terça-feira, dezembro 19, 2017

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5 maiores riscos empresariais

A Incerteza Política e os Ataques Informáticos em Larga Escala São Temas Chave Para a Região em 2018. A incerteza política e a instabilidade durante as transições estão entre os principais riscos para as empresas na África Austral em 2018, afirma a consultora Control Risk (www.ControlRisks.com), especialista em risco global, na sua previsão política anual e de riscos de segurança RiskMap.
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George Nicholls, parceiro sénior da Control Risks na África Austral, comenta:
“Em 2018 iremos continuar a assistir a incertezas em toda a liderança política nos mercados da África Austral. As transições no Zimbabué e em Angola em 2017, as eleições em Moçambique em 2018 e o sectarismo no interior do Partido do Congresso Nacional Africano (ANC) atualmente no poder na África do Sul recordam, uma vez mais, as empresas da região sobre a importância de ter um entendimento claro do impacto dessas incertezas no seu ambiente de risco.”

Instabilidade política na África do Sul: 2018 irá assistir à continuação das divisões no seio do ANC após a eleição de um novo presidente do partido em dezembro de 2017. As fações concorrentes - e a possibilidade de uma cisão no partido - irão causar incerteza e instabilidade política, sendo provável que o Presidente Jacob Zuma abandone o poder antes do final do ano.
Transições políticas, mudança geracional: O presidente do Zimbabué, Robert Mugabe, abandonou o poder, o presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, foi substituído por João Lourenço, e o presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, está a consolidar a sua autoridade. Antecipar e preparar a forma como estas transições irão afetar os negócios é essencial para o êxito em 2018 e mais além.
Riscos reputacionais em ambientes políticos ruidosos: 2017 assistiu a uma série de escândalos de corrupção de elevado perfil na África do Sul. Tornaram-se evidentes com uma fuga massiva de e-mails que demonstravam uma comunicação indevida entre os responsáveis governamentais de topo, indivíduos com ligações políticas e interesses empresariais privados. Algumas empresas aprenderam da forma mais dura que quando um conjunto restrito de interesses mina e subverte a integridade das instituições do Estado, isso abre caminho ao aparecimento de muitos outros riscos. Proteger a reputação – e compreender aquilo que a pode comprometer – nunca foi tão importante.
Ataques informáticos em larga escala contra infraestruturas: 2017 foi o ano de grandes e preocupantes ataques surpresa aleatórios. Em 2018 podemos assistir a novos ataques semelhantes a WannaCry, NotPetya e BadRabbit, mas de forma mais poderosa, objetiva e perturbadora. Estão particularmente em risco os sistemas nacionais de infraestruturas.
Novas ameaças em Moçambique: Foram tomadas grandes decisões finais de investimento no campo de projetos de gás natural liquefeito em Moçambique, assinalando o provável aumento do investimento estrangeiro. O rápido desenvolvimento económico de uma parte marginalizada do país, com pouca representação estatal, irá representar um desafio para a segurança. A entrada de dinheiro e trabalhadores estrangeiros irá perturbar as estruturas sociais e aumentar as expetativas de mudança, aumentando o risco de descontentamento social e a formação de grupos organizados cujos alvos serão interesses públicos e privados.

Ao longo de todo o continente africano as empresas poderão assistir ao impacto negativo de uma potencial e renovada crise da dívida. Muitos países em África, entre os quais Moçambique, enfrentam a possibilidade de uma crise da dívida soberana, uma década após terem seguido o caminho do Gana e entrarem no mercado internacional de obrigações. O problema é gerado por elevados níveis de dívida externa e pela incerteza persistente sobre a recuperação dos preços das matérias-primas para suportar os reembolsos. Contudo, as reformas em curso e o reconhecimento destes problemas por parte do governo irá conduzir a melhorias em 2018.


Distribuído pela APO Group em nome da Control Risks Group Holdings Ltd.

segunda-feira, dezembro 18, 2017

Tremores de um processo saturante

O Presidente da República, Filipe Nyusi, apela à calma e paciência de todos os moçambicanos sobre o anúncio dos resultados do diálogo em curso visando o alcance de uma paz efectiva no país. Falando sábado na vila de Inhassoro, província meridional de Inhambane, no encerramento do primeiro seminário nacional dos primeiros secretários dos Comités Distritais da Frelimo, partido no poder, Nyusi apelou aos moçambicanos para que evitem no máximo atrapalhar o ambiente de cordialidade que caracteriza o processo de restabelecimento da paz criado entre ele e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama. Na ocasião, Nyusi pediu a sociedade civil moçambicana para não se agitar com as suas deslocações a serra da Gorongosa, procurando saber o conteúdo das matérias tratadas nos encontros que tem mantido com o líder da Renamo.“O povo incumbiu-nos uma missão que é parar com a guerra e resgatar a paz, daí que a minha ida à serra da Gorongosa para dialogar com o líder da Renamo se circunscreve no cumprimento dessa missão honrosa confiada pelo povo de trazer a paz efectiva para o país”, disse Nyusi, . Segundo Nyusi, o diálogo em curso ao mais alto nível pode ser consolidado por outros moçambicanos com boas intenções para este fim mas, as suas intervenções não devem agitar aqueles que seriamente esperam por um abraço e aperto de mãos simbolizando a paz.
Resultado de imagem para paz moçambique “Estamos a construir consensos no diálogo. Dhlakama apresentou na mesa a sua versão sobre a governação e pacote eleitoral. Também recuou no tempo abordando o que chamou de incumprimento ou violação de algumas cláusulas do Acordo Geral de Paz (AGP), assinado a 4 de Outubro de 1992”, explicou o Presidente da República.O Chefe do Estado adiantou que estes e outros assuntos nomeadamente, o desarmamento, desmobilização e reintegração foram remetidos às comissões técnicas criadas por ambas as partes para o devido estudo e posterior encaminhamento a Assembleia da República, o parlamento moçambicano. Nyusi, disse ter suplicado ao líder da Renamo para mudar a suas estratégia de pressionar o Governo pois, segundo explicou, por mais importância que tenham as suas inquietações nada justifica o derramamento de sangue e destruição do que foi construído com sacrifico.
“Na sexta-feira passada até sugeri a Dhlakama para na qualidade de irmão moçambicano, para almoçarmos juntos em Gorongosa mas ele respondeu que não era elegante passar refeições no mato com o Presidente da Republica, mas não afastou a possibilidade de qualquer momento sentarmos a mesa para uma refeição não interessa o local”, disse Nyusi.Sem avançar prazos para o fim do diálogo o Chefe do Estado deixou transparecer que o processo em curso está a decorrer num clima de irmandade que a qualquer momento será rubricado um acordo sobre a paz efectiva e duradoira em Moçambique.

"Apagão da memória do colonialismo"

Imagem relacionadaAssinalou-se este sábado 45 anos após o massacre de Wiriamu, em Moçambique. Historiadores dizem que as atrocidades cometidas pelo exército português foram escondidas pela censura.
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Este sábado, 16 de dezembro, assinalam-se os 45 anos do massacre de Wiriamu, em Moçambique - acontecimento que despertou a atenção do mundo face às atrocidades cometidas por Portugal durante as guerras coloniais em África.
De acordo com a investigação realizada pelo académico moçambicano Mustafah Dhada, professor de História Mundial e Estudos Africanos radicado nos Estados Unidos, as tropas portuguesas dizimaram um terço dos 1.350 habitantes de cinco povoações da província de Tete, no centro do país. Fernando Rosas, historiador português que esteve recentemente naquela povoação – onde foi erguido um monumento a assinalar os acontecimentos ocorridos em 1972 –, diz que as operações contra os movimentos de guerrilha de libertação nacional eram consideradas "contraproducentes"."Mesmo pelos sul-africanos e pelos rodesianos que colaboravam nessas operações", ressalta o historiador, acrescentando que "no fundo, a guerrilha não estava lá. Estava lá a população: homens, mulheres e crianças que eram vítimas daquela violência brutal e inconsequente".
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Documentário: historiador Fernando Rosas quer desconstruir na televisão portuguesa os mitos da colonização.
Os crimes perpetrados pelas tropas portuguesas nas aldeias da província de Tete despoletaram fortes críticas internacionais e fomentaram a contestação contra a guerra colonial. Mas, passadas mais de quatro décadas, como é visto em Portugal este período sombrio da história colonial portuguesa?
Para Fernando Rosas, "estes acontecimentos fazem parte de uma espécie de apagão da memória do colonialismo que se verificou em Portugal"."Em Portugal continua muito vivaz uma certa nostalgia do império e uma narrativa sobre o colonialismo, que é uma narrativa 'desculpabilizadora'", critica o especialista.Este género de mensagem, acrescenta Fernando Rosas, continua até no discurso oficioso do Estado português. Na série em transmissão na televisão pública portuguesa (RTP2), intitulada "História a História: África", o historiador tenta desconstruir "mitos ainda vivazes da pseudo bondade do colonialismo português", de modo a "não permitir que [acontecimento como Wiriamu] passe em branco".
Imagem relacionadaAo analisar a dimensão política do massacre, o historiador José Antunes afirma, por sua vez, que este foi um dos símbolos mais fortes da repressão durante a guerra colonial. No entanto, discorda que tenha sido um genocídio, como referem alguns investigadores.Segundo Antunes, "ao considerarmos um genocídio, estamos a pô-lo em pé de igualdade com o Holocausto, com os massacres dos hutus ou dos tutsis". "Para falar de genocídio naquela circunstância – estamos a falar numa situação de contexto militar, de guerra; há um massacre justificado pelas autoridades portuguesas pela necessidade de controlar as aldeias em que os guerrilheiros tinham algum tipo de apoio e fez-se aquele e alguns outros massacres", justifica.
Entretanto, José Antunes ressalta que "são situações que claramente fogem aquilo que é a guerra dita 'limpa', como se isso alguma vez existisse, e mostram o que foi, de facto, a imposição de uma forma brutal das forças armadas portuguesas sobre os grupos de libertação".O historiador português José Antunes, formado em História de África com foco no período colonial, diz que hoje há já mais informação sobre o que aconteceu em Wiriamu. E questiona se o número de mortos chegou aos milhares.
Imagem relacionada"Isso só por si já é uma questão importante. Portanto, temos ali detalhes também da própria forma de operar das Forças Armadas portuguesas e da política. Quer dizer, isto foi ou não deliberado, isto foi ou não mandado pelas chefias? Tudo isso é importante saber-se".
Irene Pimentel, outra historiadora portuguesa e uma das críticas em relação ao silenciamento, também reconhece que ainda há factos a investigar sobre Wiriamu. Ela afirma que hoje se pode recorrer aos sobreviventes em Moçambique para resgatar as memórias daquela época, "para que, finalmente, os sobreviventes e familiares das vítimas possam fazer o seu luto".Fernando Rosas também considera necessário e indispensável que assim seja em respeito à memória. "Porque", sublinha, "sem memória não há democracia". O historiador considera que "há um trabalho de memória muito importante a fazer também cá", aconselha.

sexta-feira, dezembro 01, 2017

Sem voos,nem passageiros

'Só faltam os passageiros': caminhe pelo aeroporto fantasma da Odebrecht em MoçambiqueSão 10 horas da manhã de uma quinta-feira. Os oito balcões de check-in do Aeroporto Internacional de Nacala, norte de Moçambique, estão fechados. Todas as cadeiras vermelhas e pretas das salas de embarque estão vazias. Espaços destinados para lanchonetes, lojas, free shop estão desocupados. Seis guichês de migração não têm uso. Esteiras e raio-X de bagagem estão parados. O ar condicionado está desligado, apesar do calor de mais de 35ºC. O elevador também. O toque dos sapatos no chão faz eco.
Tudo está muito limpo, como se fosse uma infraestrutura prestes a debutar. Mas essa cena já dura três anos. Inaugurado em dezembro de 2014, o espaço foi projetado e construído pela Odebrecht, com um empréstimo de US$ 125 milhões (R$ 404 milhões na cotação atual) do BNDES, para ser o segundo maior de Moçambique - só fica atrás do de Maputo, a capital. No entanto, continua a amargar a posição de aeroporto menos movimentado do país - e um dos menos usados em toda a África.
Com capacidade para 500 mil passageiros por ano, recebe menos de 20 mil. Os voos internacionais nunca chegaram. São apenas dois trajetos comerciais por semana, na rota Maputo-Nacala, e dois privados da mineradora brasileira Vale, ambos operados com aviões brasileiros da Embraer. Para comparação, há um aeroporto próximo, a 190 km, em Nampula, com 57 voos semanais.
"Hoje é um dia morto", diz o diretor do aeroporto, Jeronimo Tambajane. "Eu esperava que essa área estivesse completamente movimentada, com vários voos a ocorrerem. Infelizmente, nesse momento não temos nada." Ao caminhar pela sala de embarque internacional, o moçambicano passa a mão pelo couro vermelho de um divã: "Já seria altura de remodelar (reformar)".O fracasso do empreendimento pesa nos bolsos dos dois países. Desde o final de 2016, Moçambique não paga as parcelas do empréstimo do BNDES, o branco brasileiro de fomento à economia brasileira, diluído em um prazo de 15 anos. É o primeiro calote que a instituição tomou entre todas as obras custeadas fora do Brasil - operações que passaram a ser postas em xeque após a operação Lava Jato.O pagamento do empréstimo não é a única conta que não fecha. O Aeroporto de Nacala opera no vermelho desde que foi inaugurado. Só o seu custo de operação é quatro vezes maior que as receitas. O saldo negativo recai sobre os outros aeroportos de Moçambique, geridos todos pela mesma empresa estatal.Não bastassem a falta de voos, de passageiros e as contas em atraso, há suspeitas de corrupção em torno do aeroporto. Tanto Odebrecht como Embraer relataram ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos terem pagado propina para autoridades moçambicanas com o objetivo de fechar negócios.
Área de embarque e controle de passaportes sem ninguémA construção do aeroporto foi sugerida ao governo moçambicano pela Odebrecht. Não se baseou em uma demanda reprimida de passageiros em Nacala, uma região com 375 mil habitantes, mas sim em uma suposta esperança de crescimento futuro, puxado por empresas brasileiras.
É por Nacala, uma cidade portuária, que a Vale exporta a maior parte do carvão que extrai nas minas de Moatize, também em Moçambique, uma das maiores reservas do minério do mundo. Esse é o maior investimento do Brasil na África, assinado durante o governo Lula e estimado em US$ 8,2 bilhões de dólares.
A expectativa era de que a exportação de carvão por ali atraísse outros negócios. No caminho entre Moatize e Nacala, por exemplo, o braço de cooperação internacional do Itamaraty e a FGV Agro (vinculada à Fundação Getúlio Vargas) esperavam estimular a expansão agrícola - do agronegócio brasileiro, inclusive.Mas, por enquanto, as previsões se frustraram. Quando as obras do porto da Vale e do aeroporto da Odebrecht acabaram, o desenvolvimento estancou. "Na fase de construção, houve muito movimento. Depois, a empresa só traz carvão, embarca e vai embora", explica José Ferreira, economista da Agência para a Promoção de Investimento e Exportações de Nacala.
Além disso, as economias brasileira e moçambicana entraram em crise. "Infelizmente, depois que o Aeroporto de Nacala foi inaugurado, houve esse esfriamento econômico, criou este buraco. Mas tenho fé de que Nacala vai cumprir seu papel. Não acredito que o aeroporto possa fechar um dia porque não vem avião", afirma o diretor Tambajane.
Hoje, somam-se placas de vende-se em Nacala. Postos de trabalho fecharam."Estou a procurar serviço, qualquer serviço, mas não há mais empregos", diz Vitorino Mario, de 25 anos. Ele trabalhou por dois anos para a empreiteira brasileira OAS, que construiu o porto de carvão da Vale. Está desempregado há três anos, desde que as obras acabaram, fazendo bicos para sustentar os três filhos.
O quintal da casa onde vive, perto do porto, está ocupado por uma pequena carpintaria de outros ex-operários da OAS. Depois de trabalharem para a empresa, "a vida voltou a ser como era antes", diz Bachir Severino. O sonho de desenvolvimento brasileiro em Nacala durou pouco.
Bachir Severino segura carteira de identificação de trabalhador da OASMoçambique é um dos países mais pobres do mundo - 46% da população vive na pobreza, segundo estatísticas do país.
Nacala não foge à regra. Metade da cidade não tem água encanada, por exemplo. Nas margens da estrada que leva ao aeroporto, é possível ver diversas fontanárias - poços acionados por pressão manual - cercadas de mulheres e crianças com baldes nas mãos e nas cabeças.
O bairro Matchapue ilustra a precariedade de infraestruturas básicas de Nacala. Contam-se nos dedos as casas com água na torneira. A de Fátima, com dois cômodos, é uma delas. A moçambicana fez da raridade um negócio: construiu um reservatório no quintal, que abastece com uma mangueira. A partir das 5h, os vizinhos chegam para encher seus baldes, ao custo de 5 meticais (R$ 25 centavos) cada.Anchia Enusso, de 21 anos, é uma das clientes, enchendo apenas um balde. "Só? Vai dar para quê?", perguntou a vendedora. "Hoje só tenho 5 meticais", respondeu a jovem, com a filha no colo. Nem ela nem a mãe trabalham fora. O pai é pedreiro. Tudo precisa melhorar no bairro onde vivem, mas o que mais faz falta é emprego, dizem elas.Outros vizinhos se aproximam para reclamar de que também querem emprego. Juma Siaga, pescador de 48 anos, é um deles. Diz que a renda da pesca é muito baixa. O nicuzi, um peixinho de uns 5 centímetros, por exemplo, é vendido seco em pequenas porções de 5 meticais - o mesmo preço do balde de água.Siaga esteve uma vez no Aeroporto de Nacala. Era a festa de inauguração, aberta ao público. Ficou encantado. "É grande, muito bonito, com muito vidro. A festa foi boa, havia música, dança, muita gente." Foi o dia de maior movimento na história do terminal. Cerca de 500 pessoas apareceram para festejar.
Anchia, 21 anos, com a filha no colo, ao lado de uma amiga, em frente ao reservatório de água da vizinha
O terminal de Nacala é o primeiro aeroporto construído em Moçambique desde a independência de Portugal, em 1975.
É o mais moderno do país e o único que já obteve uma certificação para operar voos internacionais. No total, há em Moçambique onze aeroportos, seis deles internacionais. Os demais ainda estão em processo para obter a certificação.
O segundo aeroporto mais movimentado do país é justamente o de Nampula, vizinho dali. Como há poucos voos para Nacala, há quem voe para Nampula e depois faça o restante do percurso de carro.
"É muito constrangedor ter que fazer duas horas de táxi de Nampula a Nacala, sendo que há esse aeroporto aqui", diz a moçambicana Katia Manjate, que voou de Maputo para Nampula em outubro, para dar uma formação para rádios comunitárias em Nacala.
O taxista Carlos José está acostumado a fazer esse trajeto. "Esse aeroporto de Nacala é muito grande mesmo, bem trabalhado. Só falta aviões. Fala-se de falta de passageiros. Assim, a LAM (Linhas Aéreas de Moçambique) não consegue suportar as despesas de levar avião para Nacala sem passageiros."A LAM, única empresa de aviação de Moçambique, estatal, chegou a realizar cinco voos semanais na rota Maputo-Nacala. Depois, reduziu a frequência para quatro voos, em seguida três, até chegar aos dois voos atuais."As companhias aéreas sempre se baseiam nas estatísticas. E nós sempre estamos em desvantagem. Elas vão procurar onde há movimento. Vão ver que é em Nampula. Dificilmente virão para Nacala. Então, nosso tráfego vai continuar a ser gerido pela LAM. Como companhia do Estado, a LAM não pode abandonar nenhuma escala, tem que cumprir seu dever social", afirma o diretor do aeroporto.No momento, a única esperança do Aeroporto de Nacala é que o governo de Moçambique proíba o tráfego internacional nos dois aeroportos mais próximos (Nampula e Pemba) e obrigue as empresas aéreas a alterarem as rotas.
Navio abastecido de cartão no porto da Vale em NacalaA medida enfrentaria resistência das companhias, dos passageiros e também de empresários - Pemba é a nova promessa de desenvolvimento de Moçambique, devido à descoberta de enormes reservas de gás natural.
A Odebrecht revelou para o Departamento de Justiça dos Estados Unidos que realizou "pagamentos corruptos" no valor de US$ 900 mil para autoridades moçambicanas, entre 2011 e 2014, período de construção do aeroporto.
Parte desse valor teria sido paga para obter "termos favoráveis em um projeto de construção do governo, que o governo não estava inclinado a aceitar".O caso foi transferido para a Procuradoria da República de Moçambique. Procurado pela BBC Brasil por três semanas, o órgão se negou a comentar o caso. Até hoje, não revelou quem são os moçambicanos envolvidos na denúncia da Odebrecht. A empresa responsável pelos aeroportos do país africano também não respondeu a BBC Brasil.
O Aeroporto de Nacala também apareceu na operação Lava Jato. Um dos delatores da Odebrecht, Antonio de Castro Almeida, afirmou que uma funcionária da Câmara de Comércio Exterior da Presidência da República (Camex) teria recebido 0,1% do valor do contrato para agilizar a aprovação do projeto no órgão - uma das etapas necessárias para liberar o financiamento no BNDES.
A empreiteira informou, por nota, que está colaborando com as investigações brasileiras e estrangeiras: "A qualidade e a eficácia da colaboração da Odebrecht vêm sendo confirmadas dia a dia, e têm sido instrumento valioso para a ação da Justiça brasileira dos países em que a empresa atua. A empresa está comprometida em combater e não tolerar mais qualquer forma de corrupção, e também está decidida a atuar sempre com ética, integridade e transparência".
Desde o princípio da negociação do empréstimo do BNDES, estava claro que Moçambique não poderia oferecer garantias robustas."As dificuldades seriam as garantias oferecidas por Moçambique, um país pobre que não tinha capacidade de oferecer garantias. A gente fez uma estruturação para a garantia de Moçambique ser aceita", afirmou Castro Almeida na delação premiada.Mesmo assim, a Embaixada do Brasil em Moçambique deu seu aval para o projeto. Em 2009, o então embaixador brasileiro no país, Antonio Souza e Silva classificou a obra como "imprescindível".
"O novo aeroporto de Nacala será um ponto central para a região norte de Moçambique, servindo de passagem para outros aeroportos, aumentando o fluxo de passageiros e carga", escreveu o diplomata em telegrama para o Itamaraty, em resposta a pedido de informações do Comitê de Financiamento e Garantia das Exportações (Cofig)."Quanto aos riscos, Moçambique não está disposto a ingressar numa espiral de endividamento irresponsável, conforme experiências passadas. O governo tem pautado suas iniciativas de longo prazo com prudência e responsabilidade técnica", continuou o embaixador.A análise se mostrou equivocada. Moçambique vive hoje uma severa crise da dívida, após o FMI descobrir que o país estava contraindo empréstimos ocultos, fora dos registros oficiais - não é o caso do crédito com o BNDES. Como consequência, a comunidade internacional congelou o repasse de recursos externos, que suportavam nada menos que um terço do orçamento do Estado moçambicano.
O subsecretário-geral para promoção comercial do Itamaraty, Santiago Mourão, afirma que o Aeroporto de Nacala era visto pelo governo de Moçambique como uma peça importante e estratégica para o desenvolvimento do país e imaginava-se que o corredor que vai de Moatize a Nacala seria um motor econômico regional.
Diretor do Aeroporto de Nacala Jeronimo Tambajane dentro da sala de embarque internacional, que nunca foi usada"As dificuldades financeiras com que Moçambique se confrontou não estavam previstas naquele momento. Mas percalços econômicos do país não invalidam a ideia do projeto."O empréstimo para o Aeroporto de Nacala só foi possível porque o Brasil perdoou dívidas anteriores de Moçambique, no valor de US$ 315 milhões - não é possível emprestar para quem tem nome sujo na praça brasileira.
O perdão, ocorrido em 2004, foi o primeiro do governo Lula e um dos maiores já concedidos pelo Brasil. A dívida havia sido assumida durante a ditadura militar, nas décadas de 1970 e 1980.
"Qual foi o grande favor que nós fizemos? Nós liberamos as pessoas para fazerem novas dívidas. É apenas isso. Eles não iam pagar porque não tinham dinheiro", disse Lula, em entrevista em dezembro de 2013.O BNDES argumenta que o empréstimo tinha por objetivo estimular a exportação de serviços de empresas brasileiras. O dinheiro foi fornecido diretamente para a Odebrecht. A estatal de aeroportos de Moçambique tem 15 anos para pagar de volta.O banco informou, por nota, que o financiamento para a construção do Aeroporto de Nacala "seguiu o trâmite usual por que passa qualquer pedido de financiamento ao BNDES". Acrescentou que "o governo de Moçambique continua inadimplente com o BNDES nesses contratos e a renegociação segue em curso, sob condução do Governo brasileiro". O BNDES acionou o Seguro de Crédito à Exportação da União, para cobrir as parcelas não pagas.Após a eclosão da Lava Jato, os créditos do BNDES para projetos de infraestrutura brasileiros na África despencaram. Em 2016, somaram 1% da média anual registrada nos oito anos anteriores - US$ 6 milhões contra US$ 446 milhões.
Passageiros embarcam em aeronave Embraer 190, operada pela LAM (Linhas Aéreas de Moçambique) no Aeroporto Internacional de Nacala
A pista de 3,1 quilômetros do Aeroporto de Nacala é frequentada pelos aviões Embraer 190 e Embraer 145. São aeronaves de tamanho médio, bem menores do que a pista pode suportar. Elas fazem sucesso na África, que não tem um mercado aéreo robusto para aviões com muitos assentos.
Dos sete aviões da Linhas Aéreas de Moçambique, cinco são da Embraer. A compra de parte deles está sendo investigada.
A empresa brasileira revelou para as justiças americana e brasileira ter pagado US$ 800 mil ilicitamente pela venda de dois modelos 190 para a LAM - justamente o que faz a única rota comercial para Nacala - no valor de US$ 32 milhões cada, entre 2008 e 2009.Segundo a denúncia, autoridades moçambicanas solicitaram pagamentos ilegais e receberam uma oferta inicial de US$ 50 mil. O valor teria sido visto "como um insulto" pelos moçambicanos, que esperavam muito mais. Esse teria sido o recado passado por telefone pelo então presidente da LAM para um executivo da Embraer."Poderíamos nos safar com US$ 800 mil", teria sugerido o moçambicano. A fabricante de aviões diz ter realizado dois pagamentos de US$ 400 mil cada para atender o pedido.O caso também está sendo investigado pela Procuradoria da República de Moçambique, que se restringiu a informar que a fase do processo "não recomenda a partilha de informação". A LAM não respondeu à BBC Brasil.Em nota, a Embraer afirmou que reconhece a responsabilidade pelos atos de seus funcionários e agentes e lamenta o ocorrido. "A companhia aprendeu e evoluiu com essa experiência e dará continuidade à sua trajetória de sucesso."