segunda-feira, outubro 12, 2020

A comunidade islâmica não dorme

Ou quando dorme acorda sobressaltada, por causa do fantasma do sequestro, que invade a intimidade dos lares, criando pânico e terror, uma vez o diabo estar à solta, e poder agir em qualquer momento e em qualquer esquina. Para evitar o sequestro, BASTA pagar uma MODESTA maquia que apelidam de taxa de liberdade.

Nas mesquitas há desconfiança de fuga de informação sobre os rendimentos dos crentes, nas ruas é perigoso circular; ir a uma loja, onde a maioria da comunidade faz negócio, necessita de argúcia, para não falar dos convívios sociais, que sem ser por conta da Covid-19.Estão, praticamente nos banimos do dicionário da comunidade. Os sequestradores não têm rosto. Actuam a soldo, e sob comando que ninguém percebe. Ou se percebe se deve evitar falar do mesmo, porque é aí onde a porca torce o rabo. “Qualquer denúncia é fatal”,- diz alguém que já passou pelo sofrimento. Nem vale a pena tecer qualquer ensaio nesse sentido, porque o aviso está dado. Denúncia ou suspeita, de tal acto! Pode redundar em infortúnio familiar. É este o mundo no qual vivemos. Não se pode dar um passo em falso, tanto é que nossos filhos e esposas acabam contraindo o stress caseiro, porque vivem atormentados.”-assevera.O ambiente mete dó, e nem o dinheiro consegue disfarçar por que a comunidade vive apertada e subjugada pela ex-torsão. “São montes de dinheiro em causa, que nalgum mome-to chegam a criar instabilidade nos cofres. Veja que até alguns membros da nossa comunidade saíram do país e foram viver para o estrangeiro. Está de mal a pior a situação, e ninguém parece estar interessado em pôr cobro a este estado calamitoso em que chafurda a comunidade. Como é que nossos filhos vãompoder ir a escola sem medo?  O que será das nossas esposas que não podem circular livreme-te? Viver confinado por conta da Covid-19 uma coisa. Viver confinado por causa do medo do rapto, é pior”-desabafa.

Mas afinal quem são os informadores, ou pessoas interessadas neste negocio?“

Todo o mundo entra neste jogo feio. Os serviços de segurança, falo da Polícia, os irmãos das mesquitas, os empregados das nossas casas, tudo isto funciona. Tu não sabes a quem te vendes. O guarda do prédio, o colega do negócio, o irmão da mesquita. Todos. Temos até medo da nossa própria sombra. Tu sabes o que é o ambiente de casa, ao invés de ser de convívio, ser tomado de conversa sobre cuidados a ter com o fenómeno? Isto não lembra ao diabo. Outros sim, no país entram muitos estrangeiros. Estes já viram as facilidades e vantagens dos raptos, e sem pestanejar optam por esta via, para ganhar dinheiro de forma porca e suja. Chegam em nome de empresários, fingem que vendem geleiras, tvs, e outras bugigangas, porém, por detrás são grandes criminosos. O Governo anda distraído e não mexe palha. O perigo está presente e ninguém se safa”, confessa amargurado.

Taxa de liberdade“

Isto é um absurdo - prossegue- Na comunidade vivemos disto. Não se diz abertamente, mas já se sabe. Ou pagas ou então são ameaças a toda hora. Usam números de telefones, falam abertamente como quem diz que tudo está sob controlo. A taxa de liberdade é o saco azul, e está a causar mazelas nas famílias. Vivemos debaixo de chantagens, e ninguém está a vontade. Estamos todos na mira, aguardando o fatídico dia. Já lá vão os tempos em que se dizia que era o Nini, o mandante. Agora já não se sabe, nem se conhece o rosto deste. Qualquer um pode ser. A comunidade não vê com bons olhos alguns polícias do SERNIC, mas tudo são falácias. Não há provas! E mesmo existindo, não se pode abrir boca. Estamos fritos e entregues ao Allah dará”.

 

Contas bancárias no estrangeiro

Em tempos, e comentando a situação dos raptos, o Comandante-Geral da Polícia, Bernardino Rafael, revelou que havia instruções às equipas do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), para verificarem em que nomes estão as contas no estrangeiro e que quantias terão sido depositadas em tais contas, pois, segundo este, “trata-se de uma manobra para despistar as autoridades”, dificultando as investigações para a localização dos criminosos. 

“Queremos saber dos nomes, entidade bancária, e o país, de modo a agirmos, com vista a responsabilizar os criminosos”, disse, mas até ao momento não houve informação sobre o desfecho das ordens.

Falhas sistémicas

Em entrevista à agência Lusa, o jurista Custódio Duma, especialista em Direitos Humanos, dizia que prevalecem “falhas sistémicas” no combate à criminalidade, assinalando que a concretização deste tipo de delito envolve vários protagonistas.“Os raptos envolvem telecomunicações, sistema financeiro, mobilidade e abrigos, e quando acontecem é porque há falhas sistémicas”, referia Custódio Duma.Para o jurista, o facto de os bancos usados para o saque de avultados valores que pagam o resgate, as operadoras de comunicações móveis e o Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) não detectarem movimentos suspeitos relacionados com os raptos, mostra uma preocupante falta de coordenação.“É alarmante que as vitimas raptadas recentemente, na província de Maputo, tenham sido colocadas durante várias semanas em cativeiros próximos da capital do país, que acolhe também a sede das instituições de justiça e das Forças de Defesa e Segurança”, frisou.Custódio Duma defende que devem ser aperfeiçoados os mecanismos de alerta de actividades criminosas no seio das instituições vocacionadas para o combate à criminalidade, para se poder estancar a onda de raptos.

Este tipo de acto pode causar um impacto biopsicossocial, porque para além dos rap-tos, são exigidos valores depois que lhes é restituída a liberdade. Afonso Magira, psicólogo, explicou que quando os raptados estão em cativeiros de quando em vez são torturados, o que acaba criando um choque emocional. Ao nível psicológico, os raptos podem criar situações de perturbações, que podem advir do que chamamos de stress-pôs traumático, que tem que ver com as estratégias que cada um tem de se lidar com os problemas. Esse transtorno é causado por varias situações, desde o medo de sair de casa, insónia entre outras consequências.Acrescenta o psicólogo Afonso Magira que os raptos podem causar algumas manifestações ao indivíduo raptado, sendo uma das quais que tem que ver com a síndrome de Estocolmo, que é o desenvolvimento de um afecto pelo sequestrador ou seja, segundo Magira, o indivíduo, depois de ser mantido por muito tempo em cativeiro acaba tendo uma preferência pelo sequestrador do que voltar ao seu seio familiar. Para além da síndrome de Estocolmo, o psicólogo admite que o individuo raptado pode criar fobias, que são medos exagerados, que se desenvolvem porque durante o rapto criase uma rede Magnética que envolve tudo relacionado com o rapto ou tortura, ou seja, se um individuo foi raptado e os raptores usaram Toyota Vitz, se vir esse modelo naturalmente que entra em pânico, porque recorda a situação. O alimento, os cheiros podem- lhe remeter a tal situação.

Degradação da personalidade

As várias consequências dos raptos de algum modo levam a degradação da per-sonalidade dos mesmos. Por exemplo, se for o caso de uma criança pode desenvolver co-portamentos estranhos como o caso de isolamento e tendências de se tornar mais agressivo. “Esses transtornos de conduta tem repercussões ao nível da escola” refere o psicólogo tendo acrescentando que vezes sem conta algumas desenvolvem o mutismo selectivo, e nessa fase o indivíduo tem incapacidade em se envolver na família. “Tudo isso não significa que toda pessoa vai passar por esses transtornos. Cada pessoa tem uma certa fórmula de encarar os seus problemas “disse, acrescentando que o apoio familiar é sem dúvida, o principal facto de protecção.

Diferentes estratos sociais que funcionam como rede criminosa

Para o sociólogo Baltazar Muianga, o fenómeno de sequestros é mundial, infelizmente o país tem assistido de forma galopante esse tipo de fenómeno. Os raptos, ou sequestros, são técnicas usadas pelo crime organizado e semi-organizado, onde o refém é usado como objecto, no qual o mesmo é atribuído um valor económico. “O sequestro envolve transacções económicas e são várias as motivações por detrás desse tipo legal de crime”, disse o sociólogo, enumerando os raptos com motivações políticas, socioeconómicas e religiosas. Em Moçambique prevalecem motivações socioeconó-micas, e que por conseguinte envolvem diferentes estratos sociais que funcionam como uma rede criminosa. A tipologia de crime é de rapto, para o resgate clássico, um sequestro com motivações meramente económicas. Cada elemento desempenha uma certa função, que no final do dia não se sabe quem é o mandante. Mas, o objectivo é o resgate.

Colocar o combate ao rapto na agenda do Governo

O resgate, segundo explica Muianga, varia em função da posição social da pessoa que é sequestrada. No nosso país, geralmente os sequestrados são indivíduos com capital económico considerável. A classe empresarial seria o grupo mais propenso a sofrer esses actos, e por via disso causa impa-to económico. Isso é óbvio.O sequestro leva à fuga de capitais, e por consequência há fuga do investimento e reduz as reservas no sistema bancário. Não é possível haver um investimento num país que vive um contexto de insegurança permanente. “Isso abala as reservas económicas do país, no sentido de que alguns empresários preferem investir em locais que p-dem ter essa segurança. É perigoso para a saúde financeira do país, quando nada de concreto se faz”, disse, sublinhando que a rede de sequestros envolve uma panóplia de actores, desde os bancos, polícias, entre outros, que no final do dia não se sabe quem são os rostos principais. O Governo precisa, adverte o sociólogo, de colocar o combate ao sequestro na sua agenda principal por forma a desencorajar o desenrolar dessa prática.

 (ZAMBEZE)

 

 

 

 

 

 

 


0 comments: