A embaixadora brasileira Leda Lucia Camargo tentou
favorecer a candidatura da filha de um político de Moçambique para o Programa
de Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G), que oferece vagas para
estrangeiros no Brasil, em 2004. Segundo a diplomata, o político era um dos
"mais importantes integrantes" do grupo que decidiria naquele ano se
a Vale do Rio Doce receberia concessão para explorar o carvão de Moatize, no
norte do país.
"Tomo a liberdade de recomendar que seja considerada
com especial atenção a candidatura da estudante (4ª colocada com alta média
entre 33 candidatos) ao curso de Estilismo e Moda da Universidade de Londrina. A
estudante é filha de Sérgio Vieira, alta autoridade do núcleo político do
governo moçambicano, um dos mais importantes integrantes do grupo que decidirá
sobre as minas de Moatize", escreveu em telegrama confidencial e urgente
enviado para o Itamaraty em 21 de julho de 2004.
Apesar do pedido, a estudante não foi aceita. A Vale ganhou
o direito de explorar o carvão moçambicano em novembro de 2004. Leda Camargo
foi a embaixadora do Brasil em Maputo entre 2004 e 2007 e hoje comanda a
Embaixada na Suécia.
O PEC-G é o maior programa de cooperação educacional do
Brasil, desenvolvido pelo Itamaraty e pelo Ministério da Educação (MEC). Estão
cadastradas 97 instituições de ensino superior, entre elas USP, Unicamp, UnB e
UFRJ. De 2000 a 2013, foram beneficiados 7.600 estudantes da África e América
Latina. A escolha é feita em duas etapas. Primeiro, as embaixadas brasileiras
fazem uma pré-seleção. Em 2004, a Embaixada do Brasil em Moçambique selecionou
33 nomes, entre eles o da estudante citada no telegrama. Já a seleção final é
feita em Brasília pelo MEC. Nesta fase, a garota não foi incluída entre os 20
selecionados.
Negativa. O Itamaraty e a embaixadora Leda Camargo
disseram que não podem comentar o teor do telegrama porque ele está
classificado como "secreto", ou seja, com grau de sigilo de 15 anos –
até 2019. Originalmente, o grau de sigilo era "confidencial" - 10
anos. Em abril de 2012, um mês antes da entrada em vigor do decreto que regulamentou
a Lei de Acesso à Informação, o Itamaraty ampliou o prazo de sigilo do
telegrama.
Em nota, a Vale afirmou que não tem nenhuma relação com os
temas apresentados.
Já Sérgio Vieira nega ter sinalizado para Leda Camargo que
a decisão de Moatize poderia ser influenciada pela escolha de sua filha para
universidade brasileira. "Jamais me passaria pela cabeça uma tal tentativa
nojenta de corrupção. A Vale obteve a concessão porque ganhou num concurso em
que participaram várias transnacionais". Ele diz que não fez parte do júri
que tomou a decisão.
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