Existem discursos
muito diferentes sobre a situação económica do país e, sobretudo, sobre os
modelos de crescimento e desenvolvimento que estão em prática. O discurso
oficial,os textos e intervenções de
académicos e os relatórios de organizações internacionais, revelam situações
muito diferenciadas. As diferenças não são apenas de natureza de política económica e de
estratégias de desenvolvimento mas começa na apreciação da evolução recente da
economia e na análise de diagnóstico da situação actual. Em resumo o discurso da governação tem ressaltado os avanços no acesso à
educação e à saúde. Há mais energia em casa dos cidadãos. Há mais rádios,
telemóveis e bicicletas. A produção de milho e mandioca aumentou. Existem 44
universidades e a quase totalidade dos docentes são moçambicanos. Existiram
grandes investimentos em infra-estruturas. Argumenta-se que Moçambique é um
país estável. O país é um dos principais destinos do investimento directo
estrangeiro. O crescimento económico tem sido elevado e “robusto”. Os académicos e outras individualidades referem essencialmente os seguintes
aspectos: o crescimento económico não se tem traduzido em maior equidade social
e redução da pobreza, pelo menos entre 2002 e 2008; o crescimento económico tem
agravado o défice da balança comercial e não se tem reflectido em receitas do
Estado através dos impostos (excepto nos últimos anos); os grandes
beneficiários do investimento das multinacionais não são o país, o orçamento do
Estado e os cidadãos das zonas onde os investimentos se realizam; o país vive
acima das capacidades de produção de riqueza sustentado por recursos externos;
existe delapidação dos recursos naturais; a agricultura não tem cumprido as
funções que lhe são acometidas constitucionalmente desde 1975; A acumulação
económica é realizada principalmente no exterior; a governação não tem exercido
as suas funções de Estado sobre a economia.
Algumas organizações e parceiros internacionais referem que Moçambique decaiu
no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano; semelhante apreciação é
apresentada em relação à competitividade da economia e no ambiente de negócios;
a necessidade de uma maior redistribuição dos incrementos da riqueza nacional;
a corrupção permanece alta e não existe medidas eficazes; a delimitação de poderes
é pouco clara; os direitos humanos são frequentemente não respeitados. Não existe convergência de argumentos entre os académicos e individualidades
nacionais e a comunidade internacional com os discursos e argumentos da
governação. Será que a sociedade civil e a comunidade internacional têm mais
acerto nos seus posicionamentos? Ou será o governo? Quais as razões de
posicionamentos tão diferenciados? Estes posicionamentos são fundamentados em
estudos e/ou investigação com metodologias e abordagens teóricas ajustadas?
O consenso pode não existir e dificilmente existirá porque existem factores
normativos e outros que influenciam os posicionamentos. E ainda bem que não
existe consenso. As ideologias, a formação em diferentes escolas de pensamento,
as vivências pessoais e a experiência profissional, os interesses económicos e
de poder, entre outros, podem influenciar os discursos, os estudos e os
posicionamentos individuais ou de determinados colectivos. Mas uma coisa é
consenso em cada posicionamento com teoria de suporte, estudos empíricos para a
fundamentação e discurso ou escritos coerentes, e outra coisa são discursos não
fundamentados e que pretendem iludir ou enganar pessoas em defesa de poderes e
interesses económicos.
O debate seria importante porque poderia aproximar posições, mobilizar vontades
e cada um entender melhor os posicionamentos dos demais. Mas também existe o
risco de não haver aproximação e então haveria necessidade de tolerância,
aceitação das diferenças e convivência na pluralidade.
Propõe-se assim que os responsáveis pelos ministérios económicos aceitem o
debate que se realizaria durante dois dias, de forma aberta (acesso livre), com
órgãos de informação em directo, com entre 4 e 6 temas da actualidade económica
e social a acordar, sem protocolos excessivos, com igualdade de tempos entre as
partes envolvidas, assim como de outras regras próprias de debates públicos.
Naturalmente que cada uma das partes elegeria quem seriam os oradores. O debate
não seria objecto de algum aproveitamento político partidário ou governamental,
antes, durante e depois dos debates. As moderações seriam realizadas por
pessoas de comprovada imparcialidade e aceites pelas diferentes partes em
debate.
Apenas como
exemplo, podem-se considerar temas importantes:
- Política económica, estabilidade económica e padrões de acumulação.
- Crescimento, equidade e pobreza.
- Investimento directo estrangeiro, multinacionais, extracção de recursos naturais e desenvolvimento.
- A agricultura no desenvolvimento de Moçambique e segurança alimentar.
- Instituições, governação, democracia e desenvolvimento.
- Políticas direccionadas para as pequenas e médias empresas e o empresariado nacional.
- Investimento em capital humano e de conhecimento: o ensino superior e a investigação.
- Relações externas dependência e desenvolvimento.
Esta proposta pode ter vários destinos e cada um com os respectivos
significados. O primeiro é não se obter qualquer reacção, o que demonstraria
falta de humildade democrática, insegurança, arrogância e desrespeito por posicionamentos
não convergentes. Seria uma má imagem para a sociedade. A segunda possibilidade
seria a governação económica aceitar a proposta e impor condições de tempos,
não respeito pelas regras de debate público que assegure equilíbrio entre as
partes em discussão ou a procura de influenciar os oradores e/ou moderadores.
Esta seria a forma cínica e manipuladora de aceitação. A terceira seria a de
aceitar os debates com humildade democrática, um sinal de tolerância e de
vontade de compreender as diversas abordagens para delas se poder corrigir ou
melhorar determinados aspectos da governação.
Esta proposta pode não se cingir à área económica. Os domínios do ensino e da
educação, da cultura e das artes, da cooperação, da democracia e da governação,
da justiça, entre outras, são igualmente importantes para a sociedade e o
desenvolvimento integral do país e dos cidadãos.
A carta tem um direccionamento não preciso, isto é, não são indicados cargos
pessoas e organismos do Estado. Isto por três razões: primeiro porque o
proponente tem dúvidas sobre a quem especificamente dirigir a carta; segundo
porque uma iniciativa individual como esta, se dirigida a alguém, poderia ser
interpretada sob diferentes pontos de vista; terceiro, o não direccionamento
pode simultaneamente cair no vazio e ninguém assumir alguma iniciativa mas
também pode ser motivo de alguma troca de opiniões entre os destinatários. A
motivação do proponente não é outra senão reconhecer a importância do debate
sobre o desenvolvimento do país.
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