Junto-me às diversas vozes que concordam que os médicos deviam
voltar aos hospitais públicos. Ninguém nega que os grevistas (médicos,
enfermeiros, serventes, maqueiros, técnicos de laboratórios) tenham razão em
relação aos pontos que constam do(s) seu(s) caderno(s) reivindicativo(s). Também
ninguém não sabe que o Governo não tem capacidade para responder cabalmente às
exigências feitas. O ponto essencial do caderno parece que tem a ver com o
salário que se aufere. Por aquilo que nos deixam transparecer através das vozes que
aparecem nas câmaras de televisão, umas identificadas outras não, os médicos
recebem há 20 anos 2500 meticais mensalmente! Ou seja, qualquer pessoal da
Saúde é médico! Parece estranho, mas a percepção lógico-cultural do que é
médico nesta pérola dos recursos minerais é essa. Está enraizada nas nossas
línguas. Por isso quando nos dirigimos ao hospital temos esperança de “kuvoniwa
hi dokodela=dotori”, ou seja, ser visto pelo médico. Afinal o nosso “dokodela”
(médico) recebe só 2500? A outra lógica, que convém dizer que é da minoria,
advoga que existem diferentes áreas, escalões e carreiras dentro da Saúde que
se manifestam claramente pelas diferenças salariais visíveis na tabela. Um dos
grandes factores penso que deve ser curricular. Quantos anos a pessoa fez greve
individual, ou seja, ficou positivamente nos bancos escolares? Outro deve ser o
de chefia. Como nem todas as pessoas têm as mesmas habilitações literárias, ou
propensões naturais para a chefia, então o salário é diferente...
Há quem diga que esta greve é consequência da falta do diálogo
entre o Governo e os demais sectores, outros ainda vêem a dificuldade do
Governo em pôr ponto final a este “vukuvuku” por ter descoberto que afinal se
trata de greve de todo o sector público, se calhar excluindo o sector da
Autoridade Tributária. Mas por que razão há greve e só agora?
As respostas não são simples e é provável que sejam históricas: as
expectativas que as pessoas tinham quando se alcançou a independência não se
sabe se foram satisfeitas. Houve grande euforia como em qualquer parte do mundo
quando se alcançou a liberdade e os discursos de então alimentaram mais
esperanças. Houve guerra. Os discursos de esperança foram alimentados para o
período pós-guerra. Terminou a guerra. Os discursos de esperança foram
renovados para o período pós-reconstrução. O povo trabalhador definiu prazos do
período pós-reconstrução. Resultados: Mais discursos que apontam para um
bem-estar depois do funcionamento pleno dos mega-projectos. Partiu-se o copo.
Tudo coincide com os efeitos da crise financeira. Acho que o Governo está a
defender mãos vazias quando não informa o seu digníssimo POVO maravilhoso que
está a ser sacudido pela CRISE.
No fundo, o Governo do Presidente Guebuza dialoga com o seu povo.
Se fizermos comparações injustas, uma vez que os tempos são diferentes, pode-se
concluir que este Chefe do Estado dialogou mais com o povo que os seus
antecessores. Isso é simples, basta analisar quantas presidê
ncias abertas foram
feitas, quantas sessões alargadas ele orientou, quantos Conselhos de Ministros,
reuniões alargadas aos governadores, administradores, chefes de postos, chefes
de autoridade local, religiosos, líderes políticos, corpo diplomático,
jornalistas, desportistas, professores, engenheiros, polícias, soldados,
pescadores, camponeses... para dissipar-se a ideia de que não há diálogo. Mesmo
os que são chamados mabandido têm o privilégio de dialogar com o Chefe do
Estado nos comícios populares e até dão sugestões. Quando o Presidente pergunta
à população que procedimentos devem ter quando encontram um “criminoso”, eles
respondem que deve ser levado à Polícia e não deve sofrer qualquer agressão e
que depois deve ser liberto. Que o diga o comandante Khalau! Esse lado dos
bandidos é interessante que a greve!
Como propostas para se pôr fim ao problema devem ser estudadas
formas de uniformizar o salário na função pública e remunerações pagas em
função não só do nível académico, mas também da componente saber fazer com
competência. Deve-se reforçar a ideia de abertura de machambas para a produção
de comida a nível das famílias. Reforçar-se a ideia de matricular os filhos nas
escolas públicas. Reforçar-se e concertar-se o “barulho” ao Governo em definir
uma política clara sobre transporte, produção de comida, trabalhos voluntários.
Reforçar-se a capacidade governamental de interpretar, compreender e divulgar
os resultados dos inquéritos/censos realizados pelo Instituto Nacional de
Estatística. Reforçar a capacidade governamental na compreensão dos resultados
dos modelos económico-sociais sugeridos por estudiosos moçambicanos.
Responsabilizar todos os funcionários públicos, definindo parâmetros das suas
actividades. Orientar o povo. Há que se repensar na dimensão do recrutamento de
candidatos aos cursos de saúde ou revisão de alguns paradigmas curriculares. É
provável que as raízes desta greve estejam subjacentes nos “curricula” da
Saúde. Há uma notícia interessante que circula indicando que algumas unidades
hospitalares fora de Maputo GRANDE estão a funcionar em pleno. Pergunto, será
que não aderiram à greve ou porque não há médicos. Afinal em que hospitais
estão os médicos?
Unidade, trabalho e vigilância!
(Balate Júnior)
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