As
organizações signatárias desta Declaração, nomeadamente, a Comissão Episcopal
de Justiça e Paz (CEJP), a União Provincial dos Camponeses (UPC) de Cabo
Delgado, o Departamento de Ética, Cidadania e Desenvolvimento da Universidade
Católica (UCM), o Observatório do Meio Rural (OMR), o SEKELEKANI, o Centro de
Integridade Pública (CIP) e Justiça Ambiental (JA!) reunidas na Sala Magna da
UCM-Pemba com outras organizações convidadas, membros do Governo Provincial e
diversas individualidades discutiram a “Conflitualidade humana na exploração de
recursos naturais na província de Cabo Delgado – reflexões e perspectivas.”
Com
base em 12 apresentações agrupadas em três painéis temáticos: (i) violência
armada no norte de Cabo Delgado; (ii) exploração de recursos naturais e
conflitualidade; e (iii) indústria extractiva e políticas públicas, o seminário
fez muitas constatações, de entre as quais se ressaltam as seguintes:
1) A situação na
região norte de Moçambique, em geral, e na província de Cabo Delgado, em
particular, apresenta-se preocupante devido às transformações geradas pela
exploração de recursos naturais;
2) Tal exploração
processa-se de forma caótica, num cenário que começou por ser de ausência do
Estado e de oportunismo generalizado. As más práticas da exploração informal e
caótica dos recursos naturais foram interrompidas com a afirmação repressiva
das forças de defesa e segurança, limitando o acesso de milhares de pessoas a
recursos naturais como pedras preciosas, grafite, terras, recursos pesqueiros,
mas também madeira e marfim;
3) Os processos de
reassentamento têm sido caóticos, onde o Estado aparece em aliança com o grande
capital, agravando situações de pobreza das populações;
4) Fenómenos de
pobreza generalizada têm coexistido com o surgimento de elevadas expectativas
sociais, entretanto frustradas, geradores de conflitualidade;
5) A intensificação
do conflito militar com os protagonistas dos ataques armados agrava os níveis
de pobreza na província, tornando muitos jovens capturáveis por movimentos
violentos, alimentando-se de um ciclo vicioso, que urge reverter.
Em
face destas constatações, os participantes do seminário declaram que:
a) As organizações da sociedade civil devem coordenar
uma estratégia de pesquisa multidisciplinar, global e integrada envolvendo
também organizações que trabalham com advocacia;
b) As organizações da sociedade civil devem exigir
mais espaço de diálogo para influenciar decisões de políticas com base em
evidências de pesquisas;
c) As organizações da sociedade civil devem promover a
cidadania através de acções de formação e debates com grupos diferenciados;
d) O Governo deve eliminar os obstáculos de acesso à
informação a jornalistas, investigadores e cidadãos em geral aos locais de
conflitos;
e) O Governo deve rever o modelo extractivo da
economia, que não é gerador de emprego, é potenciador de exclusão social, de
desigualdades e de conflitos;
f) O Governo deve eliminar os benefícios fiscais
redundantes, com vista ao aumento da receita fiscal e canalização de receita,
de forma transparente, para um investimento social inclusivo nas áreas
afectadas;
g) O Governo deve promover o investimento inclusivo,
realmente gerador de empregos, investindo em serviços públicos (educação,
saúde, energia, água, saneamento, transportes e vias de acessos), promovendo a
integração económica do território, assim como oportunidades de criação de
rendimentos das populações, em áreas de exploração de recursos naturais;
h) O Governo deve aplicar os regulamentos existentes
em relação a reassentamentos, e revisão do papel do Estado na mediação deste
processo, lembrando o papel do próprio Estado na representação e defesa dos
cidadãos;
i) O Governo deve garantir o acesso das comunidades e
famílias ao seu direito constitucional de posse e uso da terra, e a consequente
justa compensação em caso de sua atribuição para investimentos públicos ou
privados;
j) O Governo deve assegurar que as comunidades
abrangidas por projectos de investimento recebam atempadamente informação
adequada e detalhada sobre tais projectos, bem como assessoria jurídica para
interagir com as partes interessadas;
k) Deve haver maior acção por parte de organizações do
Estado nomeadamente, a Comissão Nacional de Direitos Humanos, a Procuradoria
Geral da República de Moçambique e os Tribunais;
l) O Governo deve providenciar assistência às pessoas
desalojadas pela violência causada pela insurgência, e criar condições que irão
permitir-lhes regressarem às suas casas voluntariamente, em segurança e com
dignidade;
m) O Governo deve fazer uma revisão da estratégia de
actuação militar, capacitando os militares em matérias de direitos humanos e
outras formas de relacionamento com os cidadãos, apostando-se em amnistias e em
incentivos para reinclusão social.
Pemba, aos 23 de Agosto de 2019
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