segunda-feira, outubro 25, 2010

País não precisa de alguns casos de sucesso

A propósito da última postagem , recupero um extracto da entrevista concedida ao jornal SAVANA pelo economista e director do IESE, Carlos Nuno Castel-Branco , onde fala da economia nacional. Analisando a aplicação do FIL (Fundo de Investimento Local), vulgarmente conhecido como “sete milhões” este docente universitário explica as razões dos mesmos não reflectirem na redução da pobreza rural:

"Primeiro, os ditos “sete milhões” são valores demasiado pequenos para fazer mudanças de estrutura em Moçambique. Ao todo, os distritos recebem por ano 2% do orçamento geral do Estado (OGE) e 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) de Moçambique. Por que é que 2% do OGE deveria alcançar o que os restantes 98% não alcançam? Quando o projecto piloto de descentralização distrital teve lugar em Nampula entre 2002-2005, por ano os distritos desta província recebiam o dobro do que hoje recebem todos os distritos do País. Segundo, os dados não mostram nenhuma realocação significativa de fundos para os distritos. Os fundos distritais são retirados dos orçamentos provinciais e representam cerca de 7% da totalidade dos orçamentos alocados às províncias. Terceiro, estes fundos são distribuídos para projectos individuais de pessoas localmente influentes e não atingem os mais pobres. Quarto, sendo alocados para projectos individuais, estes fundos operam independentemente da infra-estrutura, da base logística, da base empresarial e institucional que possa garantir o sucesso produtivo e reprodutivo da sua aplicação. Há casos individuais de sucesso – alguns pequenos comerciantes, agricultores e artesãos tiveram sucesso. Mas isto não é forma de combater a pobreza quando quase 12 milhões de moçambicanos vivem com um rendimento abaixo da linha de pobreza. O País não precisa de alguns casos de sucesso para serem mostrados nas presidências abertas e nas feiras; o País precisa de sucesso para milhões de moçambicanos todos os anos se a pobreza alguma vez vai reduzir. E sucesso para milhões de pessoas todos os anos não se consegue com paliativos distribuídos individualmente aos mais influentes de cada local. Segundo as directivas do Governo, os sete milhões devem ser prioritariamente aplicados na produção de comida. As estatísticas do IOF 2008-09 mostram que a produtividade per capita e por hectare baixou, e que a produção de comida per capita está a cair a 1,5% por ano em média. No entanto, as mesmas estatísticas mostram que a posse de bens duráveis aumentou. Será que os sete milhões estão a ser usados para adquirir bens duráveis importados (bicicletas e rádios - que já houve tempo em que os produzíamos em Moçambique e com qualidade -telefones, entre outros) em vez de produzir comida? Se produzir comida não for tornado viável empresarialmente e acessível para todos pelo esforço combinado do governo e produtores, é mais fácil viver de sete milhões e importar bens duráveis".

0 comments: