Miguel Xabindza é uma das
melhores vozes moçambicanas da actualidade. Sem nenhum álbum ainda, vive a
música com a mesma responsabilidade de um autor consagrado. Afinal, esta arte
constitui o seu mundo. Mergulhando nas especificidades da sua obra, Xabindza
fala dos constrangimentos que marcam o universo musical moçambicano e dos
aspectos a serem melhorados, de modo a que os interesses dos músicos não sejam
abalados
Comecemos com uma pergunta prévia. O que é
a música para si?
A música é o meu mundo, a minha
actividade diária. É um mundo colorido, embora possua algumas partes negras.
mas isso também faz parte das cores.A música é esta vertente das artes que
decidi abraçar. Deve ser por isso que é o meu mundo. Mas comecei a cantar sem
me aperceber disso, sempre gostei de escrever poesia. Cantar foi mais uma
descoberta no meio do nada, a música chegou à minha vida como que de
pára-quedas, e acabei aperfeiçoando-me e identificando-me com o canto. Mas
ainda escrevo bastante.
É por isso que a sua música apresenta uma
certa componente estilística relativa à poesia?
Penso que sim. A
música e a poesia caminham juntas.
É dos autores que se preocupam em recriar
estilos clássicos de outros músicos moçambicanos. Porquê?
É um pouco engraçada esta
pergunta. As músicas dos autores que recrio também são minhas, porque me
acompanharam a vida toda. Por isso, eu escutou-as e perguntou-me como é que
posso compor e tocá-las do meu jeito. Penso que é preciso resgatar sempre os
nossos clássicos. Devíamos olhar cada vez mais para a riqueza do nosso
repertório musical. Muitas músicas desse repertório são esquecidas. Eu faço a
minha parte ao resgatá-las, porque tenho essa necessidade. E isto é muito
engraçado, porque as músicas que recrio acabam remetendo as pessoas que as
ouvem a alguns momentos de nostalgia.
Com isso julga que o nosso passado
artístico oferece melhor repertório musical que o do presente?
Não
necessariamente. Conheço muitos bons artistas criativos, novos, que inovam e
têm os seus traços particulares, o que lhes permite fazer boa música. Mas o
nosso passado não deve ficar esquecido, porque é um passado muito bom e rico. Então,
não se deve deitar fora.
Na sua opinião, de que depende a
sobrevivência da música moçambicana?
Este é um dilema
que nós, os músicos, temos estado a debater. Esta questão é tão séria que, para
uma solução eficaz, há muita coisa que deve mudar, como o sistema todo. Há
necessidade de se investir cada vez mais na cultura. O Governo deve divulgá-la
mais; os músicos devem trabalhar; deve haver mais investimentos em estúdios e
deve melhorar-se a remuneração dos músicos, porque alguns, mesmo com talento, sem
o devido reconhecimento, acabam se frustrando.
Muitas vezes, o sucesso dos artistas ao
nível da remuneração está a associado a factores “extra-musicais”, como
contratos publicitários. Com fazer com que o artista consiga viva da venda dos
seus CD e dos seus espectáculos?
Devemos
acreditar mais nos nossos artistas e promover mais espectáculos. Algumas
pessoas ainda não percebem que um artista pode fazer da música o seu modo de
vida e, portanto, fonte de sobrevivência. Isto tem um impacto negativo na medida
em que as pessoas, na hora de pagar ao músico, não agem com justiça, não porque
não podem, a questão é que elas acham que o músico não merece tanto. Uma vez
estava a conversar com Jimmy Gwaza, um dos integrantes da Banda Kakana, em
torno das actuações que temos feito em festas privados. Quando determinamos um
determinado valor, as pessoas imploram-nos para baixarmos, dizendo que não
conseguem pagar-nos o que exigimos, que pode ser ¼ do buffet e da
ornamentação. Ou seja, há dinheiro para pagar todas as outras despesas da
cerimónia, menos para pagar ao artista. É isso que deve mudar, a cultura do
desconto, porque o artista acaba se sentido desvalorizado. Temos de mudar esta
situação, porque a música é importante e faz-nos companhia até nos momentos
mais difíceis das nossas vidas.
A sua obra apresenta-nos uma elevada
componente sentimental e muito emocionante. Acredita que o sucesso da arte no
geral está na emoção ou isso é apenas um elemento que constitui a arte?
As duas
vertentes são válidas. A emoção é fundamental. Alguns músicos são mais
sensíveis no primeiro caso e outros no segundo. A componente mensagem é muito
importante, mas, às vezes, a componente emoção é mais marcante. Casos há em que
nem precisamos de entender o que a música diz. Contudo, veicular mensagens
positivas é o que deve caracterizar os músicos, de modo a que possamos evitar
algumas coisas más que acontecem na nossa sociedade.
Foi o que tentou fazer com a música “Se
dzixile”?
Seguramente. Com
as devidas metáforas, foi o que tentei fazer…
0 comments:
Enviar um comentário