Enquanto
os políticos repetem até a exaustão que querem a paz, em várias regiões de
Moçambique a guerra, entre as Forças Armadas do Governo do partido Frelimo e do
partido Renamo, é uma realidade que não começou recentemente e não tem fim à
vista. “O que faz convencer hoje o Governo de que estão em melhores condições
para vencer a nível militar”, questiona o politólogo João Pereira em entrevista
ao @Verdade onde ainda afirma que do lado do maior partido de oposição “também
não existe uma condição objectiva para sustentar uma guerra”. A solução é um
diálogo verdadeiro, “que não significa uma humilhação”, mas que culmine com a
partilha do poder, como tem acontecido em outros países africanos que viveram
situações similares à do nosso país.
“Se
no processo da transição deste país da independência o governo estava mais
preparado tinha apoios externos, todo poderio militar e financeiro não
conseguiram derrotar a guerrilha. O que é que faz hoje acreditar o Governo de
que é possível vencer uma guerrilha” interroga-se o docente de Ciência Política
da Universidade Eduardo Mondlane(UEM) que não recorda que na guerra civil “não
houve vencidos nem houve vencedores, e tiveram que ir para um acordo de Paz”.
João
Pereira destaca alguns indicadores que contribuem negativamente para as
aspirações das Forças Governamentais que, embora não o assumam publicamente,
estão em ofensiva militares com vista a aniquilar os denominados homens
residuais da Resistência Nacional de Moçambique, particularmente no Centro e
Norte do país. “As condições económicas estão péssimas, a exclusão social é
grande, os endividamentos do Estado são grandes, as expectativas em termos de
carvão estão baixas, em termos de gás e petróleo estão a descer, o que é que
faz acreditar o Governo de que terá condições financeiras e materiais para
sustentar uma guerra de guerrilha?”
O
nosso entrevistado julga que uma análise objectiva desses indicadores mostra
que o Governo não tem condições suficientes para aguentar uma guerra de dois ou
três anos e argumenta, “(...) o distanciamento do cidadão perante o Estado é
muito grande, perante o partido Frelimo é muito maior, porque é provado nas
próprias eleições, e principalmente num país onde a divisão eleitoral mostra
que existe uma divisão política deste país”.
“Do
lado do partido Renamo, também não existe uma condição objectiva para sustentar
uma guerra por dois anos, por um factor muito simples: a velhice do próprio
líder. Embora seja jovem aquilo é cansativo, nós vimos as imagens recentes na
televisão o semblante do homem, embora motivado, vê-se que está débil” opina
também Pereira, que é director da Unidade de Gestão do Mecanismo de Apoio à
Sociedade Civil (MASC), que no entanto destaca algumas factores que favorecem
ao maior partido de oposição. “(...)Eles não precisam de muito dinheiro para
fazer a guerrilha. Não precisam de muita logística, e têm ainda outra vantagem
militar que o Governo não tem: tem experiência do terreno acumulada de guerra”.
“Hoje
metade do nosso exército não tem nenhum experiência de guerra, nem nos
capitães, nem nos generais, se tem é muito limitada. Grande parte dessa
juventude não foi ao exército por uma causa, foi alistar-se como uma última
alternativa em termos de emprego. O juramento que eles fazem é um juramento que
não tem causas, já os homens da Renamo têm causas” declara o docente
universitário que destaca a forte fidelidade à Afonso Dhlakama que os antigos
guerrilheiros, e os membros, têm”.
Para
João Pereira, ao contrário dos soldados dos vários ramos das Forças de Defesa e
Segurança de Moçambique os homens do partido Renamo “quando pegam em armas não
estão a pensar no salário, estão a pensar no tal projecto que eles conceberam,
tem algo que lhe motiva, e uma exclusão social extrema”.
Pode ser que os Makondes queiram ficar na história como os que eliminaram
fisicamente Dhlakama
“Essas dificuldades todas não me fazem acreditar que o Governo possa ter
uma capacidade de vencer e o agudizar é que tens inundações e tens seca
cíclicas, precisas de dinheiro para recuperares as infra-estruturas, precisas
de dinheiro para poder pagar salários, precisas de dinheiro para poder comprar
armamento, medicamentos, etc, não são escolhas muito fáceis. A escolha mais
sensata é abrir caminho para um diálogo verdadeiro. E um diálogo verdadeiro não
significa uma humilhação, significa uma união do povo moçambicano” explica o
professor de Ciência Política da UEM que enumera alguns exemplos de países
africanos onde se viveram situações de guerra civil, como a de Moçambique, e
que encontraram na mesa de negociações e na divisão do poder a paz.
Um
outro factor que tem contribuído para a guerra no nosso país, segundo o
director da Unidade de Gestão do Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil
moçambicana, é a questão cultural. “Os Makondes (etnia do Presidente Nyusi) são
como os Ndaus(etnia de Afonso Dhlakama), se você luta com um Ndau a guerra não
acaba”.
Por
outro lado, de acordo com Pereira, “os Makondes, que sempre foram projectados
como os homens valentes que deram à cara pela libertação nacional, pode ser que
em algum sector eles queiram ficar na história como se fossem os únicos que
eliminaram fisicamente Dhlakama, devido a esta cultura mítica dos Makondes”.
“Mas
é tudo uma falsidade, porque eles são tão frágeis como qualquer outro grupo
étnico, eles até são um grupo minoritário. E como qualquer grupo étnico tem também
as suas fragilidades, tem as suas próprias contradições, tem as sua próprias
deficiências, e é por isso que é preciso retirar essas metodologias todas e
começar a pensar o país, porque só assim é que todos saem a ganhar. Porque esta
guerra não beneficiar a ninguém, nem aos homens da Renamo, nem ao partido
Frelimo, nem ao sector privado, nem aos cidadãos” declara politólogo
moçambicano.
O
nosso entrevistado julga que o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, “tem o
poder suficiente para avançar, mas ter o poder suficiente não quer dizer ter
coragem suficiente para poder avançar. Porque ter coragem suficiente significa
gerar inimizades”, conclui o docente da Universidade Eduardo Mondlane.
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