A
citação que fiz sobre mudança, encerra o discurso do Presidente Filipe Nyusi,
feita ontem, dia 26 de setembro de 2017, durante a abertura do XI Congresso do
partido Frelimo. No discurso por si proferido ontem(27), o Presidente da
República advogou para a maior tolerância a opinião diferente e CIRCULAÇÃO DE
IDEIAS. Se a tolerância pela opinião diferente é a pedra angular para a
consolidação da Paz, Democracia e Tolerância, já a circulação de ideias é uma
proposta que se afigura desafiadora. Será que existem tantas ideias para
circular? De que ideias o Presidente Nyusi está a procura e encoraja sua
circulação? Estive colado aos diferentes
órgãos de informação para apurar dos analistas o sentido do discurso e o que
notei foi a mesmice: repetição dos lugares-comuns, dos preconceitos, de
palpites etnocêntricos etc., etc., menos um esforço para tornar o discurso
inteligível. Para quem quiser compreender o discurso do PR, a melhor coisa que
pode fazer é ir ler o discurso em si.
O
DISCURSO COMO UMA TESE
O
discurso de abertura do XI Congresso pode ser tido como uma tese; uma visão de
mudança de paradigma (da praxis política e da praxis de governação) que o
Presidente Nyusi quer ver implementado.
Ora,
importa antes, fazer algumas perguntas básicas:
1.Qual
é o sentido da mudança?
2.Que
benefícios essas mudanças fazem/fariam tanto para a Frelimo, para os cidadãos e
para o nosso sistema democrático?
3.Quais
são as vantagens dessas mudanças/perigo da actual forma de fazer política?
4.Terá
ele sido persuasivo o suficiente persuasivo nas suas propostas?
5.Qual
é o grau de liberdade que a Frelimo está disposta a (com)ceder?
As
respostas a estas perguntas podem conduzir para uma melhor análise do seu
discurso.
Se
tivesse que resumir por minhas próprias palavras diria o seguinte: O Presidente
Nyusi tem essencialmente três problemas por resolver imediatamente e outros por
influenciar o curso: o conflito armado; a economia e as eleições gerais e
autárquicas. Resolver esses três problemas vai implicar, como ele próprio
afirma no seu discurso, FAZER AS COISAS DE OUTRA MANEIRA.
O
modelo patrimonialista/clientelista de gestão do poder está a chegar ao fim
dada a sua congénita insustentabilidade. Deixe-me clarificar os conceitos para
tornar as coisas mais compreensíveis: em termos simples, o patrimonialismo é a
característica de um Estado que não possui distinções entre os limites do
público e os limites do privado. Por sua vez, o clientelismo é um subsistema de
relação política, em que uma pessoa recebe de outra a proteção em troca do apoio
político. Existe uma vasta literatura que já estudou isso, incluindo o
Professor Macuane, e seus colegas em “Power, conflict and natural resources:
the Mozambican crisis revisited” (African Affairs, 1–24; doi:
10.1093/afraf/adx029). Portanto, e falamos de “despartidarização do estado ou
participação económica ou mesmo descentralização é porque estamos
implicitamente a reconhecer que esses problemas existem.
Por
outras palavras, “em meio de uma situação de escassez de recursos disponíveis
para redistribuir a cada vez maior número de pessoas (clientelismo) e num
contexto de acirrada competição política que torna o acesso e gestão do poder
cada vez desafiante e ante um eleitorado cada vez cínico e crítico há que FAZER
AS COISAS DE OUTRA MANEIRA”. Hostilizar o adversário político só polariza a
relação dos cidadãos com o partido no poder; a cooptação já não é garante do
sucesso político; o eleitorado precisa ser convencido com actos. Portanto,
parece que não restam tantos caminhos senão uma abertura de portas para uma
GLASNOST e PERESTROIKA (abertura e reforma), ou seja, a reconstrução do sistema
económico e abertura do Partido ao diálogo transpartidário (que vá para além do
partido).
No
fundo, trata-se de antecipar e esvaziar “o saco de pirose” partilhado por uma
parte significativa da sociedade com relação à forma como a Frelimo se comporta
na sua relação com os outros ao nível da economia e política; praxis que, na
sua perspectiva, propiciam relações incestuosas, clientelistas, exclusivistas e
até de corrupção. E a corrupção é em si autodestrutiva. Como é que isso se faz
(de outra maneira)? Não vi isto no texto do Presidente. Talvez tenha sido de
propósito, para não sugerir alguma imposição a um órgão que de resto é
soberano. Todavia, o texto do Presidente é de facto um manifesto bem claro onde
ele se disponibiliza a liderar a solução de pelo menos três problemas
imediatos, já por mim mencionados (o conflito armado; a economia e as
eleições). E se o meu entendimento estiver perto do certo, tal implica alargar
o espectro da descentralização; normalizar as relações com as IFIS
(instituições financeiras internacionais; e aqui também inclui sanar as lacunas
de informação do relatório da Kroll) e montar uma máquina de competentes para a
campanha e um secretariado da Frelimo ajustada aos desafios de uma competição
política acirrada. Isto tem custos. A começar pelo desafio da mudança.
Encontrar pessoas certas que não seja apenas amigas mas certas para os lugares
certos; confiar para além da lealdade afectiva, gerir melhor os quadros na base
de critérios de meritocracia, entre outros. Falarei desses desafios no próximo
texto. (Por Dr.E.Vaz in facebook)
- Napoleão
Bonaparte
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