O XIº
Congresso da FRELIMO realiza-se em Setembro.Tomando em consideração que o
Presidente Filipe Nyuse vai procurar garantir coesão do partido rumo às
próximas eleições, mas também há um fogo cruzado depois do discurso do SG da
ACLLIN (Antigos Conbatentes) que acusou alguns militantes de aderirem ao
partido para acomodarem seus negócios.O que pensa o politólogo (professor na
Universidade Eduardo Mondlane) João Pereira?
Não
tenho esperança em relação à Frelimo. A Frelimo que nos orgulhou não mais
voltará. Porque o tipo de pessoas que existiam naquela altura já não existem no
seio partidário. Falo de um Jorge Rebelo, Samora Machel, entre outros. Quem tem
humildade hoje no seio da Frelimo para dizer que tem seguidores, se a função
número um é ter acesso a negócios e a rede clientelista. Hoje a Frelimo não é
projecto de uma agenda nacional. A Frelimo é um projecto de acomodação das
elites em benefício daquilo que são as riquezas deste país. Falar da ética,
pureza dos valores no seio da Frelimo é como se fosses pastor sem seguidores.
Então,
o Congresso vai fortalecer uma rede?
O
meu problema é como os membros do partido vendem a sua consciência. A Frelimo
preocupa-se com quantidade e não qualidade dos membros. Hoje não há filtragem
dos membros para desempenharem cargos, muito menos o estabelecimento de um
perfil. A única mudança que Nyusi pode deixar aos moçambicanos é a paz. Ele pode
aliar-se à sociedade civil, porque esta funciona como meteorologista. Há cinco
anos avisamos que Moçambique caminhava rumo ao caos financeiro, chamaram-nos de
apóstolos de desgraça, hoje estamos em crise. A nossa política como sociedade
civil é despertar a consciência crítica e propostas de soluções.
Quais
os expoentes máximos de falta de ética na Frelimo?
A
ganância, o enriquecimento rápido, o facto de chegar a casa e te perguntar: Eu
trabalhei 40 anos para ter uma cabanazita como é que você arranjou isto e
aquilo em tempo record. A queda de valores se instalou neste país com a
liberalização económica. Toda a gente quer ser burguês, empresário,
negociante... quando perguntas qual é a sua empresa a resposta que te dá é que
chama-se lobby.
Comunga
da opinião de Carlos Machile de que a Frelimo de hoje perdeu a sua vocação?
Isso
não é de hoje, é de há 20 anos. Hoje está mais visível, porque a ganância
aumentou. Porquê a sociedade seria diferente da Frelimo, o polícia cobra motoristas
nas estradas, na escola paga-se dinheiro para se transitar de classe... É
triste ver um partido que tinha princípios para agora estar de rastos e, 40 anos
depois de ter nacionalizado tudo, volta a controlar tudo.
Quem
foram os mentores dessa quebra dos valores?
O
contexto interno e externo permitiu. Os erros de cálculo de 1975 ao fazerem as
nacionalizações e não permitindo a criação de uma burguesia nacional ou terem
transformado a burguesia para o desenvolvimento local. Há muitos antigos combatentes
que não se beneficiam de nada, e mesmo assim continuam leais à Frelimo, em
contrapartida, há um grupo restrito que come em nome de mais 10 famílias de
antigos combatentes.
Em
entrevista ao SAVANA ano
passado dizia que, se o Presidente Nyusi não conseguisse fazer uma ruptura no
partido, seria uma grande desilusão para o povo. Um ano depois como olha para
suas declarações?
Acho
que ainda não conseguiu fazer a ruptura. Não sei se tem hipóteses para fazer
grandes rupturas, porque ele não tinha condições suficientes. Para fazer uma
ruptura na Frelimo é preciso que tenhas algumas condições: Tinha de ter passado
pelo partido como secretário-geral, para montar a sua própria máquina e não
teve esse percurso. O partido foi montado para servir a outra direcção, daí que
a saída de Guebuza não foi pacífica. Mas também tiraram o indivíduo e não a
estrutura por ele montada, por isso que agora está gradualmente a ser mudada.
Se calhar, no congresso, [Filipe Nyusi] consiga fazer alguma coisa, mas não vai
fazer na totalidade, a sobrevivência de qualquer presidente de partidos como a
Frelimo e MPLA obriga alianças com diferentes grupos como dos antigos
combatentes, ala de Chissano, de Guebuza e da juventude. Nisto Nyusi está sendo
muito habilidoso, o problema é que ele não tem muito tempo para fazer grandes
coisas. O seu mandato praticamente já acabou e mesmo que renove, tem apenas
mais dois anos de governação. Depois do segundo ano, no próximo mandato, caso
renove, o partido vai preocupar-se com o processo de indicação do seu sucessor.
Qual
é a sua conclusão, é ou não uma desilusão?
Não
é uma grande desilusão, porque hoje entendi a complexidade que ele tinha. Via-o
como uma pessoa “outsider”, que poderia fazer uma grande ruptura, mas
hoje compreendo melhor a complexidade. Neste momento só poço dizer que o
mandato já acabou, se calhar, daqui a dois anos vai descobrir que é o
presidente mais abandonado na história do partido. Não teve dinheiro suficiente
para desenvolver uma rede clientelista, todos os grandes negócios já tinham
sido acomodados na era Guebuza. Todas as grandes infra-estruturas foram feitas
na era Guebuza e, para deixar um grande presente aos moçambicanos, as maiores
dívidas também foram feitas no mandato anterior.
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