sexta-feira, fevereiro 01, 2019

Colegas das Comissões para restruturar a U.P.

Meu nome é António Prista e sou Professor Catedrático da Universidade Pedagógica. Surpreenderam-me os ofícios emitidos pelo Excelentíssimo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Profissional relativos à criação de novas Universidades a partir da divisão da Universidade Pedagógica (UP). Acredito que, na minha qualidade de Catedrático, doente e investigador da UP há mais de duas décadas, posso ter o direito (e o dever) a uma opinião. Permitam-me que emita algumas considerações e sugestões sobre este assunto.

Nos referidos ofícios é anunciada a extinção da UP e a sua fragmentação em Universidades Regionais. Esta medida tem como objectivo “... reduzir os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas, racionalizar o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros, bem como conferir o ensino superior uma nova dinâmica e eficiência de funcionamento”. No mesmo oficio são criadas comissões instaladoras de 4 novas  Universidades que serão criadas a partir  da já existente. Constituindo parte do quadro docente da Universidade Pedagógica e considerando as responsabilidades educativas, sociais e políticas de uma Universidade   solicito a atenção de Vossas Excelências para as seguintes preocupações:
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1.     A reestruturação de uma Universidade é normalmente acompanhada de um processo de avaliação institucional. Apenas uma avaliação técnica, de carácter objectivo e com reconhecida isenção, pode fundamentar medidas de ajustamento e, em particular, uma medida tão radical como aquela que foi agora adoptada. De outro modo, não se pode entender como a solução sugerida “reduzir” os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas, “racionalizar”, o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros e tornar a Universidade eficaz e produtiva” surge de um diagnóstico da actual situação. Não existindo essa avaliação crítica não se percebe como a simples divisão da UP em 4 universidades resultará automaticamente na racionalização dos recursos,  redução de despesas e melhoria a sua eficiência.

Imagem relacionada2.     Não tendo existido um processo de avaliação e não conhecendo a existência de estudos que conduziram á conclusão mencionada, o que se afigure mais lógico é pressupor que a criação de várias universidades multipliquem as despesas em vários itens, incluindo com a necessária multiplicação de órgãos e cargos.

3.     O despacho determina ainda que as Comissões devem “Avaliar  e elaborar os currículos dos cursos da Instituição a criar”. No caso da UP os currículos vigentes resultaram de um processo sistematizado e longo de revisão curricular que envolveu toda a comunidade académica. Aliás, foram elaborados depois de um longo estudo sobre o papel da UP no país no quadro do seu plano estratégico amplamente discutido e, o mais importante, elaborados por órgãos académicos competentes (Faculdades) e aprovados por órgãos com competência para tal (Conselho Académico e Conselho Universitário). Não parece ser aconselhável uma nova reforma sem deixar terminar o actual ciclo e  ignorando o trabalho sério e responsável realizado pelos profissionais da UP. As alterações fora de um processo sistematizado não permitem um alinhamento e construção de modelos consolidados. Sabendo que o processo de avaliação curricular é complexo e longo, não parece ser viável a avaliação e alteração de 76 currículos no período de 6 meses conforme determina o despacho.

4.      A recomendação para cada comissão  apresentar o nome tendo em vista a Missão e Visão da nova instituição criada” subentende que a Missão das novas instituições pode não ser a formação de professores. Num país onde o constrangimento mais saliente da Educação é a falta de qualidade, parece ser um contra senso eliminar a missão que norteia a actual Universidade. Pelo contrário, sendo a Educação a condição essencial do desenvolvimento, espera–se  o reforço do  investimento  em meios financeiros e Humanos para que garanta o sucesso dessa missão.

5.     As comissões criadas são compostas, com uma única excepção, por elementos alheios á Universidade Pedagógica. O despacho passa por cima de uma experiência acumulada dos mais de 3 mil profissionais da UP (entre docentes e CTA)  atribuindo aos mesmos  um atestado de incompetência. Ao entregar a  reflexão e reformulação dos destinos da UP  nas mãos de profissionais de outras instituições dever-se-ia, no mínimo, ter realizado um processo de avaliação  dos docentes da UP para que lhes pudesse ser atribuída nota tão negativa. Por outro lado, colocando de lado os actuais docentes e funcionários, é pouco provável que o processo  tenha um resultado positivo. Relembro que estatutariamente os cursos,  planos de estudo e programas são aprovados pelos órgão académicos da própria Universidade.  

Caros colegas,
O actual estágio da UP resulta de muitos anos de trabalho e esforço de milhares de académicos e outros profissionais. Ao longo desse processo cometeram se obviamente os mais diversificados erros pelo que a avaliação e reformulação constante constitui uma condição indispensável. Contudo é com enorme preocupação que vejo a formação de uma comissão de académicos que vem questionar  uma Universidade que  pouco conhecem, não para  realizar uma avaliação Universitária (que seria muito útil) mas executar um decisão que nega à partida todas as enormes conquistas da UP. Esta abordagem, mesmo que involuntariamente, é entendida como uma ofensa à dignidade profissional e académica de muitos de nós. Todo um legado de muito anos e de muito esforço e abnegação corre o risco de ser ignorado e desrespeitado.
Tendo em atenção os motivos acima expostos, e,  num espírito de contribuir para o processo de forma construtiva, venho pois sugerir que façam as seguintes sugestões ao Exmo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Profissional:

1.     A reformulação dos termos do despacho;
2.     A realização de uma avaliação da UP nos moldes academicamente aceites;
3.     A integração nas  comissões de avaliação  institucional elementos da UP, outros académicos nacionais como Vossas Excelências mas também  Internacionais;
4.     A alteração do calendários  em função dos resultados do processo de avaliação institucional;
5.     A inclusão na avaliação de um estudo que conduza de facto a uma ou mais instituições mais  eficazes e  parcimónias conforme designa o despacho como objectivo.

Todas estas sugestões nasceram do fundo desejo de contribuir positivamente na certeza que Vossas Excelências valorizam o meu propósito de partilhar toda a carga de experiência acumulada e na vontade patriótica de ver melhorada a qualidade do ensino e investigação nacional.

Agradecendo a Vossa  a atenção ao assunto, endereço as mais cordiais saudações académicas.

Maputo 31 de Outubro de 2016   

António Prista
Professor Catedrático da Universidade Pedagógica

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