"Não há chances de o ter de
volta", entende a consultora britânica EIU (Economist Intelligence Unit)quando
questionada sobre os supostos valores dos subornos. Para outros a pergunta
ainda não se coloca, anular pagamentos das dívidas é a prioridade.Parte dos
dois mil milhões de dólares das dívidas ocultas moçambicanas terá sido usada
para esquemas de suborno e pagamento de comissões envolvendo altos funcionários
do Governo moçambicano, funcionários séniores do Banco Credit Suisse e um
negociador da Privinvest, na ordem de, pelo menos, 200 milhões de dólares.Suspeita-se
que o dinheiro dos alegados subornos tenha sido depositado no Dubai e noutros
lugares ainda não devidamente identificados. Seguir o seu rastro parece estar a
ser tarefa titânica, pelo menos para as autoridades moçambicanas.Embora a
prisão dos supostos prevaricadores possa ser uma forma de fazer justiça, ela
não vai resolver os problemas económicos e financeiros de Moçambique
resultantes das dívidas ilegais. Já o dinheiro em causa poderia ser de grande
utilidade.
É
possível reaver o dinheiro dos subornos?
Diante desse cenário, pergunta-se: é
possível Moçambique reaver esse valor adquirido em nome do Estado? Jorge Matine
é membro do Fórum de Monitoria e Orçamento (FMO) e defende que há outros pontos
nevrálgicos que devem ser ultrapassados antes de se projetar um repatriamento:
"É muito cedo para aferir os
mecanismos legais que podem assistir a Moçambique para pedir o repatriamento
desse dinheiro. Mas, primeiro, é preciso estar claro se este país africano está
em condições de reclamar isso", disse à DW África.Segundo Matine, foi por
esse motivo que o FMO submeteu ao Conselho Constitucional anulação a inscrição
do referido negócio nos documentos orçamentais, de modo a permitir que
Moçambique não tenha a possibilidade de pagar.Entretanto, o membro do FMO
esclarece: "Até agora não estamos na fase de exigir que os bancos ou
instituições de outros países que se tenham beneficiado possam devolver o
dinheiro a Moçambique. Pensamos primeiro que é preciso clarificar o nível de envolvimento
desse país africano, a confirmação de que este negócio é ilegal, e que exime o
povo moçambicano de poder pagar as dívidas".
"Governo
pode apresentar argumentos consistentes para não pagar"
Três empresas estão associadas às dividas
ocultas: Ematum, MAM e ProIndicus. Embora as dívidas sejam ilegais, por não
terem tido o aval do Parlamento conforme manda a lei, foram legalizadas pelo
Parlamento a posterior, obrigando o Governo a liquidar as dívidas com os
credores, e foi acordada uma reestruturação das dívidas.E mesmo depois de a
justiça norte-americana ter iniciado detenções de figuras envolvidas em crimes
financeiros num caso interligado as dívidas ocultas, em janeiro de 2019, o
ministro das Finanças, Adriano Maleiane, afirmou que o acordo preliminar de
reestruturação dos títulos de dívida soberana mantém-se.Entretanto, segundo
defende o colaborador da Jubilee Debt Campaign, Tim Jones, o Governo
moçambicano pode apresentar argumentos consistentes para não pagar, pois
"neste caso, porque este dinheiro tem origem em bancos de Londres, o povo
moçambicano não teria de pagar o empréstimo", diz. "O Governo moçambicano está a falhar
com os empréstimos, não está a pagar, e poderia declarar que o crédito é
ilegal, e pensamos que esse argumento poderia convencer a justiça do Reino
Unido - que não têm de pagar a dívida", acrescenta.
"Não
há chances de o ter de volta..."
Para o colaborador da Jubilee Debt
Campaign, nenhum dos credores processou Moçambique nos últimos três anos, e
"esse é um indicador de que sabem que não podem responsabilizar o povo
moçambicano por estas dívidas. Cabe aos credores dizerem que querem o dinheiro
de volta, mas não deviam tentar cobrá-lo a Moçambique", explica.Já que o
FMO e o Jubilee Debt Campaign não estão ainda focados no destino a ser dado aos
milhões dos alegados subornos, a DW África procurou uma instituição que pudesse
falar sobre essa possibilidade, a consultora britânica The Economist
Intelligence Unit (EIU). Nathan Hayes é analista para Moçambique na consultora e
está certo de que o dinheiro dos subornos é um valor perdido:"Depende do
paraíso fiscal offshore onde foi depositado o dinheiro. [Mas] não se sabe para
onde foram os milhões de dólares, cujo paradeiro é desconhecido e por isso
penso que será difícil saber para onde foi o valor. Acredito que não há chances
de o ter de volta. O Governo terá de continuar a pagar, o país terá de pagar, o
povo continuará a sofrer porque tem de pagar a dívida", conclui o
analista.
DW – 27.02.2019
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