Foi
um dos melhores médios ofensivos e avançado que Moçambique produziu, marcou
vários golos, de muito belo efeito, e teve uma carreira desportiva notável que
o levou a jogar em Portugal pelas mãos do Sporting. Calton Banze é um dos
principais emblemas do Desportivo de Maputo, e hoje um dos emblemas da formação
no clube “alvi-negro”.
Muitos desportistas e jovens não conheceram
Calton Banze no activo e tão pouco viram as maravilhas que fez em campo. Em
poucas palavras como se define?
Como
jogador de futebol comecei muito cedo, vim para o Desportivo de Maputo com 13
anos e depois disso foi uma sucessão de acontecimentos que me levaram a
Portugal para o futebol profissional, já com 31 anos. Depois comecei a carreira
de treinador ainda em terras lusas, tendo regressado à minha terra para fazer o
que mais gosto, que é estar junto dos atletas, treinando e aconselhando na
medida do possível.
Em Moçambique, para além do Desportivo de
Maputo, teve outra paixão em termos de clube?
Quando
saí dos juniores para os seniores em 1974, fui jogar no clube de São José, que
era o clube de coração do meu pai, ele era dirigente e fizera uma aposta
consigo, que eu e o meu irmão mais velho iríamos lá jogar. Foi uma época muito
importante, uma vez que, pela primeira vez, fui para a selecção nacional “A”.
Logo, no ano seguinte, retornei ao Desportivo aonde fui campeão nacional no
primeiro ano.
Que
memórias guarda do Desportivo dos anos 70 e 80?
Muito
boas, sobretudo os títulos conquistados. No ultimo ano de juniores ganhei todas
as provas, o campeonato de abertura, o campeonato nacional, o torneio de encerramento, enfim,
ganhamos tudo. Foi um ano muito proveitoso. No balneário éramos uma família,
nós dávamo-nos muito bem, muitas vezes, o treinador deixava-nos a sós para
decidir-mos certas coisas do nosso futebol e nós fazíamos e conseguíamos dar a
volta a situações que não fossem favoráveis.(Foto:esqª p/drª é sexto agachado)
Que
jogadores o marcaram nessa época e porquê?
Foram
vários especialmente pelas qualidades que detinham e disciplina profissional.
Grandes capitães como o Amide e Frederico, que me legaram o Desportivo quando
deixaram de jogar, marcou-me o Nuro
Americano, aquele a quem considero o melhor guarda-redes de Moçambique no pós
independência, era muito disciplinado e profissional, lembro que, quando
estivéssemos nos jogos da selecção nacional, enquanto nós estivéssemos ainda a
equipar, ele já estava em exercícios de aquecimento, enfim, era um exemplo
dentro do balneário.
Que
memórias têm dos jogos que realizou pela selecção nacional?
São
tantas, naquela altura, não haviam viagens de três dias, todas eram no mínimo
de uma semana, devido as dificuldades que existiam para fazer as conexões com
outros países, isso fazia do grupo uma família.
E
quem foram os treinadores que mais o marcaram?
Os
primeiros treinadores são muito importantes, e para mim, o técnico brasileiro
que me recebeu e o mister Oliveira, carismático defesa do Ferroviário de
Maputo, que terminou a carreira no Desportivo e depois se tornou treinador, o
João Albasine, porque lançou-me para a ribalta, Serafim Batista acompanhava-me
e dava-me sempre uma palavra, esses todos antes da independência, porque depois
vieram o Cremildo Loforte, o Mário Coluna, foi ele que me transformou num
grande finalizador. Eu sempre joguei como médio, e ele corrigiu-me e disse que
eu era um falso médio e incentivou-me a fazer coisas maravilhosas.
Qual
o golo que lhe ficou gravado na memória?
O
que marquei contra o Maxaquene, faltavam pouco menos de dois minutos para o fim
do jogo, e nós perdíamos por um a zero. Nisso há um cruzamento que vem para a
grande área, onde eu estava, recebi a bola com o peito e enchi o pé direito
fazendo a bola voar para o canto superior direito da baliza do Nuro Americano,
foi um golo de antologia, nunca me saiu da memória.
Qual
a diferença entre os avançados da sua geração e os de hoje? O que vos permitia
marcar mais golos, facto que não acontece hoje?
Hoje,
muitos atletas não têm aquilo que nós tivemos. Eu tive a felicidade de começar
a jogar na varanda no um contra um, com a bolinha de ténis, joguei também nos
terrenos baldios que hoje já não existem. Hoje os atletas apresentam-se nos
clubes com idades já avançadas, isto é, começam nos clubes, enquanto nós
começamos em casa.
E
como tem sido feita a transmissão desse legado as novas gerações?
Nós
somos os principais culpados por não haver transmissão de legado e experiências
aos mais novos. Os clubes não criam sessões de palestras para que as lendas
vivas possam passar as suas experiências, para que possam dar palestras nos
balneários.
E
sobre a experiência em Portugal. Como é que a descreve?
Fui
a Portugal pela mão do Sporting, o Jorge Gonçalves era o presidente do clube na
altura. Infelizmente não joguei na primeira liga por causa da burocracia, e
acabei por jogar em equipas da segunda e terceira divisão. Depois entendi que
aquilo que muita gente disse, que o Calton
falhou em Portugal se resumia nas grandes expectativas depositadas. Na
verdade, eu já nem tinha idade para jogar no futebol profissional, fui com 31
anos e no mês seguinte completava 32 anos, para muita gente isso representava o
fim da carreira, e eu estava a iniciar um novo ciclo, mesmo assim joguei em
Portugal, fiz coisas muito importantes e bonitas que mereci na hora do regresso
a Moçambique várias homenagens e tenho certeza de que quando um dia regressar a
um desses sítios serei recebido com as devidas honras.
E
em Portugal fez algo que fez pouco em Moçambique, muitos golos de cabeça...
Sim,
para um jogador da minha estatura era difícil, mas fiz lá muitos golos de
cabeça e é memorável.
Uma
última palavra para os apreciadores do bom futebol?
Gostaria
que o tempo voltasse atrás, para ver bons jogos de futebol, muita gente dentro
dos campos a assistir bons jogos e espectáculos. E para isso, convido a todos a
voltarem aos campos, aproximar dos clubes e dar contribuição, que nem sempre se
deve entender que deve passar pelo lado financeiro, mas pela presença e
testemunho que possamos dar.
Para
a geração actual de futebolistas que conselhos para que se tornem profissionais
a altura das exigências?
Olha,
os tempos hoje são diferentes, hoje há mais distractores e por consequência,
razões mais fortes para se perderem. Meu
conselho e que pensem que o futebol tem vida curta e que e preciso aproveitar
bem as oportunidades, construindo seu futuro, enquanto e tempo para poderem dar
aos seus algo de bom. As oportunidades hoje são várias num mundo cada vez mais
globalizado.
Fui
contratado para jogar pelo Sporting Clube de Portugal, pelo então presidente do
clube, Jorge Gonçalves, mas a minha idade avançada na altura não permitiu que
eu me inserisse no plantel principal, por isso fui emprestado ao Atlético, um
clube da segunda divisão. Mas, contribui para a ida e chegada de Ali Hassan ao
Alvalade. Ele tinha ido a Portugal para testes no Sport Lisboa e Benfica e o
então presidente leonino ouviu falar dele e das suas qualidades e questionou-me
se haveria alguma chance de o desviar do Alvalade, ao que respondi, sim. Daí
para frente foram algumas chamadas e conversas com Ali Hassan, que prontamente
resultaram num entendimento entre ele e o Sporting. Porém, a consequência foi a
minha saída do clube por empréstimo, para dar lugar a um compatriota mais novo
e com muito talento que estava também num grande momento de forma. Portanto,
fico feliz em ter contribuído para que essa operação tivesse tido o êxito que
teve.
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