segunda-feira, julho 06, 2020

Aterragens suaves, em pistas mais curtas


O comandante Carlos Soares, Mwani assumido, profissional arrojado e cidadão para todas às ocasiões, parou de pintar os céus com o seu fascínio. Para trás, ficam anos de empenho e entrega a causa dos ares, da segurança aérea e do compromisso para com os passageiros. Quis o destino que uma enfermidade colocasse uma vírgula nessa longa e irrepreensível carreira de aviação civil.
Algumas línguas tornaram convencional um provérbio conhecido. A vida é como um livro. Cada dia uma nova página e, a cada hora, uma nova Vírgula. Nem lápis pode escrever o futuro e, nenhuma borracha pode apagar o passado. Mas, chega sempre um momento em que Deus nos retira o lápis e escreve Fim. Se o papel continuar na mesa, cockpit, Cdte. Carlos Soares, ainda, poderá escrever outras e novas páginas para a Aviaçao nacional, paixão que abraçou, ainda jovem e, se consagrou como dos mais seguros e reconhecidos pilotos do país e da sua querida terra natal.

N855AM (C9-BAQ) • LAM (Linhas Aéreas de Moçambique) • Boei… | FlickrHoje, ainda no limiar do mês de Julho, coincidência ou não, quando, também, nasceu Amélia Earhart, a primeira mulher piloto do mundo, (1897-1937) Carlos Soares conheceu a luz do mundo, franzino e de poucas falas, e, jurou fazer dos ares a sua casa e marca. Em Julho nascem guerreiros e, nele, se constroem as vitórias e se fortificam mais dotados. Cdte Soares faz parte desse naipe.
Entre Pemba e Nampula se criou uma ponte. Todos os devaneios. Soares se juntou a TTA, fez pulverização, amadureceu e entrou, por mérito, para a LAM. Amadurecido e determinado, se fez e provou ao mundo o seu querer e determinação. Rescrever a história da segurança aérea, suavizar os passageiros menos viajados e iluminado mentes de várias gerações.
Cdte Soares deve ter sido o primeiro e, talvez, dos poucos, que fazia os discursos em quatro línguas. Francês, inglês, português e Swahili, sempre que precisava de informar aos passageiros sobre as coordenadas dos percursos. Aqui, no Swahili, residia o encanto e o prazer de ter uma língua nacional falada a 33.000 pés. Isso lhe valeu alcunhas e elogios. Admiradores e fanáticos.
Mas, era a suavidade das suas aterragens, em pistas mais curtas como Pemba e Lichinga, onde colocava a perícia e habilidade. Quem o conheceu fará referência a mestria. Fazia destes lugares pequenos tapetes. Era o Leonardo da Vinci do norte.
A história da aviação no mundo e em Moçambique, será sempre complexa. Ou não será que o desejo de voar esteve sempre presente na história da humanidade. Para Moçambique, voar ainda parece um sonho realizável, sobretudo, quando alguém nos paga à passagem. Muitos dos passageiros ainda acreditam que os aviadores são dotados de poderes divinos, ou ainda, em alguns momentos, eles foram carregados ao ar por animais voadores. Mas, aviação continua sendo velocidade, coração nas mãos, facilidade de manobra, segurança, capacidade de carga e sobretudo de emprestar o sonho da alegria as crianças e aos passageiros de primeira jornada. Soares os conhece bem e, em sua língua materna, ele soube prolongar esses mitos.
Só mentes brilhantes tatuam seus caminhos em noites de lua cheia. Comandante Carlos Soares deixou-se transportar para tantos ares e pistas. Procurou, em todas as asas e ases da história da aviação civil moçambicana o sentido do desafio, o melhor para engrandecer uma marca e a mocambicanidade que ainda iluminam os céus, a vida e os corações de todos que querem fazer deste país, um lugar melhor .
De repente, como que exorcizando identidades aereas, nos sentimos possuídos por vontades e harmonias sincronizadas, revelando as essências do nosso tempo e de tantos voos e peripécias.
Até parece que fomos o impelidos para nos retratarmos, refazendo lembranças espaciais, percursos e rotas dos tempos.
Hoje, nesta celebração, revemos tantas histórias e facetas de um profissional e Pai que assiste o país e o filme dos céus, sentado na sua poltrona feita plateia. Dos passageiros e amigos ficam nestas letras rabiscadas a lápis, um reconhecimento profundo e, a certeza de que nenhuma vírgula travará seu talento.
Entrincheirados, nesta quarentena coronária, resgatamos valores de utopias distanciadas. O mundo já não quer saber de nós e, prescinde dos nossos afectos. Parabéns Cdte Carlos Soares. Muita saúde e resguarde-se! O país saberá fazer-lhe o devido tributo.(X).

Jorge Ferrão , Julho, 2020.

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