Aqui vai a minha intenção de voto.
Há sinais fortes de que estas
eleições sejam decididas pelo voto imbecil.
Quem vota desta maneira não é
aquele que vota pelo partido ou candidato que eu não apoio. Voto imbecil é o
voto de protesto. É legítimo não estar satisfeito com o desempenho da Frelimo e
do seu candidato. É também legítimo decidir, na base disso, não votar neles. A
democracia é isso mesmo. O problema, porém, é que a democracia não é uma
brincadeira de crianças que se punem negando apoio umas às outras. Democracia é
uma das melhores maneiras encontradas para comprometer cada um de nós com o
País. Quem não quer votar nos que estão no poder agora, tem que o fazer em
plena consciência do que vai acontecer depois.
Dito doutro modo, o eleitor tem que saber ou considerar que as
coisas serão melhores. Para saber isso, precisa de se informar sobre os outros
programas e candidatos e na base dessa reflexão certificar-se que o País estará
em melhores mãos. Dizer apenas tudo, menos estes, é não só votar de forma
imbecil como também ser imbecil. Não há na história país que tenha sido
construído por imbecis e tenha sido bem sucedido.
Atenção que não estou a dizer
que quem não votar na Frelimo e em Nyusi é um imbecil. Estou a dizer que não
votar neles sem também ter boas razões para achar que um outro governo possa
ser bom para Moz é votar de forma imbecil. Há anos, perante a escolha entre um
candidato da direita (Chirac) e um da extrema-direita (Le Pen), muitos
eleitores socialistas votaram em Chirac e logo a seguir foram lavar as mãos com
sabão. No Brasil (à esquerda) e nos EUA o voto imbecil levou ao poder dois energúmenos que
não só não trazem a solução que se esperava como também estão a destruir a
democracia e o tecido social.
O voto imbecil decorre duma leitura problemática do País com três
desdobramentos.
O primeiro consiste numa abordagem moralista da política.
Espera-se dos governantes uma conduta moral e ética que simplesmente é
irrealista. Isto não quer dizer que roubar fundos públicos ou tirar proveito
pessoal dos cargos sejam condutas aceitáveis. Não são e devem ser sancionadas.
Mas é um equívoco grave pensar que eles sejam responsáveis pela ausência de
desenvolvimento. Não importa quantos doadores dizem isso e quanto dinheiro eles
dão a incautos e oportunistas para promoverem a ideia de que a ausência de
desenvolvimento é culpa dos governantes moçambicanos. O argumento da corrupção
é a mentira do século e é profundamente anti-político porque promove a ideia de
que desenvolvimento é questão técnica, não política.
O segundo desdobramento consiste na ideia de que maus governantes
necessariamente são maus para o País. Também não é verdade. Eu acho que o
actual presidente não está à altura do cargo, mas não é por isso que o país
está ou estará mal. A questão sempre é o contexto em que ele age. Tivemos presidentes
com perfis completamente diferentes, mas os resultados não são necessariamente
diferentes. O que é recordado como tendo sido o melhor, o barbudo, foi o que
mais estragos fez ao País apesar (ou se calhar por causa) do seu carisma, da
sua integridade e do seu suposto compromisso com o País. O que me mete medo em
Nyusi é a evidente mediocridade do secretariado do partido - que inclui pessoas
com evidentes dificuldades com a língua portuguesa, 40 anos depois da
independência! - a trivialização da Comissão Política e a hostilidade crescente
em relação ao pensamento crítico no interior do partido.
O terceiro desdobramento consiste na ausência de visão. É verdade
que, como se costuma dizer, quem tem visões precisa de psiquiatra, mas a
pobreza é gritante neste quesito. O País é dum modo geral pensado em termos
emprestados da indústria do desenvolvimento: acabar com a fome, analfabetismo
e, claro, com a corrupção. Muita gente que se considera crítica percorre Moz de
cima para baixo convencida de que isso é que é visão e nivela o debate na
esfera pública com slogans e palavras que pensam por nós. Visão é algo mais
profundo. Tem a ver com o tipo de valores que a nossa comunidade política deve
emular. O debate político, então, é sobre o tipo de instituições que devem ser
criadas, ou reforçadas, para que os princípios que promovem esses valores
funcionem. O republicanismo, por exemplo, é o compromisso com a cidadania. O
debate é sempre sobre as instituições políticas necessárias para que princípios
como a liberdade de expressão, por exemplo, funcione como garante da cidadania.
Eu acho que a Frelimo e o seu candidato não representam o que de
melhor existe na nossa sociedade. Infelizmente, os outros, pela leitura que
faço das suas propostas, das suas intervenções e da sua postura, inspiram-me
menos confiança ainda. Continuo a achar que estamos a escolher o menos mau, mas
mesmo aí precisamos de ser cuidadosos. O que isso significa para mim é que já
sei o que devo continuar a interpelar depois do dia 15. Vou insistir para que a
Frelimo revitalize o partido. Vou insistir para que haja maior transparência
governativa. Isso significa para mim que o governo tem que se abrir à
assessoria pública. Não se explica que depois das dívidas ocultas o governo
tenha tido o desplante de negociar e decidir sobre os destinos a dar aos
proventos da exploração de recursos naturais em Cabo Delgado sem ampla
discussão pública. Esse autismo governamental tem sido, desde os gloriosos
tempos da “revolução “ um dos nossos maiores calcanhares de Aquiles.
Finalmente, vou continuar a insistir numa maior reflexão sobre as instituições
políticas. O acordo de paz definitiva foi a esse nível um grande retrocesso.
Enraizou uma lógica neo-patrimonial que vai continuar a atrair para a política
oportunistas, não patriotas. Foi o maior erro deste governo!
Mas, prontos, aí está a minha intenção de voto. Não é voto imbecil.
(Prof. E.Macamo )
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