Porque não é tudo. Sim, os pontos de agenda em debate não são o garante
para a Paz
Uma das características destas negociações é que elas parecem-se com as
calamidades naturais. No geral, as calamidades naturais não se previnem.
Mitigam-se os efeitos. Tenho vindo a insistir na necessidade de aproveitarmos o
ensejo das negociações para ampliar o catálogo da agenda para incluir outros,
os verdadeiros.
Primeiro: os últimos vinte anos da nossa democracia multipartidária
mostraram que o pensamento político de Afonso Dhlakama e da Renamo evolui a
cada derrota eleitoral ou, para ser mais neutro, o pensamento político de
Afonso Dhlakama e da Renamo evoluem a cada pleito eleitoral. E quase todos os
ajustes ocorreram não sem uma dose violência. E o padrão é quase previsível:
Eleições=violência/ameaças=exigências extraordinárias=revisão do pacote
eleitoral=eleições=violência pós-eleitoral=mortes de inocentes. A única
diferença nestas eleições foi que agora está-se a exigir a divisão do país, de
resto, um sonho expresso há já 15 anos, quando o então delegado político da
Renamo e deputado da Assembleia da República Manuel Pereira ameaçava colocar
cancelas no Rio Save em virtude de a Frelimo mais uma tez ter roubado os votos.
Segundo, a cada acordo alcançado, a Renamo e o seu líder disseram sempre
que era o melhor acordo e que doravante as coisas estariam controladas. E hoje,
a Renamo está totalmente seduzida com a teoria segundo a qual a única maneira
de parar com a roubalheira da Frelimo é metendo sua gente, de topo a base da
direcção do país. Ela chama isso de "Despartidarização do Estado".
Recordemos porém que esta medida foi aplicada de diversas formas: Na Direcção
da Defesa do país; na CNE e STAE; na administração pública. A única diferença,
se quisermos, seria da escala. Agora a Renamo exige a governação em províncias
onde obteve a maioria e, segundo a edição do Semanário Canal de Moçambique de
hoje, dia 03 de Agosto de 2016, não só com nomeações de governadores mas também
com a autonomia para implementar seu programa eleitoral por cinco anos. Estamos
na verdade a retomar o projecto de lei submetido à Assembleia da República pela
Renamo para a criação das províncias autónomas e que foi chumbado. Para tal,
segundo o seu líder, vai ser necessário mexer na constituição para conferir
todos estes privilégios. Eu não vejo outra forma de declaração de guerra como
esta.
Ontem estive na televisão e argumentei que o recente escalar dos ataques da Renamo era mensagem clara da sua prontidão para uma guerra prolongada. No dia seguinte (August, 3rd, 2016) o Canal de Moçambique tratou de confirmar o meu receio (Vide em https://goo.gl/88V5gJ) com a entrevista de Afonso Dhlakama.
Ontem estive na televisão e argumentei que o recente escalar dos ataques da Renamo era mensagem clara da sua prontidão para uma guerra prolongada. No dia seguinte (August, 3rd, 2016) o Canal de Moçambique tratou de confirmar o meu receio (Vide em https://goo.gl/88V5gJ) com a entrevista de Afonso Dhlakama.
Terceiro: é que temos uma Renamo com as armas. Estas são paradoxalmente a
sua força motriz e a causa da sua indolência política. As armas são a sua força
motriz porque com elas é capaz de forçar o governo da Frelimo a ceder qualquer
coisa que for. Mas tal acontece às expensas da organização estratégica de uma
Renamo que se quer promissora e verdadeira alternativa política do país. Ou
seja, o que está a ser difícil para a maioria dos simpatizantes da Renamo é
aceitar que por mais que militarmente Afonso Dhlakama seja habilidoso e
imbatível, ele não sairá da “parte incerta” para a Presidência da República de
Moçambique como Presidente da República de Moçambique. A guerra dos 16 anos
mostrou isso e outras guerras, presentes e futuras que ele mover contra o
Estado moçambicano não o fará Presidente da República, dada a natureza sua
guerra (a guerra de guerrilha não visa essencialmente assaltar o poder mas sim
forçar o poder instalado a negociar).
Portanto, se ele quiser ser Presidente da República deverá enfrentar as
urnas; participar nas eleições e ganhá-las. Só que, GANHA ELEIÇÕES QUEM MELHOR
ESTIVER ORGANIZADO. E aqui importa frisar: não basta a vontade popular. É
preciso organização. Infelizmente, este é o assunto que muitos simpatizantes
ignoram e nunca o debateram. A guerra não está ajudar a própria Renamo a ganhar
terreno ou a melhorar a sua organização. A cada guerra que surge, membros de
topo da Renamo morrem, no campo e na cidade; a sua liderança dispersa-se em
debandada em busca de sobrevivência. Um dia a Renamo deverá contar sozinha a
história do quanto estas guerrinhas a enfraquece.
Quarto: Por causa do que acabei de afirmar, fica difícil ter a certeza se o
que a Renamo agora exige é tudo. É TUDO? Se o governo ceder na nomeação dos
governadores, introduzir os homens armados nas forças da defesa e segurança irá
a Renamo finalmente transformar-se num partido civil? É VERDADE QUE BASTARÁ QUE
O GOVERNO ACEITE as exigências constantes nos pontos de agenda para que a
Renamo se transforme eternamente num partido político civil?
Quinto: falta na Frelimo um sentido proactivo e de antecipação. Apesar de
os últimos dez anos ter-se fortalecido e enraizado, tal não significou
sofisticação. Actualmente a Frelimo é uma organização do tipo confederativo,
irmanada em torno de uma consciência de sobrevivência colectiva. Grande parte
do trabalho deixado pela governação de Joaquim Chissano ficou por resolver e
não foi resolvido no mandato de Armando Guebuza. Refiro-me por exemplo ao
pacote sobre a descentralização e poder local ou sobre o regime eleitoral e a
organização do poder político. O que de mais saliente se pôde notar em 10 anos
foi o crescente narcisismo frelimista. O trabalho retomado por Filipe Nyusi, de
repensar a descentralização, é senão, a retoma de uma agenda esquecida há 10-13
anos. Obviamente que o tempo urge.
Sexto, HÁ CONFUSÃO NO PARTIDO FRELIMO; grande confusão. Os níveis de rixas,
das alas e do desentendimento sobre formas de governação e opções para a
solução deste conflito são já insofismáveis. E o mais agravante é que isto está
sendo aproveitado para a capitalização dos vários grupos de interesse que se
digladiam para o acesso do poder, hoje e no futuro. Falarei sobre este tema num
outro dia. Mas deixe-me assegurar-vos que se houvesse uma única linha, uma
única orientação, um único comando, este assunto ou estaria fechado ou
conheceríamos com clareza o pensamento do governo da Frelimo e o seu plano de
acabar com o conflito.
O mais estranho é que não há plano: a Frelimo não tem. O governo não tem. O
próprio Presidente Nyusi, não se sabe bem o que ele comanda; quais são as
palavras que ele pronuncia para os comandos militares: se é “vocês é que sabem”
ou "façam/não façam" isto ou aquilo.
Para melhor elucidar a afirmação acima, termino com uma citação do
Presidente Nyusi durante a abertura do CASP - Conferência Anual do Sector
Privado da CTA: “Se dependesse de mim haveria paz ontem”. Presidente Filipe
Nyusi, Maputo, 27 de Julho de 2016.
Agora as perguntas:
• Se a Paz não depende de si senhor Presidente, depende de quem? De mim? Dos soldados? De quem?
• Haverá mais alguém nesta República que jurou à bandeira e à constituição e comprometeu-se em manter a Paz e fazer respeitar a constituição da República?
• Quantos eram na Praça da Independência tomando posse como Presidente da República de Moçambique no dia 15 de Janeiro de 2015?
A não ser que tenha sido mera força de palavra, suspeito que o senhor esteja a partilhar o poder com alguém. Diga-nos, Senhor Presidente, o nome deste cidadão com o qual governa este país. Nós também queremos lidar com ele. Ele nos deve muita coisa; muitas explicações.
• Se a Paz não depende de si senhor Presidente, depende de quem? De mim? Dos soldados? De quem?
• Haverá mais alguém nesta República que jurou à bandeira e à constituição e comprometeu-se em manter a Paz e fazer respeitar a constituição da República?
• Quantos eram na Praça da Independência tomando posse como Presidente da República de Moçambique no dia 15 de Janeiro de 2015?
A não ser que tenha sido mera força de palavra, suspeito que o senhor esteja a partilhar o poder com alguém. Diga-nos, Senhor Presidente, o nome deste cidadão com o qual governa este país. Nós também queremos lidar com ele. Ele nos deve muita coisa; muitas explicações.
PS: Com este texto, chego ao fim da série desta reflexão. Ao colocar um
título negativo, não quero inferir nenhum negativismo, mas sim contribuir para
a correcção do que ainda pode ser corrigido de modo a que ao chegarmos ao
entendimento, tenhamos a certeza de que chegamos onde todo moçambicano gostaria
de ter chegado: consensos fortes e duradoiros precisam-se.
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