O perito em Direito Internacional André Thomashausen
não tem dúvidas de que a defesa do antigo ministro das Finanças Manuel Chang
está deliberadamente a apostar em tácticas dilatórias, com o recurso a
expedients que têm travado a sua extradição para os EUA. Para Thomashausen, a
África do Sul não tem alternativa senão extraditar Manuel Chang para os EUA, ao
abrigo do acordo de extradição vigente entre os dois países. O protocolo da
SADC evocado pela justiça moçambicana para requerer o julgamento do
ex-governante no país ainda não está em vigor, considera o jurista. Há duas semanas,
o Departamento da Justiça Americano anunciou os restantes co-acusados de Manuel
Chang. Trata-se de Teófilo Ngangumele e António Carlos do Rosário, duas
peças-chave no esquema das dívidas ocultas, que também se encontram detidos em
conexão com o caso. Outro co-acusado é Najub Allam, um alto funcionário da
Privinvest.
Considera que as diligências a
que os advogados de Manuel Chang têm lançado mão são dilatórias e que visam
arrastar o caso na justiça sul-africana por razões meramente financeiras?
São tácticas muito evidentemente dilatórias, mas em
muitos aspectos também manifestam ignorância da lei e falta de experiência com
direito das extradições.
O recurso da defesa de Manuel
Chang ao presidente Cyril Ramaphosa é uma forma de politizar o caso e tentar
capitalizer uma eventual simpatia política, dados os laços entre o ANC e a
Frelimo?
Não. Muito tarde, no processo, estes advogados
lembraram-se de consultar a Lei da Extradição da África do Sul nº 67 de 1962, a
tal que foi revista em 2001 e 2004. Descobriram que os pedidos de extradição
que não podem invocar um acordo de extradição (por tal acordo não existir)
devem seguir um processo diferente, nos termos do artigo 3 (2) dessa lei, que
prevê que o chefe do executivo, na África do Sul, o presidente, deve em
primeiro lugar decidir se a pessoa procurada por um outro Estado pode ou não
pode ser extraditada.A razão do tratamento distinto de pedidos baseados num
acordo de extradição e pedidos feitos na falta de um tal acordo está na regra
fundamental do direito internacional público que não impõe aos estados um dever
geral de conceder pedidos de extradição e assim os tais pedidos só se tornam
vinculativos nos casos em que existe um compromisso legal nos termos de um
acordo de extradição. A falta de um acordo de extradição válido entre
Moçambique e a África do Sul é agora admitida pelos advogados de Chang, com o
pedido que fizeram que uma decisão preliminar pelo presidente da África do Sul
nos termos desse artigo 3 (2) é requerido por lei. Isso depois de eu ter explicado
isso numa entrevista à Rádio Nacional. Extraordinariamente, ao longo destes
meses, nenhum jurista envolvido nas muitas iniciativas para evitar que Chang vá
prestar testemunho nos EUA reparou que o Protocolo da SADC sobre Extradição não
está em vigor, devido ao não cumprimento da regra do artigo 31 desse Protocolo.
É juridicamente atendível a
pretensão da justiça moçambicana de ter Manuel Chang julgado em Moçambique?
Não, o artigo 15 do acordo de extradição entre os EUA
e a África do Sul torna isso impossível, a não ser que a África do Sul queira
cometer uma violação desse acordo que, aliás, também foi transformado em lei
interna da África do Sul. Uma decisão em violação do tal artigo 15, assim
também constituirá uma violação do princípio do Estado de direito e seria
invalidada em última instância pelo Tribunal Constitucional.
Que argumentos serão razoáveis
para a África do Sul rejeitar o pedido da justiça moçambicana e atender ao
pedido norte-americano?
São os critérios contidos no artigo 15 do acordo de
extradição com os EUA, nomeadamente, a prioridade que deve ser dada a pedidos
baseados em acordos formais de extradição, a seriedade dos crimes inculpados, a
data e o lugar da consumação dos crimes inculpados, a anterioridade do pedido
dos EUA, o balanço dos interesses dos estados afectados, a nacionalidade das
vítimas dos crimes inculpados e se o país que deve ceder a extradição a outro
Estado terá a possibilidade de apresentar pedidos de extradição subsequentemente
ao julgamento do arguido. Assim fica claro que Moçambique sempre poderá
apresentar um pedido de extradição ulterior, depois do julgamento de Chang nos
EUA, já que Chang não arrisca pena de morte e execução nos EUA, ficando assim
disponível para uma eventual e subsequente extradição para Moçambique.
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