terça-feira, agosto 18, 2020

De "instruenda" em Matalane para o mundo


Escrevo este ensejo numa altura em que a nossa "casa" está em "chamas". Escrevo para dizer que o "nosso modus vivendus em Matalane" foi exposto ao público e ao mundo. A humilhação e a violação constante dos nossos direitos em nome da preparação para um "futuro melhor" e protecção e segurança da pátria veio à tona.

Não escrevo para mim justificar e muito menos expôr tudo, mas para dizer que Matalane é onde meus sonhos foram colocados a prova. Aqui em Matalane, ser mulher com atributos é pesadelo (...) "todos querem passar por ti, se não é por bem será por mal. Como foi com a Mbite, menina linda lá das bandas de Bajone, na Maganja da Costa, rosto de actriz Indiana, corpo desenhado que nem uma guitarra descrita na música ‘Ana parece novela’ de Matias Damásio”.

O sonho da Mbite era fazer parte da polícia e um dia ser Comandante-Geral da corporação. Tão jovem e habilidosa, o pecado dela foi ser admitida em Matalane e o instrutor “Mwuathu” dizer que está será minha por bem ou por mal. Aquilo foi o fim para ela. Mbite voltou grávida e infectada. Hoje pensa em tirar e desistir da vida. Mesmo com tantos conselhos de nós as amigas, ela diz que a família não lhe aceita, porque desonrou a mesma. Mesmo quando diz que foi violada por várias vezes pelo instrutor, a família não entende.

Escrevo este ensejo para revelar que (in) felizmente os instrutores e nem os meus colegas pensaram em tocar-me porque dizem que tenho postura de comando ou o famoso “vilão Fenda”, o homem que violentou o actor Jean- Claude Vandamme. Porque eu não mostro os meus dentes para ninguém, que minha bunda é rijá que nem a pata da “galinha do mato”. Que eu venço todos os homens nos treinos, seja em artes marciais, tácticas operativas, resistência ou qualquer outro exercício. Eles têm medo de mim.

Mas hoje quando vejo que algumas passaram por um total inferno. Anteciparam um projecto de vida que não tinha chegado a hora. Trocaram de sonhos forçosamente, devido à gula excessiva dos inspectores M’pino, Choquito ou Tembesi. Penso que estou num lugar errado. Penso que eu tinha que fazer algo. Mas não fiz! Mas derepente, surge uma voz no fundo dos meus tumultuosos pensamentos e diz continue para que faças o diferente. Para que defendas todas as mulheres vítimas de qualquer tipo de violência.

“Fiques para que o mal não vença o bem. Para que a fisionomia da mulher não alimente apetites insanos e competitivos dos homens. Só cabe, a pessoas como tu colocarem a ordem nas fileiras. A usarem do lado bom da formação e instrução para servir a nação”, diz-me a tal voz.

Escrevo esta carta para dizer que em Matalane também tem mulheres diferentes que não são preguiçosas e de use descartável. Escrevo este ensejo para revelar que as 15 são uma gota no oceano dos horrores que ocorrem em Matalane, Muinguine, Montepuez, Mueda, Nacala, nas esquadras, comandos, ministérios afectos e outros locais, onde mulheres que querem a farda têm passado.

Por hoje, término por aqui!

Estórias de centros de instrução e formação em Moçambique ... criação do autor do texto “Omardine Omar”.


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