Em todo mundo, prender
um corrupto e mantê-lo na prisão já não basta. É preciso confiscar-lhe a
propriedade gerada na corrupção. Isso dói mais do que uns anitos de
confinamento na cela. Dizem que os nossos detidos das “dívidas ocultas” calote
estão se nas tintas. Quando saírem vão se chafurdar no ouro sujo calote. A
Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC, na sigla em inglês), que
Moçambique ratificou em 2006, contém provisões essenciais para equipar a legislação
doméstica dos países membros nesse domínio. Alguns países foram mais flexíveis
e adoptaram leis nacionais que ajudam quando se trata de confiscar bens
provenientes de negócios sujos. Outros nem tanto! Moçambique só agora está a
“tentar” adoptar um quadro legal específico que permitirá a recuperação em
tempo razoável de activos obtidos ilicitamente.
O caso vigente do
calote com as chamadas “dívidas ocultas” mostra a urgência de um tal aparato
legal. Nominalmente, o Estado moçambicano foi lesado em mais de 2 mil milhões
de USD. O esquema envolveu pagamentos chorudos, subornos a servidores públicos,
titulares de cargos políticos e intermediários por terem orquestrado e
facilitado o endividamento ilegal. Este caso do calote (investigado sob o
processo nº 1/PGR/2015) tem 20 acusados, entre os quais 11 detidos, mas dos 2
mil milhões de USD a investigação só rastreou 61 milhões de USD (apenas 3 por
cento).
Parte desse
valor é o que foi apurado como tendo entrado em contas bancárias locais. Outra
é representada por propriedade alegadamente adquirida (os carros e as casas do
Teófilo Nhangumele!) pelos implicados, usando o dinheiro do calote. E o resto
onde está? Como rastrear o que Ndambi Guebuza terá encaixado? E terá chegado
algum ao pai? E Gregório Leão? Quanto recebeu? Onde está afinal o dinheiro dos
subornos a Inês Moiane? E Renato Matusse declarou tudo na sua famosa proposta
de “transação penal”? Manuel Chang tem mesmo propriedade na Espanha e Portugal?
É sua propriedade ou de seus parentes? E como chegar lá?
A UNCAC contém
provisões que facilitam a cooperação judiciária internacional visando recuperar
activos. Por exemplo, se Manuel Chang for extraditado para os EUA não será
nenhum drama para o Estado moçambicano neste domínio específico. Aliás, do ponto
de vista de recuperação de activos, até é bom que assim seja. Porque isso
permitirá o FBI ir a tudo o que é lugar no mundo e buscar o que comprovadamente
foi gerado na roubalheira. Mas, será que Moçambique quer ou vai continuar a
achar que a figura do “confisco alargado” constante do “indictment” americano
é-nos prejudicial? (Na verdade não é!).
Enfim, o tema
tem muito pano para mangas. Aliás, o caminho seguido por Moçambique é muito
discutível. Angola, que seguiu uma estratégia diferente, já recuperou largos
milhões de USD, sem prender tanta gente. Moçambique prendeu meio mundo e não
recuperou quase nada. Mas, será apenas por falta de legislação? Ou vontade
política? Ou falta de meios técnicos? Ou a captura do Estado pela elite da
Frelimo não facilita a investigação? O dinheiro foi gasto lá fora? E porque não
usamos a cooperação judiciária internacional para irmos um pouco mais longe?
Até onde os Emirados Árabes Unidos podem protelar essa cooperação?
Eis algumas das
questões que estarão em discussão, numa conferência organizada pelo CIP, a ter
lugar no VIP Maputo. O principal orador é Rick Messick, um advogado
especialista na UNCAC. Já trabalhou para o Banco Mundial e foi assessor no
Senado americano para extradição e recuperação de activos. Há pouco menos de
dois meses, ele almoçou com “Carta”, em Maputo, e explicou quais eram
as possibilidades de Moçambique dar um golpe tremendo, com o apoio do FBI, nos
caloteiros por via do confisco do património “lavado” em grande parte
estrangeiro. Quem tem medo?
Vale a pena atender a
este evento! (M.M.)
0 comments:
Enviar um comentário