quinta-feira, janeiro 28, 2021

Sem dinheiro, sem comida e medo de regressar

É uma versão contada por uma sobrevivente do terrorismo em Cabo Delgado. 

Os terroristas estão em debandada, porque a logística já é escassa e os financiadores já não efectuam os pagamentos, tal como faziam. Esta informação é confirmada por uma sobrevivente, que conseguiu fugir de um cativeiro do grupo terrorista, localizado em Manilha, uma das aldeias do distrito de Mocímboa da Praia.

A sobrevivente contou que, recentemente, houve uma reunião entre os terroristas com um indivíduo de nacionalidade tanzaniana, que se acredita ser o líder do grupo. O referido cidadão tanzaniano disse já não haver condições para continuar com os ataques, pois, já não há dinheiro.

Conforme contou a sobrevivente, a reunião terminou em confusão porque o referido cidadão tanzaniano aconselhava os integrantes de nacionalidade moçambicana a regressarem para suas terras de origem, devido à exiguidade da logística. Entretanto, em resposta, os terroristas disseram que não tinham como voltar para as comunidades, pois, temiam pelas suas vidas.

A fonte garantiu já não existirem condições de sobrevivência nas bases dos terroristas, pelo que estes e suas famílias (alguns levaram esposas e filhos) estão a passar fome, sobretudo, porque já não há onde saquearem produtos alimentares, em virtude de as populações terem abandonado os seus locais de residência. (O.O. & Carta)

quarta-feira, janeiro 27, 2021

Foram-se embora sem avisar

O procurador chefe da província de Cabo Delgado, Octávio Zilo, disse aos jornalistas que um cidadão chinês está detido na capital provincial por suspeitas de envolvimento no caso. Zilo avançou que a embarcação navega em águas internacionais e a madeira em causa, de várias espécies, não está processada, o que viola a legislação moçambicana, e estava no porto depois de ter sido apreendida há cinco meses. Funcionários alfandegários, fiscais florestais e despachantes aduaneiros moçambicanos podem ter facilitado a saída ilegal da embarcação, estando em curso uma investigação para apurar o seu grau de envolvimento no caso, acrescentou. Octávio Zilo assinalou que há indícios da prática de crimes de corrupção, falsificação de documentos e desobediência.

O procurador-chefe de Cabo Delgado afirmou que se suspeita que a madeira transportada pelo navio que zarpou de Pemba faça parte de um lote de 2.000 metros cúbicos apreendido em agosto quando ia ser ilegalmente exportada para China. Na altura, a operação ilegal foi abortada na sequência de uma denúncia anónima e nove pessoas, incluindo três funcionários das alfândegas e dois membros das Forças de Defesa e Segurança (FDS), foram detidas.

O produto apreendido estava à guarda da empresa Ming Zou, como fiel depositário, por decisão judicial, sendo que a firma tem ligações com o cidadão chinês detido. Diversos estudos nacionais e internacionais têm alertado para a devastação da floresta moçambicana, devido à exploração desenfreada de madeira destinada a exportação, maioritariamente para a China.

 

Quem provoca mais ciúmes?

O Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, recebeu do seu homólogo da Tanzânia, John Magufuli, a promessa de tudo fazer para ajudar no combate ao terrorismo em Cabo Delgado, mas o especialista em relações internacionais, Calton Cadeado, diz que vai ser necessário esperar para ver a materialização da promessa porque os tanzanianos, que não se sentem envolvidos na exploração de gás natural na bacia do Rovuma, não confiam nos moçambicanos.

"A Tanzânia diz que está disposta a morrer com os moçambicanos na luta contra o terrorismo, e isso encoraja-nos", declarou Filipe Nyusi, depois de se ter reunido com John Magufuli, em meados de Janeiro, na Tanzânia. Os dois países já estão ligados por um Memorando de Entendimento para a fiscalização conjunta da fronteira marítima, cujos resultados, na opinião de alguns analistas, não se fazem sentir, uma vez que os terroristas continuam a fazer as suas incursões através da costa por não haver uma acção forte do lado da Tanzânia, senão quando os seus interesses são ameaçados. O analista Calton Cadeado diz não saber se, de facto, os tanzanianos confiam nos moçambicanos e sublinha que quando se diz que os tanzanianos não estão a cooperar na luta contra os terroristas, "isso é verdade porque não estão a cooperar como os moçambicanos gostaríamos". Contudo, ele interroga-se se os moçambicanos colocam as coisas limpas do seu lado para os vizinhos poderem ter uma abordagem diferente relativamente ao conflito em Cabo Delgado?.

"Creio que não", afirma aquele analista, realçando que "eu não estou preocupado com a Tanzânia, mas sim com Moçambique, que tem a responsabilidade de resolver o problema, porque quando Moçambique resolver o problema de coordenação, de comando, de logística, de tomada de decisão e de mobilidade, aí sim estará a dar um sinal claro aos tanzanianos de que o combate ao terrorismo é sério". Algumas correntes de opinião relacionam este debate com a descoberta de recursos energéticos em Cabo Delgado, afirmando que os tanzanianos não querem cooperar porque Moçambique ficou mais arrogante e não quer partilhar os rendimentos desses recursos. Para Calton Cadeado, esta é uma coisa que pode ser equacionada, "mas é preciso ir muito mais a fundo da questão, sobretudo olhando para o lado interno de Moçambique, que tem de se organizar para enfrentar o terrorismo em Cabo Delgado".

Aquele especialista em relações internacionais acrescenta, entretanto, haver reclamações na Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) de que o Governo de Moçambique não envolve tanzanianos, malawianos, zimbabweanos, sul-africanos, entre outros, nos projectos de desenvolvimento de infra-estruturas ou de negócios ferro-portuários". Os Chefes de Estado da SADC devem-se reunir em data a reprogramar em Maputo para analisar a situação em Cabo Delgado e suas implicações na África Austral.

(Samora Machel, Julius Nyerere e as suas esposas)


segunda-feira, janeiro 25, 2021

A sacrificada

A cidade da Beira, segunda maior de Moçambique, voltou a cair em ruínas. A força do ciclone Eloise arrancou telhados, virou barcos e deixou ruas e vários bairros completamente alagados. Pelo menos três pessoas morreram e estima-se que cerca de 200 mil pessoas possam vir a ser afetadas por inundações nos próximos dias, em Moçambique.

Quase dois anos depois de o ciclone Idai arrasar aquela cidade costeira, onde 62 mil casas ficaram destruídas e cerca de mil vidas foram ceifadas, a Beira volta a sofrer um duro golpe. Das vítimas fatais, duas foram atingidas por paredes de habitações que desabaram no bairro da Munhava. A outra foi atingida por material ferroviário arrastado pelo vento."O cenário é de grande destruição. O ciclone arrasou muitas estruturas, as paredes de muitas casas caíram e os telhados voaram", contou este sábado ao JN, Nelson Moda, 37 anos, responsável da comunidade de Sant'Egido na província de Sofala. Este ciclone, que entrou durante a madrugada na Beira e atravessou o centro de Moçambique, foi bem mais longo do que o Idai.

Os ventos fortes, que passaram a 160 quilómetros por hora, arrancaram tudo o que encontraram pela frente. As chuvas, que ainda persistem, deixaram as casas com mais de meio metro de água. Apesar da preparação da população, que aprendeu com o passado e reforçou janelas e telhados, o Eloise voltou a deixar famílias inteiras sem teto. Muitas delas ainda não tinham acabado de reconstruir as casas, arrasadas em 2019.

A juntar à desgraça meteorológica está a pandemia de covid-19. "Neste momento há já muitas pessoas em centros de acomodação sem máscaras e muito menos o distanciamento físico. Isto pode propiciar elevado índice de casos positivos da covid-19 que já tem sido fatal", disse Nelson, lembrando que é também necessário evitar o aparecimento da cólera e a malária.

Também no distrito de Búzi, os danos foram grandes. As populações voltaram a ficaram cercadas por água e foi necessário recorrer a embarcações disponíveis no distrito, incluindo as de particulares, para retirar as pessoas, relata a Cruz Vermelha de Moçambique na sua página de Twitter. Ainda que o impacto deste ciclone tenha sido menos do que o Idai, são esperadas inundações repentinas na costa das províncias de Sofala e Zambézia. Para já, as autoridades ainda estavam a apurar os prejuízos causados pelo ciclone, tarefa dificultada pelos cortes de eletricidade e telecomunicações em muitos locais da cidade.

 



Não mencionem a Renamo na minha presença...

Novo livro detalha como o presidente americano Ronald Reagan num encontro com os seus conselheiros recusou ajuda à Renamo

O antigo presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan avisou os seus conselheiros para deixarem de considerar ajuda ao então movimento rebelde moçambicano Renamo por considerá-lo como “um bando de assassinos”. Reagan disse também aos seus conselheiros, na mesma ocasião, que não queria que a questão voltasse a ser abordada na sua presença. A opinião de Reagan é revelada num livro acabado de publicar, nos Estados Unidos, titulado “The Good American” (O Bom Americano), da autoria do conhecido escritor de política internacional Robert Kaplan, e que é uma biografia de Robert Gersony, autor de um relatório sobre as alegadas atrocidades da Renamo durante a guerra civil em Moçambique. Esse relatório, publicado em 1987, teve um papel preponderante em levar os Estados Unidos a decidirem não ajudar a Renamo, como faziam em Angola com a UNITA. 

Contudo, nessa altura, o então presidente moçambicano, Samora Machel, havia já estado nos Estados Unidos, em 1985, numa visita em que se encontrou com Ronald Reagan, um ano depois de ter assinado o Acordo de Nkomati com a África do Sul. Apesar do "Nkomati", a guerra continuou em Moçambique, o que levou eventualmente o governo moçambicano da FRELIMO a aceitar o início de negociações com a Renamo, que resultaram num acordo de paz em 1992. Com a guerra a continuar durante vários anos, aumentou a pressão de círculos conservadores em Washington para uma ajuda militar à Renamo que, com a continuação da ajuda de sectores militares da África do Sul, tinha levado o governo da Frelimo à beira do colapso.

O livro indica que a então primeira-ministra britânica, Margaret Thatcher, o então Secretário de Estado George Schultz e a própria filha do presidente, Maureen Reagan, tiveram um papel em influenciar Reagan a não ajudar a Renamo. Schultz e Maureen Reagan foram informados sobre os detalhes do relatório antes deste ser publicado e segundo o livro de Kaplan, numa reunião convocada para se discutir que movimentos de guerrilha poderiam ser apoiados pelo governo americano, alguém sugeriu ajuda à Renamo que gozava de apoio em vários sectores do Partido Republicano.De acordo com uma das fontes de Kaplan, nessa reunião, Reagan levantou a palma de uma mão e disse: “Parem de imediato aí, rapaziada. Temos um relatório que vai ser publicado, na próxima semana, que indica que a Renamo é um punhado de assassinos”. O presidente teria depois descrito algumas das atricidades alegadamente cometidas pela Renamo e detalhadas no relatório .

“Não voltem a mencionar a Renamo na minha presença”, disse Reagan na ocasião. Os detalhes do relatório, baseado em entrevistas com refugiados moçambicanos, foram, na altura, negados pela Renamo e descritos pelos seus aliados em Washington como uma manobra para salvar a política do Departamento de Estado de manter boas relações com a FRELIMO. O antigo Secretário de Estados Assistente para os Assuntos Africanos, Chester Crocker , disse no seu livro “High Noon in Southern Africa” que “confrontos partidários sobre Moçambique tornaram-se numa das maiores dores de cabeça no segundo mandato de Reagan”.

 “Nos meus oito anos e meio à cabeça do bureau para África, nenhuma batalha sobre política foi mais amarga”, escreveu Crocker, que disse que a política de Reagan de continuar a apoiar o governo moçambicano foi alvo de sabotagem “sem vergonha” por pessoas "dentro do seu partido, do seu governo e mesmo do seu próprio pessoal na Casa Branca”. 

O livro de Kaplan indica claramente que esse relatório de Gersony e a influência de Schultz , Margaret Thatcher e Maureen Reagan acabaram com qualquer possibilidade dos Estados Unidos apoiarem a Renamo. Isso foi aliás confirmado por Chester Crocker, que escreveu no seu livro que Reagan tinha sido informado anteriormente que “Margaret Thatcher se tinha tornado numa fã ardente de Machel”, Por outro lado, escreveu Crocker, isso tinha sido “reforçado por relatórios elogiosos recebidos da sua filha Maureen”“Maureen Reagan e Samora Machel, conclui mais tarde, era uma combinação verdadeiramente mágica: Dois extrovertidos incontroláveis, com espinhas dorsais de aço, que poderiam ter constituído uma equipa invencível”, escreveu Crocker.

 

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