O Brasil, mais uma vez, deu uma lição ao mundo. A votação foi um êxito de bom senso e o progresso vai prosseguir Segui, com toda a atenção, as eleições presidenciais de domingo em todo o vastíssimo território do Brasil, com uma população de cerca de 192 milhões de pessoas. Foram totalmente corretas e pacíficas, como é próprio de uma grande Democracia consolidada. Como se sabe, adoro o Brasil, esse colosso, transformado em grande potência, que dá hoje cartas na cena mundial. Fui pela primeira vez ao Brasil, em 1970, em tempo de Ditadura. Apesar disso, fiquei fascinado com a alegria ímpar do povo, que fala um português de açúcar - quer dizer mais doce -, como os milhões de imigrantes, perfeitamente integrados, vindos de todos os lugares do mundo.Nesse tempo, o Brasil era um país com grandes diferenças sociais, pobre, embora com enormes potencialidades inexploradas. Stephan Zweig, aí refugiado durante a II Grande Guerra, como judeu, para escapar aos campos de concentração nazis, chamou- lhe, num livro ainda hoje de leitura obrigatória, Brasil, país do futuro. Como disse o jornalista e escritor Alberto Dines, meu querido amigo, que fez uma notável biografia de Zweig, o livro teve um sentido profético e resultou de um profundo conhecimento da terra, dos costumes e da gente. Hoje, o Brasil é um Estado-nação, num território vastíssimo e multifacetado, com uma identidade própria indiscutível, políticos e sindicalistas de primeira qualidade, riquíssimo, e que, embora ainda com grandes desigualdades sociais, empresta dinheiro ao Fundo Monetário Internacional, seu credor durante anos. Entre 2003 e 2008 criou 14 milhões de postos de trabalho, e mais de 25 milhões de brasileiros saíram da pobreza durante os mandatos de Lula. É, pois, incontestavelmente, um "país do presente" - ouvido e respeitado no mundo inteiro - virado completamente para o futuro, como um dos países emergentes. Lula teve a inteligência de seguir a política de contenção e defesa do real, prosseguida por Fernando Henrique Cardoso nos seus mandatos. Não o devemos esquecer. Mas essa atitude só avulta a inteligência política excecional de Lula da Silva. Daí ter feito do Brasil um colosso mundial, que realmente é, pela sua enorme população e pela vastidão do seu território. Tudo isto vem a propósito das eleições presidenciais, para governadores de Estado, deputados e parte dos senadores. Os comentadores - e as sondagens, contavam com a eleição, logo na primeira volta, de Dilma Rousseff, apoiada por Lula, de quem foi chefe da Casa Civil e que foi talvez longe de mais no apoio que lhe deu, aparecendo em todos os comícios e apelando ao voto nela. Talvez isso tivesse um efeito, no final, contraproducente. José Serra, do PSDB, é considerado justamente um grande administrador, impoluto, excelentemente preparado. Foi governador de São Paulo e antigo ministro da Saúde, sendo o segundo candidato, que disputará a 2.ª volta, a 31 de Outubro. A luta é com Dilma, com 46,91% dos votos; Serra teve 32,61 por cento. A diferença é enorme. Mas em eleições sérias, como são as brasileiras, os resultados ao certo só se sabem depois do sufrágio...Para além dos dois, devo salientar ainda o fenómeno que foi Marina da Silva, a candidata dos Verdes, que conseguiu um resultado surpreendente de 19,33% dos votos. Para onde irão esses votos na próxima eleição? Eis o que ninguém pode agora dizer, com rigor. De qualquer maneira, o Brasil, mais uma vez, deu uma lição ao mundo. A votação foi um êxito de bom senso. Trata-se de um Povo com uma coesão admirável, apesar do seu imenso território. O progresso vai prosseguir. A sua liderança em termos de Ibero-América é hoje indiscutível. E, para nós, portugueses, irmãos dos brasileiros, é um orgulho imenso que o Brasil seja membro fundador da CPLP. Vi num inquérito recente que o apelido mais usado no Brasil - de longe - é Silva. Não é extraordinário, ao fim de cinco séculos,com tantos imigrantes? É caso para gritar -neste momento difícil para Portugal - Viva o Brasil! (Opinião de Mário Soares, ex-presidente português /Revista VISÃO)
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