Os
curdos são um dos povos originários das planícies da Mesopotâmia — território
compreendido entre os rios Tigre e Eufrates — e dos planaltos da região onde
hoje estão o sudeste da Turquia, o nordeste da Síria, o norte do Iraque, o
noroeste do Irã e o sudoeste da Armênia. Hoje, eles formam uma comunidade unida por
raça, cultura e linguagem, ainda que não tenham um dialeto padrão. Eles têm
diversas religiões e credos, mas a maioria é muçulmana sunita.
Por que os curdos não têm um Estado nacional?
No
início do século 20, muitos curdos começaram a considerar a criação de um
Estado, geralmente conhecido como Curdistão. Depois da Primeira Guerra Mundial
e da derrota do Império Otomano, os países ocidentais vitoriosos fizeram uma
provisão para a criação de um Estado curdo em 1920 no Tratado de Sèvres. Mas os
planos foram frustrados três anos depois, quando o Tratado de Lausanne, que
estabeleceu as fronteiras da Turquia moderna, não tratou de um Estado curdo e
os deixou com status minoritário em seus respectivos países. Nas oito décadas
seguintes, qualquer ação dos curdos para estabelecer um Estado independente foi
brutalmente anulada.
Por que os curdos estavam à frente da luta contra o
Estado Islâmico?
Em
meados de 2013, o grupo jihadista Estado Islâmico (EI) voltou seus olhos para
três enclaves curdos que faziam fronteira com o território sob seu controle no
norte da Síria. O EI lançou uma série de ataques que, até meados de 2014, eram
revidados pelas Unidades de Proteção do Povo (YPG) — a ala armada do Partido da
União Democrática Curda da Síria (PYD).O avanço do Estado Islâmico no norte do
Iraque em junho de 2014 também arrastou os curdos daquele país para o conflito.
O governo da região autônoma do Curdistão no Iraque enviou suas forças de
Peshmerga para áreas abandonadas pelo Exército iraquiano.Em agosto de 2014, os
jihadistas lançaram uma ofensiva surpresa, e os Peshmerga precisaram se retirar
de diversas áreas. Várias cidades habitadas por minorias religiosas foram
tomadas, principalmente Sinjar, onde militantes do Estado Islâmico mataram ou
capturaram milhares de yazidis.Em resposta, uma coalizão multinacional liderada
pelos Estados Unidos lançou ataques aéreos no norte do Iraque e enviou
assessores militares para ajudar os Peshmerga. O YPG e o Partido dos Trabalhadores
do Curdistão (PKK), que lutam pela autonomia curda na Turquia há três décadas e
têm bases no Iraque, também ajudaram no combate.Em setembro de 2014, o Estado
Islâmico fez um ataque em Kobane, região curda na Síria, forçando dezenas de
milhares de pessoas a fugirem pela fronteira turca. Apesar da proximidade dos
combates, a Turquia se recusou a atacar posições do Estado Islâmico ou permitir
que curdos turcos cruzassem a fronteira para lutar.
Em
janeiro de 2015, após uma batalha que deixou pelo menos 1.600 pessoas mortas,
as forças curdas recuperaram o controle de Kobane.
Os
curdos — lutando ao lado de várias milícias árabes locais sob a bandeira da
aliança das Forças Democráticas Sírias (SDF) e auxiliados por ataques aéreos,
armas e conselheiros da coalizão liderada pelos EUA — em seguida expulsaram o
Estado Islâmico de dezenas de milhares de quilômetros quadrados de território
no nordeste da Síria e estabeleceram o controle sobre uma grande extensão da
fronteira com a Turquia. Em outubro de 2017, os combatentes do SDF capturaram a
"capital" do Estado Islâmico, Raqqa, e depois avançaram para sudeste
na província vizinha de Deir al-Zour, o último ponto de apoio dos jihadistas na
Síria.
O
último reduto do território mantido pelo Estado Islâmico na Síria — ao redor da
vila de Baghouz — foi tomado pelas Forças Democráticas Sírias em março de 2019.
O grupo falou em "eliminação total" do "califado" do Estado
Islâmico, mas alertou que as células adormecidas jihadistas continuam como a "grande
ameaça" para o mundo.
FOTO
MAPA
Por que a Turquia considera os curdos uma ameaça?
Há uma
hostilidade enraizada entre o Estado turco e os curdos do país, que representam
de 15% a 20% da população da Turquia, em torno de 80 milhões de habitantes.
Os
curdos receberam tratamento duro nas mãos das autoridades turcas ao longo de
diversas gerações. Em resposta aos levantes nas décadas de 1920 e 1930, muitos
curdos foram reassentados, nomes e roupas foram proibidos, o uso da língua
curda foi limitado e até a existência de uma identidade étnica curda foi
negada, com pessoas designadas como "Turcos da Montanha" .
Em
1978, Abdullah Ocalan fundou o PKK, que defendia um Estado independente curdo
na Turquia. Seis anos depois, o grupo iniciou uma luta armada. Desde então,
mais de 40 mil pessoas foram mortas e centenas de milhares foram desalojadas.
Nos
anos 1990, o PKK recuou em seu pleito por independência, pedindo maior
autonomia cultural e política, mas continuou a lutar. Em 2013, um cessar-fogo
foi acordado após a realização de conversas a portas fechadas.
O
cessar-fogo entrou em colapso em julho de 2015, depois que um atentado suicida
atribuído ao Estado Islâmico matou 33 jovens ativistas na cidade de Suruc, de
maioria curda, perto da fronteira com a Síria. O PKK acusou as autoridades da
Turquia de cumplicidade e atacou soldados e policiais turcos. Em seguida, o
governo turco lançou o que chamou de "guerra sincronizada ao terror"
contra o PKK e o Estado Islâmico.
Desde
então, milhares de pessoas, incluindo centenas de civis, foram mortas em confrontos
no sudeste turco.
Donald Trump assegurou esta
quarta-feira que enviou uma missiva “muito poderosa” ao homólogo turco, Recep
Tayyip Erdogan. Reconhecendo que a situação na fronteira entre a Turquia e a
Síria é "complicada", defendeu ser "um problema" face ao
qual os EUA têm "um controlo muito reduzido". Negou ainda também ter
dado "luz verde" para que a Turquia invadisse o norte da Síria após a
saída das tropas norte-americanas daquele território.
"Não lhes dei luz verde.
Quando dizem isso, é uma grande mentira", sublinhou, em mais uma resposta
às crescentes críticas sobre essa decisão. "Foi o contrário de uma luz
verde. Primeiro, tínhamos muito poucos soldados aí. Na sua maioria já tinham
partido", assegurou aos jornalistas. Já na carta que entretanto foi
divulgada, Trump aposta num tom muito pouco informal e desafia Erdogan a
chegarem a consenso: “Vamos trabalhar num bom negócio! Não quer ser responsável
pelo homicídio de milhares de pessoas, e eu não quero ser responsável por
destruir a economia turca”. Promete ainda ter garantias de que os militares
curdos estão disponíveis para negociar e “fazer concessões” até agora nunca
feitas.
“A história olhará para si de
forma favorável se fizer isto pela via certa e humana. Olhará para si para
sempre como o diabo se coisas boas não acontecerem. Não seja um tipo difícil.
Não seja tolo!”, escreve, terminando com uma promessa de um telefonema para
breve.
Na semana passada, após a
retirada dos militares norte-americanos do norte da Síria, a Turquia lançou uma
ofensiva contra a milícia curda das Unidades de Proteção Popular (YPG), também
definida como uma “formação terrorista” e considerada por Ancara o ramo sírio
do PKK. O objetivo é o de criar uma “zona de segurança” de 32 quilómetros de
largura ao longo da fronteira entre a Turquia e Síria para manter as YPG à
distância e repatriar uma parte dos 3,6 milhões de refugiados sírios que
atualmente vivem em território turco. A ofensiva abre uma nova frente na guerra
da Síria que já causou mais de 370.000 mortos e milhões de deslocados e
refugiados desde que foi desencadeada em 2011.
A carta na íntegra:
Sua excelência
Caro Sr. Presidente:
Vamos trabalhar num bom negócio! Não quer ser responsável
pelo homicídio de milhares de pessoas, e eu não quero ser responsável por
destruir a economia turca - e serei. Eu já dei um pequeno exemplo a respeito do
Pastor [Andrew] Brunson.
Trabalhei intensamente para resolver alguns dos seus
problemas. Não desiluda o mundo, consegue fazer um ótimo acordo. O general
Mazloum está disposto a negociar consigo e disponível para fazer concessões que
nunca antes fez. Em anexo segue uma carta confidencial da carta que ele me
enviou, acabei de a receber.
A história olhará para si de forma favorável se fizer
isto pela via certa e humana. Olhará para si para sempre como o diabo se coisas
boas não acontecerem. Não seja um tipo difícil. Não seja tolo!
Ligo-lhe mais tarde.
Cumprimentos”
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