Meu nome é António Prista e sou
Professor Catedrático da Universidade Pedagógica. Surpreenderam-me os ofícios
emitidos pelo Excelentíssimo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino
Superior e Profissional relativos à criação de novas Universidades a partir da
divisão da Universidade Pedagógica (UP). Acredito que, na minha qualidade de
Catedrático, doente e investigador da UP há mais de duas décadas, posso ter o
direito (e o dever) a uma opinião. Permitam-me que emita algumas considerações
e sugestões sobre este assunto.
Nos referidos ofícios é anunciada a
extinção da UP e a sua fragmentação em Universidades Regionais. Esta medida tem
como objectivo “... reduzir os níveis de duplicação de cursos e Unidades
Orgânicas, racionalizar o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros,
bem como conferir o ensino superior uma nova dinâmica e eficiência de
funcionamento”. No mesmo oficio são criadas comissões instaladoras de 4 novas
Universidades que serão criadas a partir da já existente. Constituindo
parte do quadro docente da Universidade Pedagógica e considerando as
responsabilidades educativas, sociais e políticas de uma Universidade
solicito a atenção de Vossas Excelências para as seguintes preocupações:
1. A reestruturação de
uma Universidade é normalmente acompanhada de um processo de avaliação
institucional. Apenas uma avaliação técnica, de carácter objectivo e com
reconhecida isenção, pode fundamentar medidas de ajustamento e, em particular,
uma medida tão radical como aquela que foi agora adoptada. De outro modo, não
se pode entender como a solução sugerida “reduzir” os níveis de duplicação de
cursos e Unidades Orgânicas, “racionalizar”, o uso de recursos humanos,
patrimoniais e financeiros e tornar a Universidade eficaz e produtiva” surge de
um diagnóstico da actual situação. Não existindo essa avaliação crítica não se
percebe como a simples divisão da UP em 4 universidades resultará
automaticamente na racionalização dos recursos, redução de despesas e
melhoria a sua eficiência.
2. Não tendo existido
um processo de avaliação e não conhecendo a existência de estudos que
conduziram á conclusão mencionada, o que se afigure mais lógico é pressupor que
a criação de várias universidades multipliquem as despesas em vários itens,
incluindo com a necessária multiplicação de órgãos e cargos.
3. O despacho
determina ainda que as Comissões devem “Avaliar e elaborar os currículos
dos cursos da Instituição a criar”. No caso da UP os currículos vigentes
resultaram de um processo sistematizado e longo de revisão curricular que
envolveu toda a comunidade académica. Aliás, foram elaborados depois de um
longo estudo sobre o papel da UP no país no quadro do seu plano estratégico
amplamente discutido e, o mais importante, elaborados por órgãos académicos
competentes (Faculdades) e aprovados por órgãos com competência para tal
(Conselho Académico e Conselho Universitário). Não parece ser aconselhável uma
nova reforma sem deixar terminar o actual ciclo e ignorando o trabalho
sério e responsável realizado pelos profissionais da UP. As alterações fora de
um processo sistematizado não permitem um alinhamento e construção de modelos
consolidados. Sabendo que o processo de avaliação curricular é complexo e
longo, não parece ser viável a avaliação e alteração de 76 currículos no
período de 6 meses conforme determina o despacho.
4. A
recomendação para cada comissão apresentar o nome tendo em vista a Missão
e Visão da nova instituição criada” subentende que a Missão das novas
instituições pode não ser a formação de professores. Num país onde o
constrangimento mais saliente da Educação é a falta de qualidade, parece ser um
contra senso eliminar a missão que norteia a actual Universidade. Pelo
contrário, sendo a Educação a condição essencial do desenvolvimento, espera–se
o reforço do investimento em meios financeiros e Humanos para
que garanta o sucesso dessa missão.
5. As comissões
criadas são compostas, com uma única excepção, por elementos alheios á
Universidade Pedagógica. O despacho passa por cima de uma experiência acumulada
dos mais de 3 mil profissionais da UP (entre docentes e CTA) atribuindo
aos mesmos um atestado de incompetência. Ao entregar a reflexão e
reformulação dos destinos da UP nas mãos de profissionais de outras
instituições dever-se-ia, no mínimo, ter realizado um processo de avaliação
dos docentes da UP para que lhes pudesse ser atribuída nota tão negativa.
Por outro lado, colocando de lado os actuais docentes e funcionários, é pouco
provável que o processo tenha um resultado positivo. Relembro que
estatutariamente os cursos, planos de estudo e programas são aprovados
pelos órgão académicos da própria Universidade.
Caros colegas,
O actual estágio da UP resulta de
muitos anos de trabalho e esforço de milhares de académicos e outros
profissionais. Ao longo desse processo cometeram se obviamente os mais
diversificados erros pelo que a avaliação e reformulação constante constitui
uma condição indispensável. Contudo é com enorme preocupação que vejo a
formação de uma comissão de académicos que vem questionar uma
Universidade que pouco conhecem, não para realizar uma avaliação
Universitária (que seria muito útil) mas executar um decisão que nega à partida
todas as enormes conquistas da UP. Esta abordagem, mesmo que involuntariamente,
é entendida como uma ofensa à dignidade profissional e académica de muitos de
nós. Todo um legado de muito anos e de muito esforço e abnegação corre o risco
de ser ignorado e desrespeitado.
Tendo em atenção os motivos acima
expostos, e, num espírito de contribuir para o processo de forma
construtiva, venho pois sugerir que façam as seguintes sugestões ao Exmo Senhor
Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Profissional:
1. A reformulação dos
termos do despacho;
2. A realização de uma
avaliação da UP nos moldes academicamente aceites;
3. A integração nas
comissões de avaliação institucional elementos da UP, outros
académicos nacionais como Vossas Excelências mas também Internacionais;
4. A alteração do
calendários em função dos resultados do processo de avaliação
institucional;
5. A inclusão na
avaliação de um estudo que conduza de facto a uma ou mais instituições mais
eficazes e parcimónias conforme designa o despacho como objectivo.
Todas estas sugestões nasceram do
fundo desejo de contribuir positivamente na certeza que Vossas Excelências
valorizam o meu propósito de partilhar toda a carga de experiência acumulada e
na vontade patriótica de ver melhorada a qualidade do ensino e investigação
nacional.
Agradecendo a Vossa a atenção
ao assunto, endereço as mais cordiais saudações académicas.
Maputo 31 de Outubro de 2016
António Prista
Professor Catedrático da
Universidade Pedagógica
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