Desde que o português Diogo Cão (nome sugestivo)
chegou à África em 1482, o Continente vem sendo saqueado pelos países
imperialistas. A África foi retalhada pelos europeus: França, Inglaterra,
Alemanha, Portugal, Bélgica, Itália e Espanha. A Moçambique, Vasco da Gama
chegou em 1498. Em 1505, os portugueses já haviam dominado toda a região
costeira. Em Moçambique, um passo fundamental se deu em 1962, no dia 25 de junho,
com a criação da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), união de vários
grupos nacionalistas articulados pelo doutor em Literatura, Eduardo Mondlaine,
que foi o seu primeiro dirigente. Mondlane foi assassinado em 1969, num
atentado preparado pela repressão portuguesa com o apoio de traidores, que lhe
enviaram um livro dentro do qual se encontrava um artefato com alto teor
explosivo.
Sob o domínio português, o povo moçambicano vivia sob
a mais extrema opressão. O colonialismo provocava e incentivava os conflitos
entre etnias e grupos. Na capital, Lourenço Marques (Maputo, depois da
libertação), havia o bairro dos índios, o dos pretos, o dos portugueses pobres,
o dos portugueses médios, o dos portugueses ricos. Essa divisão se espalhava
por todo o país, entre camponeses e indígenas, entre nortistas e sulistas.
“Conduziam jovens do interior, como gado, nos camiões
e colocavam-nos para servir os colonizadores em regime de trabalho escravo.
Lourenço Marques virou cidade da marginalidade, da mendicidade, da prostituição
oficializada. De um lado, o cimento, a opulência, o brilho. Do outro lado, a
insegurança, a injustiça social, a discriminação, a pobreza, a escuridão da
miséria”.
“Toda a indústria concentrada nas mãos dos colonos. O
moçambicano era empregado subalterno, simples executor, produtor desprezado,
servente servil e sem dignidade, motorista sem categoria, operário anônimo,
construtor da riqueza”.
Em 1964, teve início a luta armada e no ano seguinte a
Frelimo já controlava o Norte do país. Além das próprias forças, contava com o
apoio da União Soviética e de outros países do bloco socialista. Nas regiões
liberadas, os revolucionários procuravam pôr em prática o seu lema “Estabelecer
o poder popular e servir às massas”. No campo econômico, o poder popular criou
a produção coletciva a serviço do povo e da revolução; transformou os
produtores individualistas em produtores integrados na coletividade.
As dificuldades para aplicação da linha são imensas
porque há tradições arcaicas características do sistema de castas e falsos
valores do colonialismo, do capitalismo; mulheres com sua iniciativa tolhida
por milênios de opressão; bancários, comerciários, advogados, economistas e
outros profissionais de nível médio, bem como funcionários públicos eivados de
mentalidade pequeno-burguesa; operários com fraca consciência de classe e ainda
incapazes em assumir seu papel dirigente no processo de transformação da
sociedade.
Mas todos procuram a Frelimo porque não suportam mais
a opressão e acreditam que a organização é capaz de transformar a sociedade
moçambicana e proporcionar-lhes uma vida nova. A Frelimo decide aceitar todos
que a procuram, “transformar a massa enorme, diversa e rica, a todos integrar e
transformar em servidores do povo”.
“Longe de ser
um passo definitivo, a tomada do poder é apenas o início do processo de
transformação da sociedade.” (Lênin)
Samora Machel tinha plena consciência dessa realidade
afirmada por Lênin. Em 1974, o colonialismo desmorona. O seu exército já estava
praticamente derrotado, quando a Revolução dos Cravos, em Portugal, dá-lhe o
golpe final.
Joana Semião , a líder do GUMO, falando dias depois do
derrube do regime colonizador (clik em
Em 25 de junho de 1975, é reconhecida oficialmente a
independência de Moçambique. Agora, a Frelimo está com o poder nas mãos.
O que fazer? Pouco antes da vitória final sobre o império, uma
conferência tinha revelado a existência de duas linhas. Uma, que defendia uma
primeira etapa de consolidação da independência e desenvolvimento econômico
capitalista, para que o povo pudesse viver a luta de classes da burguesia
contra o proletariado e, assim, se consciencializar da necessidade de construir
o socialismo, vez que até agora, por mais que se debatesse o assunto, o móvel
da luta tinha sido a libertação nacional.
A outra linha,
na qual se inseria Samora Machel, entendia que era preciso se lançar desde já
na construção do socialismo, realizando as transformações democráticas de forma
revolucionária.
Esta foi a linha vitoriosa. A primeira Constituição da
República não deixa dúvidas: “Na República Popular de Moçambique, o poder
pertence aos operários e camponeses unidos e dirigidos pela Frelimo” (art. 2º).
E no artigo 4º, entre os objetivos da República, define: “Edificação da
democracia popular e a construção das bases materiais e ideológicas da
sociedade socialista”
Na comemoração dos cinco anos da Revolução, Samora
Machel faz um balanço do que fora construído até então, dos obstáculos a
transpor e das tarefas que se colocam na edificação da nova sociedade. Realizações:
“Libertamos a terra; nacionalizamos a educação – a escola deixou de ser
privilégio; nacionalizamos a dos; extinguimos a justiça privada – a Justiça
deixou de ser uma mercadoria; nacionalizamos os prédios – as cidades passaram a
pertencer àqueles que as construíram”.
Dificuldades e obstáculos: “A mentalidade do
colonizador instalou-se em nosso seio – indisciplina, roubo, anarquia,
preguiça, inércia, imobilismo, desleixo, sabotagem, nepotismo”. E mais: “O que
foi herança colonial agora é nosso produto. É ao inimigo interno que declaramos
guerra”.
Construirmos uma nova sociedade, uma nova mentalidade,
um homem novo”.
A burguesia não se contentou com a força de sua
herança. Armou uma guerrilha de direita, chamada Resistência Nacional
Moçambicana (Renamo), financiada especialmente pelo regime racista da África do
Sul.
Samora Machel morreu em 1986, prematuramente. Num
desastre aéreo, que nunca foi devidamente apurado. Sob o comando do seu
sucessor, Joaquim Chissano, a Frelimo foi se deixando dominar pela mentalidade
do colonizador. Primeiro, reintroduziu a agricultura privada, de mercado, e foi
cedendo em outros aspectos até abandonar completamente o socialismo em 1990. Em
1992, firmou acordo de paz com a Renamo.
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