O Presidente da República está em Angola e uma das
coisas de que gostou foi ter notado que os partidos políticos não têm militares
ou forças armadas. Gostou tanto ao ponto de sugerir que os deputados
moçambicanos explorassem a experiência angolana.Quando os moçambicanos falam ou ouvem falar da
“solução angolana” pensam na morte de Jonas Savimbi, em Fevereiro de 2002. Esta
morte coincidiu com fim das hostilidades entre a UNITA e o governo. Desde 2002
a esta parte, não existem em Angola, outras forças militares que não sejam
estatais. Em Moçambique porém, a Renamo ficou com algumas forças residuais, ao
abrigo dos acordos gerais de Roma de 1992. A verdade porém é que mais tarde
soube-se que a Renamo escondeu parte da sua tropa e durante o conflito de 2012,
houve algum recrutamento adicional. Desde 1992 que a imprensa nacional reporta
sobre “descobertas” de esconderijos de armas e recolha de outros, incluindo o
ataque e roubo ao quartel de armamento de Dondo, em 2013.Ao falarmos da “solução angolana” precisamos ter
em mente das diferenças e similaridades. Comecemos pelas similaridades, que é
mais fácil. Angola e Moçambique são países falantes da língua oficial
portuguesa. Ambos surgem em resultado da luta armada de libertação nacional e
do Golpe de Estado de 25 de Abril de 1974, que desencadeou os processos de
independência nacional. É só isso. O resto é tudo diferente.
Existe ume tendência simplificadora que estipula
que aprender dos angolanos queira significar “matar Dhlakama”, que por hora, é
visto como o maior empecilho à paz, tal como foi Savimbi. Se bem que com a
morte de Jonas Savimbi e António Dembo, seu vice-presidente, tenha contribuído
para acelerar a Paz, foi sobretudo a atitude subsequente do governo que
propiciou o início das conversações e o entendimento. A guerra podia ter
continuado perfeitamente caso fosse este o interesse do governo forçar a
capitulação da UNITA. E a UNITA poderia ter resistido até onde pudesse caso
fosse forçado neste sentido. A sequência dos acontecimentos seguintes à morte
em combate do Dr Jonas Savimbi e António Dembo, nomeadamente a publicação do
plano de Paz do governo e cessação das ofensivas, propiciaram um clima de
confiança para que o General Gato e seus companheiros avançassem para as
negociações. Portanto, “solução angolana” significa iniciativa do governo em
buscar a Paz e não em matar ou perseguir os adversários. Por outro lado,
significa um resoluto interesse da contraparte em desarmar-se.
A UNITA celebrou pelo menos três acordos com o
governo de Luanda: Os acordos de Bicesse em 1991 (Portugal); o Protocolo de
Lusaka em 1994 (Zâmbia) e o Memorando de Luena (Moxico) e Luanda em 2002. A
Renamo assinou em 1992 os Acordos de Paz de Roma e em 5 de Setembro de 2014.
Estava claro nos Acordos de Bicesse que nenhuma força política deveria ter
militares até a data das eleições gerais, em 1992. O Protocolo de Lusaka veio
corrigir alguns defeitos do Acordo de Bicesse e possibilitou a formação do
governo de unidade e reconciliação nacional, GURN. E o memorando de Luena
assinado em março, 30 seguindo-se da assinatura oficial a 4 de Abril de 2002
tratou de aspectos técnicos meramente militares.A narrativa do processo de Paz angolano mostra
como em vários momentos, o governo fez cedências significativas para acomodar a
UNITA, em reconhecimento das falhas dos processos. O GURN foi o reconhecimento
das irregularidades das eleições cujo resultado foi anunciado em Outubro de
1992; a amnistia geral à todos crimes de guerra bem como o levantamento das
sanções a UNITA pela ONU; a declaração unilateral de paz pelo governo e ainda a
estratégica decisão em “negociar a Paz” em vez de exigir a capitulação foram
medidas que não encurralaram a UNITA, pelo contrário, possibilitaram que ela
própria pensasse seriamente e de forma entusiástica na Paz. O nome completo do
último acordo entre a UNITA e o governo é: Memorando de entendimento
complementar ao Protocolo de Lusaka para a cessação das hostilidades e
resolução das demais questões militares pendentes nos termos do protocolo de
Lusaka. Este Memorando prevê entre outros aspectos, a acomodação dos generais
da UNITA nas hostes militares, desarmamento e desmobilização e reinserção
social. O mapa anexo ao memorando indicava um efectivo de 5007 soldados, entre
oficiais superiores. Com efeito, ao abrigo deste memorando, seis
tenentes-generais e 14 brigadeiros foram imediatamente integrados no exército.Aqui, se podemos aprender alguma coisa dos
angolanos é a sua capacidade de fazer acordos completos, claros e blindados
contra qualquer tipo de manipulação. Tanto o AGP como o acordo de cessão de
hostilidades de 5 de Setembro são documentos vagos e omissos em partes
concernentes a questões militares. Criou-se a EMOCHIM sem se conhecer o número
de homens por desarmar; o próprio acordo de cessação das hostilidades não tinha
nada de concreto senão o calar das armas em si.
A morte de Jonas Savimbi e António Dembo deixou a
UNITA bastante dividida. Lembre-se da UNITA-Renovada dirigida pelo Eugênio
Manuvakola, da “ala externa” onde pontificava Isaías Samakuva e a ala militar
dirigida pelo então secretário-geral Lukamba Gato. O governo de Luanda tratou
de clarificar com quem iria negociar a Paz. Ou seja, não andou manipular muito
menos instrumentalizar várias fações para daí tirar proveito. Tal atitude
contribuiu não apenas para o alcance da Paz como para posterior reunificação da
família do galo negro. A lição que se pode tirar aqui é que o governo
moçambicano não deve perder tempo em aliciar alguns soldados e fazendo notícias
com isso. A pessoa com quem se deve negociar é Afonso Dhlakama. Não existe
Renamo moderada, Renamo radical ou Renamo do mato ou da cidade. A Renamo é
única e todos seus interesses estão sob comando de Afonso Dhlakama.
A diferença entre Savimbi e Dhlakama é que
Dhlakama está disponível em negociar coisas concretas. Se Savimbi fosse
Dhlakama não acabaria morto em combate. Por sua vez, se Dhlakama fosse Savimbi,
ou este país estaria já a ser governado pela Renamo a força ou Moçambique se
transformaria numa Somália, dividida, dilacerada e com governos autónomos
fragmentados. O que não temos em Moçambique é um MPLA que esteja disposto em
fazer as necessárias concessões para que finalmente a Paz reine. Explico-me.
Não é que em Angola as coisas estejam boas, longe
disso. Mas existe um consenso alargado, transversal sobre o imperativo de
preservar a paz e desarmar as mentes. É consensual que nenhum partido deve
possuir forças armadas. A luta política, esta, deve continuar sem recurso as
armas. Não é o caso Moçambicano, tanto ao nível do governo como na oposição. A
guerra ainda é vista como opção em alguns círculos.
• Querendo a Paz o estado pode unilateralmente
declarar o fim da perseguição aos homens da Renamo e ao Dhlakama, convidando-o
para a mesa das negociações. Foi o que o governo angolano fez depois de matar
Savimbi.
• Jonas Savimbi não era homem do diálogo e em
algum momento acreditou que era capaz de tomar o poder pela via armas.
Contrariamente, Afonso Dhlakama quer negociar e acredita sempre numa solução
política. A última vez que foi visto, ele se preparava para ir ter com o PR em
Maputo, quando as forças governamentais quase lhe matavam em sua casa na Beira.
• Tanto o governo angolano como a UNITA celebraram
melhores acordos em comparação com declarações evasivas dos acordos entre a
Renamo e o governo.
• O governo angolano integrou um número
considerável de generais da UNITA enquanto o nosso se recusa.
• Existe um anacronismo na Renamo (justificável ou
não) que condiciona a entrega de listas detalhadas de seus homens armados
contra um acordo prévio sobre os termos de reintegração.
• Por outro lado, existe do lado do governo
moçambicano uma resistência em trazer de volta ao activo os oficiais superiores
provenientes da Renamo que foram discriminados.
Em conclusão, se existe algo que se pode aprender
da “solução angolana” é a seriedade. Não é matar Dhlakama, que ele não é
Savimbi. Dhlakama quer dialogar. Savimbi não queria.
Nós somos pouco sérios quando o assunto é a Paz.
Eles, os angolanos são muito sérios quando o assunto é a Paz. (E.Vaz in Facebook)
Leia o Acordo Governo/Renamo
Leia o Acordo Governo/UNITA
Leia o Acordo Governo/Renamo
Leia o Acordo Governo/UNITA
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