Estava eu em
Bruxelas quando se deu o “golpe de estado” contra o amado presidente Robert
Mugabe. As televisões das principais cidades europeias, numa descomunal
alegria, transmitiam as imagens da queda do “pai da nação zimbabweana”. Apesar
de sucessivos bloqueios, Zimbabwe estava a erguer-se, até que o “golpe militar”
destruiu irremediavelmente o “pólen da esperança” que crescia e florescia nos
corações dos zimbabweanos.
Nessa noite do
“golpe palaciano”, meu cunhado e antigo farmeiro do Zimbabwe, ligou-me e
estranhamente disse-me que “os zimbabweanos escolheram o caminho da perdição.
Tiveram pressa de mudança ignorando a dimensão internacional do problema”. De
facto, aprendi com a idade, que quaisquer que sejam as mudanças precisam de ser
previstas, planeadas e acauteladas. Os zimbabweanos, hoje, estão a apagar a
factura do “golpe”.
As palavras do meu
cunhado, “inimigo figadal” de Mugabe, puseram-me a pensar seriamente no futuro
do Zimbabwe. Uma pessoa com dois dedos de testa facilmente compreendera que o
“golpe” tinha sido um convite para pacificação das relações com o passado. Isto
é, com os antigos “patrões do Zimbabwe”. O mal dos “golpes” é mudar de sistema
e não de ideologias. Os farmeiros brancos e a “fauna acompanhante”
aperceberam-se de que falsos eram os anúncios da inauguração da nova era para o
Zimbabwe. Como dizia um amigo “É como dar isca ao peixe na geleira”.
Mugabe deu aos
zimbabweanos o que nenhum outro líder africano foi capaz de dar: pátria e o
direito de propriedade. Acabou com o domínio racial, equilíbrio que lhe valeu
“uma coroa de espinhos”. Não foi Mugabe que destruiu o Zimbabwe, pelo
contrário, foram um conjunto de países europeus apadrinhados pelo antigo
colonizador. Mas Mugabe desafiou-os, só não conseguiu vencer a guerra contra os
cobardes internos, “os golpistas”. Enquanto presidente da República do
Zimbabwe, Mugabe colocou-se ao serviço do seu povo.
Hosiah Chipanga,
célebre músico zimbabweano com fortes raízes moçambicanas, escreveu belíssimas
e poéticas canções que dizem mais ou menos o seguinte (tradução livre): “Mugabe
dá, mas algumas pessoas não têm juízo, porque roubam e vendem os produtos nos
países vizinhos”. E diz mais: “algumas pessoas não se contentam apenas com os
ovos, querem também as galinhas; não se contentam só com o leite, querem também
as vacas; não se contentam apenas com o mel, querem também as abelhas”. E num
outro trecho musical, para relevar às questões da igualdade e justiça,
características natas de Mugabe, Chipanga remata: “Mugabe tem azar. Agora que
as coisas estão difíceis, todo mundo diz que Mugabe esqueceu-se de nós. Mugabe
ofereceu-nos tudo, infelizmente não tivemos iniciativa nem inteligência! Quem
mandou roubar dinheiro nos bancos? Quem mandou vender farinha em Moçambique?
Quem mandou vender milho e açúcar na Zâmbia? Quem mandou vender fertilizantes?
Quem mandou vender combustíveis destinados às farmas? Quem disse que fazendas
são para cinco pessoas?”
As manifestações em
curso no Zimbabwe, infelizmente mortíferas, trazem-me uma esperança. A
população está disposta a corrigir os erros da sua escolha. O agravamento do
preço dos combustíveis deve criar uma forte combustão para afastar os
“golpistas” do poder. O poder deve ser devolvido à Mugabe, nem que seja para
governar morto. Somos africanos, a espiritualidade é uma realidade insondável.
Por isso, encorajo aos grevistas que continuem com a marcha libertária. As
manifestações não agradam os detractores de Mugabe, afinal ele sempre esteve no
rumo certo!
Centelha por Viriato Caetano Dias
Extraído
de uma conversa com Professor Silvério Rocha e Cunha em 25/03/2011.
Zicomo (obrigado) e um abraço nhúngue ao Calisto, que lê as
minhas centelhas a partir de Manica. WAMPHULA FAX – 21.01.2019
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