Com estas palavras, Hermenegildo Gamito anunciou a renúncia ao
cargo de Juiz Presidente do Conselho Constitucional (CC). A comunicação foi
feita na manhã desta quarta-feira, depois de, ontem (04 de Junho), ele ter
apresentado formalmente ao Presidente da República, Filipe Nyusi, o desejo de
deixar de conduzir os destinos do órgão que administra a justiça em matérias de
natureza jurídico-constitucional.
Sua decisão de renunciar à chefia do CC chega dias depois do
colectivo de juízes conselheiros do órgão ter declarado a nulidade dos actos
inerentes aos empréstimos contraídos pela Ematum,
e a respectiva garantia soberana conferida pelo Governo, em 2013, com todas as
consequências legais. A decisão, entretanto, do agrado da generalidade da
opinião pública, configurou uma gravosa exacerbação das competências do CC, ao
imiscuir-se no julgamento de matérias da alçada do Tribunal Administrativo.
Hermenegildo Gamito dirigia os destinos do Conselho Constitucional
desde 2011, altura em que substituiu, no cargo, o também demissionário Luís
Mondlane. Tinha sido reconduzido ao cargo, em Maio de 2016, por Filipe Nyusi.
Sua passagem pelo CC vai ser recordada como tendo marcado o
início da falência moral do órgão. Em Outubro passado, sob a batuta de Gamito,
usando um tacanho juridiquês e fazendo tábua rasa a questões fulcrais de
mérito, o CC afastou a AJUDEM de Samora Machel Júnior da corrida eleitoral na
autarquia de Maputo, mostrando uma apetência para seguir a cartilha do regime
da Frelimo.
Gamito foi uma escolha pessoal de Armando Guebuza. Formado em
Direito em Lisboa, na sua carreira esteve mais ligada à gestão de empresas e à
política (como deputado na AR pela Frelimo), com uma curta passagem como
juiz-desembargador de 1978 a 1981. Duas das empresas de que foi principal
gestor, a Mabor e a Maquinag, abriram falência. O CC não era propriamente uma
empresa. Um dos principais “assets” (do CC) era uma reputação conquistada, sob
a liderança de Rui Baltazar, por via da qualidade dos seus julgamentos. Com
Gamito, esse bem, que não é palpável mas se torna fundamental para que a
sociedade confie nas instituições democráticas de Moçambique, foi se esvaindo.

E quando chumbou o recurso da AJUDEM, o CC voltou a se destacar
pela negativa, fazendo tábua rasa das irregularidades e ilegalidades praticadas
pela CNE em prejuízo do grupo apoiante de Samora Júnior. O CC ignorou o facto
de que as cartas dos “desistentes” da relação nominal da AJUDEM não podiam ser
tidas, sob o ponto de vista legal, como “declarações de desistência”. O CC fez
vista grossa aos requisitos formais das declarações de desistência.
O CC subscreveu outra
irregularidade da CNE, nomeadamente aquela em que o órgão eleitoral concedia um
prazo de 10 dias aos alegados “desistentes” da AJUDEM para eles oficializarem
essa “desistência”. Essa decisão da CNE não teve qualquer base legal. Ou seja,
o CC devia ter considerado a deliberação da CNE como ilegal, mantendo a lista
da AJUDEM na corrida eleitoral em Maputo. Ao tomar o caminho que tomou, o CC
abriu fendas gigantescas na armadura da sua reputação. E continuou por esse
diapasão, dando início ao seu processo de falência moral, passando para si
próprio um atestado de incompetência jurídica. E isso tudo com Hermenegildo
Gamito à cabeça. Hoje que, no dia em que ele renuncia, para alívio das
correntes honestas da sociedade, é bom que estas coisas sejam recordadas. E que
fique registado. Para a História! Gamito sai sem glória donde nunca deveria ter
entrado. (Marcelo Mosse e Ilódio Bata)
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