A viúva do primeiro Presidente da FRELIMO classifica o título de Doutora Honoris Causa em Ciências da Educação que foi atribuída esta pela UEM como um dos tributos mais valiosos à família Mondlane. Em entrevista exclusiva ao SAVANA, Janet Mondlane fala do Instituto Moçambicano, da Frelimo “romântica” dos anos 60 e das transformações que o partido sofreu com o tempoDefinindo-se não como fazedora de política, mas como admiradora de políticos, Janet disse que o sucessor de Guebuza não tem de ser necessariamente da “Geração 25 de Setembro”. Pelo caminho, Janet Mondlane fez notar que a Frelimo deve ouvir as ideias da oposição para melhorar as suas próprias ideias. Siga as partes mais importantes da entrevista conduzida por Fernando Gonçalves.
Como é que caracteriza a Frelimo hoje, face àquela que ajudou a moldar durante a luta armada?
Há muitas diferenças. Naquela altura era um período que posso descrever de romântico. Não sei se a palavra romântico é a mais apropriada, mas éramos um grupo de pessoas com ideais comuns, que tinham uma causa. Ter uma causa é muito importante, eramos pouca gente e por isso estávamos muito juntos. Por isso o ambiente era do tipo de um movimento quase religioso. Não é possível aplicar hoje a maneira de ser que tínhamos lá; se continuássemos lá naquele período, diriamos que não nos desenvolvemos. É possível desenvolver-se, e a FRELIMO desenvolveu. Posso não concordar com todas as coisas, mas digo que em geral está a tentar movimentar-se para aqueles seus ideais. É por essa razão que naquela altura ouvia dizer que a FRELIMO nasceu em mim, e não posso sair. Tenho muito respeito pelos outros partidos, e muitas coisas que eles dizem, também tem que se analizar e decidir se o que eles dizem corresponde à verdade ou não. Mas temos de ouvir as ideias da oposição para melhorar as nossas próprias ideias. E penso que é isso que estamos a fazer. Tenho muito orgulho do que conseguimos fazer desde a independência, em pouco tempo.
Mas há gente dentro da Frelimo que defende a ideia de que o partido tornou-se menos crítico em relação a si próprio. Partilha desse ponto de vista?
Isso é muito possível. Mas eu não sou bem uma pessoa política; sou admiradora das pessoas que participam na política porque sei que é uma tarefa muito dura. Mas sem crítica não podemos crescer.
Sendo alguém que conhece a Frelimo desde a sua criação, qual é a maior crítica que faz hoje ao partido?
Não tenho nenhuma crítica neste momento. Talvez porque num país tão jovem, eu estou a olhar para o mundo inteiro. Se olhar para o que se passa no mundo, é uma tristeza; em grande parte do mundo, as pessoas estão a lutar para ter aqueles direitos que nós já conquistamos. Por isso, talvez devido a esses movimentos no mundo tenho receio de criticar a Frelimo. Eu estou orgulhosa da Frelimo que temos.
Quando ainda muito jovem, decidiu abandonar o conforto dos Estados Unidos e envolver-se numa luta que tinha um desfecho quase incerto. Fazia-o por um ideal. Sente que esse seu ideal, esse sonho, foi realizado e continua a ser valorizado?
Sobre isso não tenho a mínima dúvida. Algumas coisas têm de andar mal, porque o povo é composto de várias ideias e situações sociais e económicas. Há muita pobreza no nosso país, mas vencer a pobreza depende de todos nós; não podemos ter crianças que estudam sentadas no chão porque a escola não tem carteiras. Não depende do governo estar sempre a dar. O moçambicano tem de agarrar o seu próprio desenvolvimento e sair da pobreza. Penso firmemente que o moçambicano tem de ficar de pé, trabalhar e sair dessa pobreza.
Não pensa que a ausência do envolvimento das pessoas nessa luta contra a pobreza resulte também da falta de uma direcção política clara, que motive as pessoas a se envolverem?
Às vezes é preciso ter muita imaginação; precisamos de nos levantar e caminhar. Não é fácil, mas é a única alternativa para vencer a pobreza.
Depois de ter ajudado a libertar Moçambique do jugo colonial, qual é o seu maior sonho?
Que toda a gente tenha comida suficiente, habitação, educação completa para os seus filhos, que Moçambique se torne mais livre de doenças. Que tenhamos melhores condições de tratar pessoas que estejam doentes. Sonho ver um Moçambique com um bom desenvolvimento humano.No próximo ano realiza-se o décimo congresso da Frelimo.
O presidente Guebuza termina o seu segundo e último mandato, e obviamente que no Congresso a Frelimo procurará encontrar o seu futuro candidato à Presidência da República. Considera que efectivamente já se fechou o ciclo em relação a candidatos da geração do 25 de Setembro?
O Presidente Armando Guebuza é meu amigo pessoal. Trilhamos juntos nessa longa e sinuosa caminhada desde a Tanzânia; conheço-o muito bem e confio muito nele. Será que poderei eu confiar pessoalmente numa outra pessoa que não era meu camarada na luta armada? Isso não posso responder, mas digo uma coisa: as gerações mudam; as pessoas envelhecem, e nós não queremos pessoas que ficam no poder para a eternidade. Temos que mudar, e nós os mais velhos temos de nos conformar. Agora, a confiança que eu tenho sobre a Frelimo é tal que acredito que no congresso eles vão escolher alguém capaz. Mas tenho que esperar para ver quem é essa pessoa para poder dar a minha opinião. Eu posso pensar em muitos, e de certeza que estão lá. Não tem necessariamente que ser desta geração do 25 de Setembro; há pessoas. O que é muito interessante é que às vezes nos rimos, porque os nossos antigos camaradas, referem-se aos que têm mais de quarenta anos, dizendo: “esses jovens, esses miúdos”. Meu Deus, são pais de cinco ou mais filhos. Não é? Mas eu confio, porque o processo político encarrega-se de fazer a filtração. Vai sair muito bem, e disso tenho certeza.
0 comments:
Enviar um comentário