Ao
abrigo de uma “nova” Concordata rubricada em 2011 o Estado moçambicano, que
mantém o Dia da Família em substituição da celebração do nascimento de Cristo,
conferiu tratamento especial à Igreja Católica que vai desde isenções fiscais
até ao adiamento do serviço militar obrigatório. Ao contrário das outras cerca
de 900 confissões religiosas registadas em Moçambique que têm a sua actividade
regulada pelo Ministério da Justiça a Igreja relaciona-se com o nosso país
através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, “É um Estado” esclareceu o
ministro José Pacheco.A Igreja Católica chegou a Moçambique com os
descobridores portugueses, como a religião de Estado e assim se manteve
durantes quase 400 anos seguintes impondo aos moçambicanos, de acordo com o
professor Benedito Marime, “o afinar dos costumes do modo de ser e de se estar
em comunidade familiar e política social de base, começou a diminuir a
poligamia, foi sendo banido o direito de herdar as viúvas, apareceram os
casamentos cristãos e entre cristãos, baixou o alcoolismo indígena este,
infelizmente, logo substituído alcoolismo de importação bem alimentado pelo
vinho para o preto e outras mistelas e mixórdias de igual valor, por sua vez
geradores dos habituais conflitos como a violência doméstica, licenciosidade
sexual, brigas gratuitas, etc”.
Retratando
as relações entre a Igreja e o Poder no nosso país, durante uma conferência
organizada em Agosto passado pelo Instituto de Estudo Sociais e Económicos
(IESE), o académico moçambicano assinalou que embora, tal como noutros países
africanos, a Igreja em Moçambique estivesse oficialmente comprometida com o
Governo Colonial em Julho de 1970 o Papa Paulo VI recebeu em audiência os
representantes dos três movimentos que lutavam contra a presença portuguesa em
África: Amílcar Cabral do PAIGC, Marcelino dos Santos da Frelimo e Agostinho
Neto do MPLA. Contudo, “Proclamada a Independência Nacional, a ideologia
marxista-leninista do novo Estado moçambicano criou imensas dificuldades no
relacionamento deste com as Confissões Religiosas. Foi um processo longo, muito
doloroso e traumatizante, e ainda não se sabe os excessos de então
correspondiam exactamente a orientação dos órgãos centrais do partido único e
do Estado ou se eram obra de provocadores e de agitadores”, assinalou Marime.
Durante
este período o partido Frelimo de certa forma aboliu a comemoração do
nascimento de Jesus Cristo. “No quadro da batalha pela formação do Homem Novo,
o Partido Frelimo e o Estado dedicam especial atenção à educação dos jovens e
dos continuadores, ensinando-os a amar e a respeitar a Família (...) Como os
povos da maioria dos países do Mundo, o Povo moçambicano celebrará o Dia da
Família a 25 de Dezembro de cada ano”.“O Dia 25 de Dezembro é data em que todos
os moçambicanos sem distinção de raça, sexo, origem social, profissão,
ideologia ou religião, comemoram com alegria a festa da Família”, instituiu a
Assembleia Popular a 11 de Dezembro de 1982.Benedito Marime recordou durante a
conferencia do IESE que: “A Guerra dos 16 anos veio reaproximar, quer as
igrejas entre si, quer a direcção do partido e do Estado as confissões
religiosas. Então começou a devolução do imobiliário abusivamente apossado pelo
Estado à margem da Lei das Nacionalizações, permitiu-se a reabertura das
Igrejas encerradas, a construção de outras e a entrada de novos missionários e
foi neste quadro que ocorreu a Visita Apostólica do Papa João Paulo II”.
Entretanto
o Governo de Armando Guebuza decidiu restituir às comunidades religiosas alguns
locais de culto nacionalizados após a independência, a Igreja Católica indicou
que cerca de 60 por cento das suas propriedades já lhe foram devolvidas.
Com
a abertura de Moçambique a economia de mercado e alcançada a Paz as relações
entre a Igreja e o Estado foram ainda mais consolidadas com a assinatura a 9 de
Fevereiro de 2011 do primeiro acordo bilateral entre a República de Moçambique
e da Santa Sé, a Concordata, que mais do regulamentar o status jurídico e
reconhecer diplomas universitários católicos e o casamento religioso concede
privilégios especiais à Igreja de Cristo tais como o adiamento do serviço
militar para os seminaristas, os postulantes e as postulantes, os noviços e as
noviças.
Outro
privilégio está relacionado com a prestação de serviços por pessoas de
nacionalidade estrangeira, a Concordata estabelece: “No exercício das funções
do múnus pastoral, os Superiores Maiores dos Institutos de vida consagrada e
das Sociedades de vida apostólica, como também os seus respectivos Delegados,
mediante acordo com o Bispo Diocesano respectivo, têm o direito de convidar
para colaborar na actividade pastoral e sócio-caritativa em Moçambique
sacerdotes, membros dos Institutos de vida consagrada e Sociedades de vida
apostólica e leigos que não tenham nacionalidade moçambicana” e que “As
autoridades moçambicanas competentes facilitarão a entrada, permanência e saída
de Moçambique e emitirão, nos termos da legislação em vigor, um documento de
residência”.
Além
disso a nível fiscal, ao contrário das restantes instituições religiosas não
gozam de isenção na importação de bens e mercadorias, ao abrigo da Concordada
“a Igreja católica, nos termos da legislação aplicável, beneficia de isenção de
direitos e demais imposições aduaneiras na importação de bens destinados a
ofertas a instituições criadas ao abrigo da legislação moçambicana e de
relevantes fins sociais, desde que tais bens sejam inteiramente adequados à
natureza da instituição beneficiária e venham por esta a ser utilizados em
actividades de interesse público".
A
Igreja de Cristo é também privilegiada no nosso país com a isenção de qualquer
imposto sobre: a) Os lugares de culto, prédios ou parte deles, destinados a
fins religiosos; b) As instalações de apoio directo e exclusivo às actividades
com fins religiosos; c) Os seminários ou quaisquer estabelecimentos destinados
à formação eclesiástica ou religiosa, ou ao ensino da religião católica; d) As
dependências ou anexos dos prédios descritos nas alíneas a),b) e c) usadas
pelas instituições de assistência social; e) Os jardins e os logradouros dos
prédios descritos nas alíneas a),b),c) e d) sem fins lucrativos; f) Os bens
móveis de carácter religioso, integrados nos imóveis referidos nas alíneas
anteriores ou que deles sejam acessórios; g) As residências de propriedade das
instituições eclesiásticas e religiosas ligadas a actividades das mesmas; h) As
aquisições onerosas de bens imóveis para fins religiosos”.
O
ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, José Pacheco, disse ao @Verdade que a Igreja
Católica é tutelada pelo seu pelouro pois “É um Estado”.
A
Autoridade Tributária de Moçambique esclareceu os benefícios fiscais com o
facto de “embora micro estado, dada a sua diminuta dimensão territorial, a
cidade do Vaticano, enquanto Estado e, como qualquer outro Estado, na acepção
moderna do conceito, é composto de Soberania, território, por um lado. Por
outro, foi instituída a Santa Sé, que é o auto comando da Igreja e exerce sua
soberania sobre o Vaticano. A Santa Sé é, pois, a personificação jurídica,
representando o Estado e autorizado a compor Tratados entre dois sujeitos de
Direito Internacional (Concordata). Explica-se, pois, desta forma, que o Acordo
tenha sido celebrado entre o Estado moçambicano e a Santa Sé, personificando
aí, o Estado de Vaticano”.
De
acordo com a Autoridade Tributária de Moçambique os benefícios fiscais
contratados à luz da Concordata, “vigoram tão somente na esfera jurídica das partes
contratantes, não sendo por isso transmissíveis a terceiros; ou seja, a outras
confissões religiosas em Moçambique”.
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