atinge 2 mil meticais de subsídio para cada atleta, estes dizem que o valor não chega com regularidade.“Este mês, por exemplo, recebemos depois do dia 15. Quando se aproxima o final do mês, sempre dizem que os chefes que deveriam nos pagar subsídios viajaram. Como vamos ter moral assim para trabalhar?”, questiona um dos jovens atletas.“E quando o atleta falta ou demora a chegar aos treinos, sofre um desconto ainda sobre este valor”. “Aonde vai o dinheiro que nos é descontado, se não melhoram as condições de alimentação, não melhoram as condições de treino, nem chega para comprar medicamentos para assistência dos atletas?”, questiona entretanto um outro atleta.Os atletas que falaram dizem suspeitar que o Governo tenha decidido conceder 75 meticais por dia aos atletas da selecção nacional. Dizem ter conhecimento de que eles têm direito a 627 Meticais por dia, mas este valor não lhes chega às mãos.O principal acusado pelos atletas de boxe é Lucas Sinoia, que segundo eles desempenha simultaneamente o papel de “dirigente, treinador, seleccionador, tesoureiro”. Ouvimos a antiga estrela de boxe nacional. Os atletas da selecção nacional dizem que Sinoia não age sozinho. Conta com a colaboração de outros dirigentes da selecção, nomeadamente João Caldeira, António Hélio, Ernesto Macome, este Secretário-Geral da Federação do Boxe. Estes dirigentes são acusados de não disponibilizarem condições de trabalho aos atletas e estes pedem intervenção de quem de direito para salvar a modalidade, fiscalizando a actuação da federação moçambicana da modalidade. (Borges Nhamirre)
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