quinta-feira, dezembro 13, 2018

Liberdade de expressão à liberdade de insultar


Nunca será demais repeti-lo: a liberdade de expressão é a pedra de toque de qualquer regime que se pretenda democrático. 
A liberdade de expressão está consagrada na Constituição da República de Moçambique como um direito fundamental, interpretado pela doutrina como sendo, mais do que uma prerrogativa, uma garantia institucional, significando que este Estado assegura dignidade aos seus cidadãos! 
A liberdade de expressão oferece a todo o cidadão a oportunidade de considerar uma larga variedade de opiniões acerca de assuntos que dizem respeito a toda a sua comunidade, seja local, seja nacional, e ajuda aqueles que tomam decisões a ter consciência dos pensamentos e sentimentos dos governados, que são os seus eleitores. Cidadãos bem informados e uma imprensa livre são condições essenciais para que os eleitores e os cidadãos de um modo geral possam escrutinar o desempenho dos seus servidores, independentemente do nível em que estes se situem. Os governos que tomam decisões de acordo com os princípios da maioria apenas se tornam legítimos se todos os cidadãos tiverem tido oportunidade de expressar livremente as suas ideias sobre qualquer que seja o assunto, usando todos os meios ao seu dispor.
A liberdade de expressão é uma questão de lei; mas é também uma questão de ética e moralidade. Ela contextualiza-se nos valores e crenças fundamentais de cada sociedade, em cada etapa da sua história.  Contudo, ainda que se erga com o estatuto esmagador de direito fundamental, a liberdade de expressão não é um direito absoluto – já que não existem direitos infinitamente elásticos! 
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O seu exercício, por pleno ou robusto que seja, terá que se harmonizar com a prevalência e o exercício de outros direitos, quer sejam também fundamentais, quer não. E porquê? Porque tais direitos fundamentais não são atribuídos aos indivíduos como pessoas isoladas, vivendo sozinhas no deserto; não! São-lhes atribuídas enquanto membros de uma sociedade; enquanto seres inseridos na sociedade, com a qual partilham deveres irrenunciáveis: os de, através da sua conduta, contribuírem para um convívio social são e harmonioso!
 Por isso a Constituição da República estabelece que o exercício destes direitos é regulado por lei, impondo-lhe limites em dois sentidos: do respeito pela Constituição e pela dignidade da pessoa humana (nº6 do art.48).
Isto porquê? Exactamente porque expressões podem infligir danos a indivíduos, grupos de pessoas e sociedades, o que pode dar origem a demandas por intervenções para limitar a liberdade de expressão.A liberdade de expressão é consagrada como um direito fundamental exactamente para, assim protegido, ser garante de espaço para os membros de uma sociedade debaterem de forma livre e aberta aqueles assuntos que dizem respeito à sua vida, enquanto comunidade. Portanto assuntos revestidos de interesse geral. Daí que o seu exercício tenha como alguns os seus limites (expressos ou imanentes) a reserva da vida privada e da vida intima privada – o que,  por sua vez, dá sentido material ao conceito de dignidade da pessoa humana. Associados a este limite geral, juntam-se os princípios éticos da cordialidade e da elevação no próprio discurso argumentativo, pois apenas em contexto de reconhecimento pratico de igualdade em dignidade é que duas pessoas podem debater, com argumentos válidos, qualquer assunto.  De outro modo, porque a Lei Fundamental de uma nação haveria de consagrar um direito tãro robusto, se este se destinasse a promover expressões menores, expressões de baixo-relevo social, de baixo recorte moral e ético, do género “baixeza” e insultos pessoais?
Ai, a liberdade de expressão encontraria o seu fim absolutamente desvirtuado e corrompido. Ai ela poderia reduzir-se a mero instrumento de cometimento de crimes graves. Como o de assassinato de carácter! 
Resultado de imagem para Da liberdade de expressão à liberdade de insultar\Vem isto a propósito de muitos textos que têm vindo a circular, nos últimos tempos, em redes sociais, em que os seus autores, a pretexto de exercício da liberdade de expressão, exprimem seus ódios e asco sobre outras pessoas, incluindo titulares de cargos públicos, confundido a pessoa com o cargo que ocupa!
A pretexto de discutirem assuntos de governação – portanto assuntos do interesse da comunidade – atiram-se em espumas de raiva canina contra tais figuras, tentando, a todo o custo, devassar a sua vida privada, incluindo lançando-lhes estigmas de doenças infecto-contagiosas, insinuando que as terão contraído como consequência de condutas promíscuas. 
Uma de tais cartas, ora em circulação nas redes sociais, mostra como seu autor Sérgio Vieira: considerando a narração apaixonada de factos verosímeis da história politica contemporânea de Moçambique, desde a liderança de Eduardo Mondlane até à presente liderança de Filipe Jacinto Nyusi, é de presumir que se trate do único Sergio Vieira veterano da política moçambicana, desde a independência do país, em 1975. “Presumir”…apenas!
Ora, coroar o Presidente da República com os mais vis insultos pessoais; procurar invadir a sua vida íntima privada, incluindo através de atribuição de doenças graves; pinta-lo, enquanto homem, com as mais bizarras tintas, para depois vir exprimir receios de que você mesmo possa vir a ser agredido ou mesmo morto…não tem absolutamente nada a ver com o exercício da liberdade de expressão! Longe disso! Tem a ver, isso sim, com o exercício de uma outra “liberdade”: a liberdade de insultar, muito cultivada entre os protagonistas de um pseudo desporto chamado wrestling! Aqui, com uma clara finalidade: provocar a baixa autoestima do adversário; vexando-o!
Ora, a liberdade de expressão é uma conquista de longas e permanentes lutas de muitos povos, incluindo o povo moçambicano! Permitir que ela seja instrumentalizada e desvirtuada é oferecer trunfos e justificações aos seus inimigos para a banirem! É atrair, sobre nós, a ira das trevas e da opacidade!
Assim, dizemos: liberdade de expressão sim; liberdade de insultos, não!
(Por: Tomás Vieira Mário)

segunda-feira, dezembro 03, 2018

LAM + MEX + FaSTJeT + EMA


A Ethiopian Mozambique Airlines (EMA) arrancou suas operações no país com dois aparelhos Bombardiers Q400 New Generation, de 70 lugares, matriculados em seu nome, mas sua estrutura logística é toda da Ethiopian Airlines, que opera com o código de vendas ET 071. No Aeroporto de Mavalane, a venda de bilhetes é feita nos balcões da Ethiopian. Todo o pessoal comercial é da empresa de bandeira da Etiópia. Gestores e pilotos começaram a trabalhar alegadamente sem visto laboral.  E o código de vendas coincide com o da ET. A EMA (uma empresa direito moçambicano, parceria entre a Ethiopian Airlines Group, com 99%, e a Malawian Airlines, com1%) opera em Moçambique com suporte total da companhia de bandeira doutro país, levando a que especialistas do sector considerem que este é um caso único em África de alegada cabotagem (situação em que uma operadora estrangeira entra noutro país para fazer transporte aéreo em rotas domésticas).

Cabotagem?
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Não, a EMA é uma empresa de direito moçambicano”, afirma perentoriamente o Comandante João Abreu (reformado da LAM,onde pilotou B737,767,DC10,Fokker 27 e 100,Embraer 190) , Presidente do Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IACM), órgão regulador do sector. Abreu rechaça quaisquer alegações sobre um eventual relaxamento do Estado para permitir a entrada da Ethiopian em Moçambique, numa situação que pode levar a falência ou regeneração das Linhas Áreas de Moçambique (sociedade anónima entre o Estado moçambicano, com 80 %, e a Vintelam, o grupo de trabalhadores da companhia, com 20%). O processo de certificação da EMA, diz Abreu, levou 9 meses, tendo seguido os passos exigidos para que a empresa satisfizesse todos os requisitos da legislação nacional. Em 2011, através do Decreto 39/2011, de 2 de Setembro, o Governo liberalizou o espaço aéreo para que empresas estrangeiras viessem cá disputar o exíguo mercado doméstico de pouco mais de 700 mil passageiros por ano. Para além da LAM e da Mex (uma subsidiária da primeira) já estava a voar no eixo dorsal das rotas domésticas (Maputo-Beira-Nampula-Pemba) a Fastjet, operada pela Solenta, também uma empresa de capitais estrangeiros. A certificação de um operador aéreo envolve um check list que contém critérios de legalidade, de idoneidade financeira, de estudo de mercado, de operações, manutenção e segurança. Isso tudo foi verificado minuciosamente, diz Abreu.
Na quinta feira passada, a EMA fez um voo inaugural para Beira. E no sábado arrancou seu serviço regular com voos para Beira, Nampula, Pemba. Sua frota ainda é limitada a dois aviões e a base das suas operações será mesmo Maputo, e não Nacala, como foi ruidosamente ventilado pelo PCA dos Aeroportos de Moçambique, Emanuel Chaves, há dois meses atrás. Ontem, Chaves disse à “Carta” que  a Ethiopian desistiu de montar sua base operacional em Nacala pois não obteve uma coisa que procurava: facilidades fiscais inerentes à Zona Económica Especial. Para beneficiar dessas facilidades, a EMA tinha de estar baseada em Nacala e manter fortes ligações empresariais com a economia local. Mas ela está essencialmente voando longe dos ares do “elefante branco” da cidade portuária.

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O início das operações da EMA no sábado foi interessante. O balcão da Ethiopian, onde a EMA vende as passagens sob o código ET estava apinhado. É o único ponto de vendas em Maputo. Ontem, no mesmo balcão, o serviço da EMA estava um caos. Parecia uma típica empresa moçambicana. “Não há sistema”, diziam os funcionários. Ninguém soube explicar a razão da falha do sistema informático. No balcão estavam apenas dois funcionários, manipulando um único computador. Esse balcão da Ethiopian localiza-se no Terminal 2, para voos internacionais. Os passageiros para voos domésticos têm de se deslocar para esse terminal, adquirir a passagem e regressar para embarcar na doméstica. Um mal menor. O preço da EMA compensa, como vamos ver. Pelo menos bate os da LAM.
Por isso, a vinda da EMA está a ser aclamada por uma boa parte dos consumidores, que querem eficiência e melhores preços. E também algumas compras locais. Há coisas garantidas. “Carta” apurou que o catering da EMA vai ser fornecido pela SMS (LAM e Aeroportos controlam a empresa em partes iguais), o que é uma boa perspetiva para a empresa, que nos últimos anos viu sua capacidade de produção cair drasticamente. Uma das razões desse descalabro eram as dívidas da LAM. Garantida também está uma maior competição nas tarifas. Ontem, era praticamente substancial a diferença entre a EMA e a LAM, em termos de tarifas. “Carta” fez reservas para Maputo/Nampula/Maputo e Maputo/Tete/Maputo, para 5 dias.
Na LAM, a primeira estava a 21.380,00 Mts e na EMA a 19.207, 00 Mts. No segundo caso, a LAM estava a cobrar 28.808,00 Mts e a EMA 17.842, 00 Mts. Um funcionário da EMA disse à “Carta” que a perspetiva é venderem passagens à metade dos preços da LAM. A operação com o código de vendas ET implica que todos os pagamentos feitos eletronicamente sejam diretamente canalizados para as contas da empresa-mãe, em Addis-Abeba, ficando pouco na banca local. Um dado notável é que os preços da EMA estão indexados ao USD. Ou seja, toda a reserva é calculada em USD embora seja paga em Mts. O efeito da entrada da EMA no bolso do consumidor vai ser imediato e, pelo menos ao nível das tarifas, um enorme desafio para a LAM. A EMA já bate a LAM no preço. Mas ainda não na eficiência.
As duas companhias vão lutar aguerridamente para controlar maior porção do osso do eixo dorsal. É provável que o espaçamento dos seus voos no “time slot” venha a ser mínimo. Para já, não há margens estabelecidas acima do mínimo dos 2 minutos que o Aeroporto de Mavalane estipula para partidas e chegada de aeronaves. Em tudo o resto, de acordo com Emanuel Chaves, as duas companhias podem competir.  O terminal doméstico tem 14 balcões de “check in” e 4 portas de embarque. “Check in” e embarque podem acontecer ao mesmo tempo. Isso depende da capacidade de “handling” que, no caso de Maputo, existe. Problemas identificados anteriormente como, por exemplo, a diminuta sala de embarque em Nampula e a falta de escadas na Beira estão, para Chaves, ultrapassados. Ele lembra que o aeroporto de Nampula tem um restaurante no primeiro andar (que pode servir de sala de espera) e que, no caso das escadas, os Bombardiers da EMA vêm com elas incorporadas. Na semana passada, e antecipando a entrada da EMA no mercado, o DG da LAM, João Pó Jorge, veio dar perspetivas animadoras para a companhia, as quais passavam por uma substancial redução de custos, e eventualmente uma injeção de fundos do maior acionista, o Estado. Até que ponto o Estado está interessado numa LAM competitiva, essa é ainda uma incógnita.
Apanhado no fogo por causa do seu papel de regulador, João Abreu garante que não houve e nem está a haver qualquer favorecimento das autoridades à Ethiopian. Para Abreu, a EMA vender bilhetes no balcão da Ethiopian não é um grande drama.  “É apenas um arranjo comercial”. E o uso pela EMA do código de vendas ET é “pacífico”.  A Mex também usa o código TM, da LAM, rebate ele. Abreu não gosta de ouvir a ideia de que a EMA é apenas um ardil de nome usado pela Ethiopian para dominar os céus de Moçambique, fazendo jus à sua visão estratégica 2025: dominar os céus de África. Moçambique seria um passo nessa direção, a seguir ao Togo e ao Malawi. A diferença é que nestes dois países, a Ethiopian entrou nas estruturas acionistas das empresas locais de bandeira, para robustecê-las.
No caso de Moçambique, ela aparece como o principal suporte de um projeto de “capitais privados estrangeiros” local em direta competição com a principal linha aérea do país.  Abreu diz que a competição é saudável e que, da sua parte, ele não fez mais do que aplicar a legislação. E destaca o facto de que a EMA vai trazer mais do que transporte: manutenção, fabricação de peças e formação.  Seja como for, perante um concorrente robusto, o futuro da LAM está com os gestores da empresa. Mas parece fundamental o Governo clarificar o que quer fazer dela: deixá-la sucumbir ou recuperá-la para se alavancar no boom do gás do Rovuma.
(Marcelo Mosse, com Marta Afonso)