A reunião da Comissão
Política (CP) da Frelimo, realizada a 24 de Janeiro do presente ano para
analisar o caso da detenção de Manuel Chang (MC) na África do Sul evidenciou
forte influência da ala que afecta ao ex-PR Armando Emílio Guebuza (foto direita) (AEG), cujo
círculo interno é implicado no processo pela Justiça dos EUA, que pede a
extradição de MC. Da reunião da CP saiu a decisão que o aparelho judiciário
moçambicano deve empenhar-se para evitar a extradição de MC para os EUA.
Na sequência da mesma, o
Tribunal Supremo emitiu um mandado de detenção preventiva contra MC, para que possa
justificar a sua extradição para Moçambique, junto do tribunal sul-africano.
Posteriormente, será levantada a imunidade parlamentar de MC. Em meios
independentes, prevalece a convicção de que os procedimentos tomados a 2 Anos,
depois da conclusão da auditoria da Kroll sobre as dívidas MAM/ EMATUM/
Proindicus - destinaram-se apenas a justificar o pedido de extradição de MC
para Moçambique.
O PR Filipe Nyusi (FN)
e a ala maconde, revelaram na CP um alinhamento mais próximo a de Joaquim
Chissano, que inclui Luísa Diogo e Graça Machel, manifestando discordância do
esforço de trazer MC para Moçambique. Durante a sessão, evitaram disputas e
assentaram à pretensão da ala AEG, prometendo mesmo colaborar para que o caso
seja remetido à justiça moçambicana. Desde a detenção, FN e os seus mais
próximos revelam, aliás, tendência para se distanciarem e demarcarem-se das
“dívidas ocultas”, cuja montagem atribuem ao “inner circle” de AEG, de que não
faziam parte.
A extradição e
julgamento de MC nos EUA é vista como uma ameaça pela ala Guebuza, dado que MC
poderá revelar mais dados sobre as dívidas, levando à emissão de mandados de
captura para mais personalidades da Frelimo e/ou dos serviços de informações
(SISE) implicados no caso. A administração de FN mantém a posição de que, num
ano eleitoral, e de grande disputa interna pela sucessão, é preferível ter a
ala Guebuza ocupada com a extradição e julgamento de MC, enquanto o PR se
concentra em garantir a sua renovação de mandato para as eleições de Outubro de
2019. Ciente do seu papel na renovação de mandato de FN, a ala Guebuza pretende
mesmo ganhar influência no novo Governo, assegurando a nomeação de ministros e
candidatos a governadores provinciais, que a partir de 2019 passam a ser
eleitos.
Nos meandros da Frelimo, é
conhecida a intenção da candidatura de José Pacheco a PR, destacado apoiante de
AEG, nas presidenciais de 2024. A sua nomeação como ministro dos Negócios
Estrangeiros foi, aliás, entendida como uma preparação da candidatura.
A detenção de MC,
baseada numa acusação que inclui outros dois moçambicanos, é apenas a primeira
parte da acção da Justiça dos EUA contra moçambicanos envolvidos nas “dívidas
ocultas”, que defraudaram investidores norte-americanos e violaram regras de
segurança financeira americana. A lista de suspeitos é extensa e inclui pelo
menos um filho de AEG, Mussumbuluko Guebuza (foto esquerda) (MG), que terá recebido 9,8 milhões
de USD.Na acusação, é indicado como “co-conspirador 2”. Dado que MG não era
funcionário do Estado, considera-se que terá sido “testa de ferro” do seu pai.
Não estando envolvido directamente no caso, AEG pode ser acusado como autor
moral, caso prove-se que o seu filho recebeu subornos destinados ao ex-PR. MC é
a pessoa chave para revelar esta informação nos EUA. Fontes diplomáticas
revelaram que o pedido de extradição de MC para os EUA já foi entregue à
Justiça sul-africana e seguiu canais diplomáticos. Alternativamente, o caso
poderia seguir canais judiciários do Departamento da Justiça dos EUA para o
Ministério da Justiça da África do Sul. O seguimento por meios diplomáticos
acresce importância ao caso. Os EUA terão direito de arguir em tribunal contra
a extradição de MC para Moçambique, segundo fontes diplomáticas consultadas.
O pedido de extradição
de Manuel Chang (foto direita) para Moçambique deverá ser negado nesta fase, e a extradição para os EUA
poderá levar meses, até aproximadamente um ano, para se decidir, seguindo todos
os recursos. A demora do caso permite a FN preparar a sua reeleição, enquanto a
ala AEG se concentra em salvar MC da extradição para os EUA. O processo está a
degradar ainda mais a imagem da Frelimo, em ano eleitoral. A Frelimo parou com
divisões internas para o processo de escolha de candidatos para as eleições de
Outubro.O distanciamento da Frelimo denota a incerteza dentro do partido quanto
ao impacto da detenção. Em debates públicos sobre o caso, nomeadamente em
cadeias de televisão privadas, é assinalada a recusa de elementos da Frelimo em
participar em defesa de MC. Em geral, os comentadores presentes adoptam um tom
fortemente crítico à Frelimo. No último Congresso da Frelimo, FJN foi aprovado
como candidato do partido a PR. Contudo, o processo de definição do candidato
poderá ainda ser reaberto, por decisão extraordinária ao nível do Comité
Central ou da CP.
Em círculos restritos, o presidente Filipe Nyusi
comenta que não recebeu quaisquer contrapartidas financeiras das dívidas, e o
mesmo era discriminado durante a governação de AEG, onde deteve a pasta
ministerial da Defesa, em representação étnica do clã Maconde, que inclui os
generais Alberto Chipande (AC), Raimundo Pachinuapa (RP), o actual ministro da
Defesa Atanásio Mtumuke, o antigo chefe do Estado Maior General das FADM e o
ex-director-geral do SISE, Lagos Lídimo, entre outros.
FJN alega ainda que no tempo
de AEG havia reuniões restritas de ministros, em que não participava, nas quais
foram planeadas todas as acções de criação do Sistema Integrado de Monitoria e
Protecção (SIMP) costeira, usado para justificar a contratação das dívidas. MC
foi instrumental na criação do SIMP, e FN, na qualidade de ministro de Defesa,
assinou documentos importantes no processo, mas comenta que estes lhe eram
enviados para assinatura, sem nunca ter participado das discussões.
A Frelimo tem por tradição
proteger os seus dirigentes de acusações internacionais, mas a Presidência de
FN tem-se esforçado para evitar comprometer-se publicamente com o caso, e mesmo
o apoio a MC por parte de figuras da Frelimo tem sido diminuto. (África Monitor)
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