Marcelino
dos Santos foi repousar.
Pode ser que a sua sorte seja a mesma a dos outros que
lhe antecederam: esquecidos lá na Praça dos Heróis, ou em suas campas. Durante
sete dias de luto estivemos a debater como imortalizá-lo. Muitas foram as
ideias de sempre. Outras foram promessas de nunca abandonar seus ideais. Porém,
a experiência manda-me dizer que lá onde está, Marcelino fará companhia dos
soldados que o guarnecem e de outros habitantes da necrópole.
Se querem
saber, sou avesso aquela Praça dos Heróis.
Eu chamo-a por cemitério familiar,
pela sua inutilidade pública e serviço a uma elite seleta e etnocêntrica. Se eu
quiser prestar homenagem aos meus heróis amanhã, serei vedado e se insistir,
pode ser que leve uma bala de borracha e acabe detido por profanação de lugares
sagrados ou qualquer outra pena idêntica. É por isso que não gosto daquilo.
Para ser útil, a Praça dos Heróis devia constituir-se em uma universidade
pública; uma biblioteca viva e transversal para todas as idades e níveis de
literacia; um espaço para o verdadeiro fomento aos valores patrióticos. Mas não
é. E é por não o ser que os nossos heróis são visitados por poucos, esquecidos
por muitos e que, amiúde, caem na desgraça do esquecimento. Pelo que sei,
alguns familiares reclamaram seus familiares, tendo-os retirado daí e, passando
assim a ser um assunto meramente familiar. Mas este é outro assunto.
ORA, COMO
IMORTALIZAR OS NOSSOS HERÓIS?
Construção
dos mausoléus associados a centros de interpretação histórica bem como centros
de legados dos heróis nacionais. É uma ideia complexa, mas posso aqui tentar
explicar.
Um MAUSOLÉU (á esquerda o de Agostinho Neto,Angola)
é um edifício externo independente, construído como um monumento que envolve o
espaço de enterro (sepultura, campa) ou a câmara funerária de uma pessoa ou
pessoas falecidas. Pessoas como Marcelino dos Santos, Samora Machel (Primeira foto), Eduardo
Mondlane, não deveriam estar enclausurados em sarcófago e acessíveis apenas a
uns. Deviam todos eles continuar a trabalhar de outra forma, como fontes de
inspiração e fomento dos valores pelos quais lutaram. Os mausoléus são uma
excelente forma de os imortalizar na medida em que são edifícios públicos que
congregam vários serviços públicos e agem como pontos de referência de uma
cidade ou vila, servindo assim de pontos de atração turística também. Quem vai
a Washington DC não deixará de visita o National Mall, lar de monumentos
emblemáticos, incluindo o Lincoln Memoria (foto 3) e o Washington Monument! Quem for a
Accra, Ghana, não deixará de ver o Kwame Nkrumah Memorial Park & Mausoleum (foto1);
as pirâmides de Egito, Núbia e Índia; o Taj Mahal; o Panteão da Dinastia de
Bragança (foto4), servem de exemplos vivos do que quero explicar e argumentar aqui.
Aqui ao lado, no Malawi, temos o mausoléu do Dr .Hastings Kamuzu Banda,
(foto2)primeiro Presidente do Malawi independente. Ao lado ou próximo desses edifícios
vende-se livros, artefactos, copias ou réplicas do seu legado, do seu tempo ou
da sua história. É assim como a história é imortalizada.
As estátuas
são sim outra forma de imortalizar. Mas, na sua maioria, não passam de
obstáculos à paisagem ou adereços rodoviários, servindo apenas para regular e
disciplinar o trânsito.São tantos
os que jazem naquela cripta; tantos que estamos a humilhá-los ao acumulámo-los
e isolá-los do povo. É uma CONTRADIÇÃO ONTOLÓGICA sanável.
É verdade
que não é fácil erguer mausoléus pelo país fora pois envolve pesquisa e
documentação. Vale a pena começar este trabalho. É um exercício que a longo
prazo vai compensar e constituirá a verdadeira LIGA da Unidade Nacional.
E é por
isso que julgo ter sido acertada a ideia de juntar a cultura e turismo num
único ministério, não para, neste caso, comercializar os nossos heróis, mas sim
para melhor promover e gerir o património histórico do nosso povo, mantê-lo
vivo e, através da pesquisa, documentação e divulgação, imortalizar a
CIVILIZAÇÃOMMOÇAMBICANA.
Naquela
Praça dos Heróis não se imortaliza nada e ninguém. Naquela Praça, guardam-se as
mortes em pequenos jazigos.
Estou 100%
seguro de que estas ideias não são as únicas. Existem outras, tantas válidas,
que conjugadas, podem melhor contribuir para o desiderato comum.
A jornada
de mil milhas começa com um passo, assim diz Lao Tsu, filosofo chinês. Vamos
então dar o primeiro passo a sério para essa longa marcha em prol da
imortalização dos nossos heróis.
(Por
Egídio Vaz)
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