segunda-feira, setembro 11, 2017

Governação do "Mano Mané"

Imagem relacionadaO município de Quelimane celebrou, recentemente, a passagem dos 75 anos após a elevação à categoria de cidade. Contudo, nota-se que o crescimento é mais nos assentamentos informais do que uma urbanização. O que está a falhar? Este fenómeno não se regista apenas em Quelimane. É uma realidade de todo o país, incluindo a cidade de Maputo. Em Moçambique, as cidades registam a ruralização da urbanidade e não a urbanização das ruralidades. Isso é fruto da falta de planos ao nível de planeamento urbano resultantes das fraquezas da política nacional da gestão das cidades. Os planos e políticas de urbanização nacional efectiva, desenhadas pelo governo central, não passam de simples papéis. O governo não tem meios materiais, humanos e financeiros para a operacionalização desses planos. Há várias leis e regulamentos que, em princípio, deviam regular o processo de criação, construção e crescimento das cidades, mas que, infelizmente, não são postos em prática.   Deixemos Quelimane, que é uma pequena cidade, e nos focalizemos no município de Maputo, que é a capital do país e compara como estava a cidade em 1970 e como é que está hoje. Sem esforço nenhum, conclui que Maputo de hoje é mais rural que de 1970, porque, o que está a acontecer nas nossas urbes é que hábitos rurais invadiram as cidades.

Imagem relacionadaO edil está a dizer que as pessoas que vivem nas cidades não estão a conseguir adaptar-se aos hábitos urbanos...   É verdade. Há uma diferença muito grande entre o habitante e o munícipe. O que acontece nas cidades moçambicanas é que estão povoadas por habitantes e não por munícipes.   
Imagem relacionadaExplique melhor essa diferença
Munícipe é uma categoria de habitante que possui certos atributos. Um munícipe está consciente dos seus deveres e direitos, tem princípios e comportamentos urbanos, está ciente de que viver na cidade tem custos. O mesmo já não acontece com o habitante. A urbanidade tem custos e poucas pessoas têm capacidade para custear o preço de viver numa cidade.
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A retórica do senhor presidente leva-nos a crer que o município de Quelimane tem mais habitantes que munícipes...
Quelimane não podia ser uma ilha. É bom saber que aquele grupo de pessoas que está a ruralizar as cidades moçambicanas também dominou Quelimane por mais de 40 anos até à sua libertação em Dezembro de 2011 [vitória de Manuel de Araújo nas eleições intercalares]. Nós chegámos há seis anos e esse tempo é pouco para inverter o cenário, mas estamos a virar o barco para o rumo certo.

Portanto, a ruralização que caracteriza Quelimane não deriva do fraco desempenho da governação local, mas do problema geral do país...
Imagem relacionadaImagem relacionadaClaro que sim. Estes problemas começam com a política das nacionalizações adoptada pela Frelimo pouco depois da independência. No período colonial, para viver na cidade, tinha de preencher certos requisitos. Com a independência, aboliram-se esses impedimentos e não se educou os cidadãos. A consequência foi a invasão das cidades por pessoas que não sabiam como se vive num meio urbano. Hábitos rurais foram levados para as cidades e as infra-estruturas urbanas não estavam adequadas para tal. Por exemplo, a cidade de Quelimane foi concebida para 50 mil pessoas e hoje vivem 400 mil pessoas. A cidade de Maputo foi projectada para 250 mil habitantes e hoje alberga mais de dois milhões de pessoas. De lá a esta parte, nenhuma infra-estrutura foi construída para responder a essa demanda. Agora diga, como é possível gerir uma cidade nestas condições, que infra-estrutura pode aguentar uma pressão de 400 mil pessoas, enquanto foi concebida para 50 mil.
Numa das entrevistas ao SAVANA, o edil disse que um dos seus sonhos era transformar Quelimane numa cidade moderna. Contudo, o cenário que acima descreveu mostra que esse desejo está prestes a terminar num sonho...
Imagem relacionadaImagem relacionadaO sonho continua e estamos no caminho certo. Nos últimos seis anos, a cidade que mais infra-estruturas ergueu no país foi Quelimane. Depois de 40 anos de destruição, em seis anos, conseguimos erguer várias estradas, mercados, unidades sanitárias e outras infra-estruturas de interesse social. Estamos ainda na linha, contudo, há grandes desafios conjunturais, sobretudo na vertente política. Nos últimos cinco anos, Moçambique teve duas guerras intercaladas, que tiraram por completo a confiança dos investidores e Quelimane não podia ser excepção. Depois tivemos a situação das dívidas ocultas, que levaram o país ao precipício. Estes factores fizeram com que todo o trabalho que estava a ser feito no sentido de trazer parceiros que nos possibilitasse dar um passo mais rápido rumo ao desenvolvimento, acabaram ficando prejudicados. Hoje, todo o investidor, quando olha para Moçambique, só lhe aparece a imagem de um país inseguro e gerido por um grupo de mafiosos e corruptos.
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A geografia de Quelimane faz com que alguns bairros se separem através de riachos. Porém, com as cheias de 2015, muitas das “pontecas” que estabeleciam a ligação desabaram e a comunicação entre os bairros virou um martírio. Como é que o município está a atenuar esse sofrimento?. Há planos de reposição das “pontecas”?
Imagem relacionadaTemos quatro “pontecas” fundamentais na ligação entre bairros e todos desabaram nas cheias de 2015. Não temos uma solução definitiva, porque os custos de reposição estão muito acima das nossas capacidades. Contudo, não estamos de braços cruzados, enquanto o governo central não se pronuncia, estamos à busca de financiamentos.

Qual é orçamento anual do município e quanto é que seria necessário para uma gestão ideal?
Temos um orçamento de cerca de 300 milhões de meticais, mas para o nosso pleno funcionamento, precisaríamos de cerca de 1.500 milhões de meticais, cinco vezes mais do que o nosso actual orçamento. 

Imagem relacionadaQuais são as fontes de financiamento do município?
 Cerca de 35% vem de receitas próprias e o resto vem de fontes externas.

Os 35% significam crescimento ou queda em relação à gestão anterior? Estamos a subir. Quando chegamos, as receitas internas cobriam apenas 20% do nosso orçamento.

As bicicletas são a espinha dorsal do sector de transportes em Quelimane e várias correntes entendem que se perdeu durante o seu mandato a oportunidade de disciplinar esta actividade e torná-la mais eficiente economicamente. Que resposta dá a esse entendimento?
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Isso não é verdade. Juntamente com os taxistas, estamos a mudar o cenário, temos campanhas de educação e sensibilização sobre normas de trânsito, com o nosso apoio, os taxistas criaram uma associação. Neste momento, estamos no processo de registos e oficialização das actividades.
Quantos “táxis-bicicleta” operam na cidade de Quelimane?
Os números variam entre 1.000 a 1.500. Agora, o grande problema é dos compatriotas que vêm de fora da cidade de Quelimane. Temos taxistas que vêm dos distritos de Quelimane, Inhassunge e Nicoadala, mas que exercem a sua actividade dentro do município. Esses estão fora do nosso controlo, mas não podemos impedi-los de exercer a actividade, porque também estão à busca de sobrevivência.
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Outro problema que aflige a cidade de Quelimane e que foi motivo de reparo por parte do chefe de Estado tem a ver com a gestão de resíduos sólidos. O município de Quelimane não consegue recolher lixo? A nossa capacidade de recolha de lixo melhorou muito. Nos últimos meses, investiu-se muito em meios materiais. O problema está na mentalidade das pessoas (voltando ao debate de munícipe e habitante). Os munícipes teimam em não acatar os nossos apelos. Outra questão tem a ver com um depósito municipal de resíduos sólidos que não temos. Ao nível da cidade de Quelimane, não temos espaço. Pedimos espaço ao governo provincial para a construção do nosso aterro sanitário. O próprio governador, Abdul Razak, prometeu, mas, até hoje, a promessa ainda não foi materializada. Tivemos um financiamento dos países nórdicos para a construção de uma lixeira municipal e acabamos perdendo essa oportunidade, porque o governo provincial está a recusar ceder o espaço.  
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Quelimane celebrou 75 anos, dos quais seis sob administração do MDM. Quando olha para a cidade o que lhe magoa?
Fico triste cada vez que olho para a cidade e lembro que ficou 40 anos abandonada, viveu 40 anos de destruição contínua. Fico triste quando me recordo que a cidade foi saqueada durante 40 anos. Triste quando me lembro que a única estrada pavimentada em 40 anos é a que dava acesso ao local do congresso da Frelimo, realizado em 2006. Fico triste quando me recordo que essa estrada só resistiu apenas dois anos e nós tivemos de reconstruir.

Imagem relacionadaA imagem que se tem do edil é de uma pessoa ausente e que está sempre no avião? Porém, justifica-se dizendo que está à busca de parceiros. Em termos concretos, pode nos resumir os ganhos do município nessas viagens?   
Imagem relacionadaMuita coisa. O problema de vocês, jornalistas, é que não lêem o meu manifesto. O meu programa centra-se em muita coisa, mas o meu foco é tirar Quelimane do buraco. Veja que o edil de Quelimane é dos poucos, se não o único, que movimentou vários embaixadores para a sua autarquia, homens de negócios de vários quadrantes do mundo escalaram Quelimane, firmámos parcerias com várias entidades internacionais. Hoje, Quelimane está no mapa do mundo. Isso é resultado dessas viagens.

Fale-nos em termos materiais

Os ganhos não são imediatos. Antes, tínhamos de colocar Quelimane nas montras internacionais. Ninguém conhecia Quelimane e um dia teremos ganhos. Roma não foi construído num dia. Portanto, peço que me exijam as omeletes no fim do meu mandato. Agora estou à procura de ovos. 

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