Após sofrer ataques neste fim de semana, o grupo “Mulheres Unidas contra Bolsonaro” foi
retirado temporariamente do ar pelo Facebook. O grupo ganhou
repercussão por reunir em poucos dias mais de 1 milhão de mulheres (além
de milhares de outras solicitações aguardando aprovação) se opondo à
candidatura do deputado Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência.
Administradoras do grupo afirmaram ao site
Catraca Livre que o
perfil de uma delas na rede social foi invadido na quinta-feira 13 e
seus dados pessoais foram expostos. Outra administradora disse ter sido
ameaçada via WhatsApp para que encerrasse o “Mulheres Unidas contra
Bolsonaro”, recebendo inclusive uma mensagem com seus dados.
Durante parte do domingo 16, o grupo ficou fora do ar enquanto o Facebook analisava o que havia ocorrido. O grupo foi restaurado e devolvido às administradoras.

“O incômodo é porque sabem da potência, da possibilidade desse grupo.
Dois milhões de mulheres organizadas, motivadas e discutindo são
capazes de mobilizar suas mães, filhas, amigas. Imagina o impacto disso
em um país com a quantidade de eleitores como o Brasil”, afirma a
antropóloga Rosana Pinheiro-Machado, professora da Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM) e ex-professora da Universidade de Oxford, no
Reino Unido.
"Não nos quiseram nas redes, agora terão que nos aguentar na rua", completa.
CartaCapital - O grupo “Mulheres Contra Bolsonaro” ganhou
rápida adesão em um cenário no qual 49% das mulheres rejeitam a
candidatura de Jair Bolsonaro. Como a senhora analisa esse movimento
online?
Rosana Pinheiro-Machado - A rejeição só existe também em
relação a outro dado que deve ser observado que é o desprezo da maior
parte das mulheres por essa política institucional que não as
representa, sendo que o maior número de indecisas também vem das
mulheres. Analiso isso como uma urgência de nos defendermos e nos
protegermos porque, em última instância, somos nós por nós mesmas.
Especialmente as mais prejudicadas em um possível governo Bolsonaro que é
a base da pirâmide: as mulheres negras, que já sofrem toda a
precarização do trabalho e as consequências da violência urbana. São as
mulheres que apanham e são estupradas a cada 11 minutos e que são as
vítimas da violência real dessa sociedade. Também são as mulheres que
temem que o armamento traga mais violência porque não são elas que
reproduzem a violência, que acham que a violência se soluciona com mais
violência. É um pouco de medo e ação. Sai desse desprezo pela política
institucional em que ninguém representa para um ação pelas nossas vidas,
porque tem sido assim historicamente. São as nossas vidas que são as
mais violentas e a grande vítima do sistema excludente capitalista.
CC - O que representa esse ataque à pagina e às suas administradoras?
RPM - Esse ataque representa o que é a política de uma
base forte de fãs do Bolsonaro, que não são só eleitores, admiradores ou
pessoas que acreditam no projeto. São pessoas que participam
praticamente de uma seita fanática e misógina que se sente ameaçada
quando dois milhões de mulheres se reúnem contra um candidato. É inédito
um grupo de dois milhões de mulheres feito em poucos dias. É um
fenômeno político extraordinário. Isso ultimamente só as mulheres têm
conseguido fazer. Nesse tamanho e com tamanha mobilização desde a
primavera das mulheres, são elas que têm conseguido se organizar.
CC - Por que esse grupo parece ter causado incômodo a ponto de gerar um ataque e divulgação de notícias falsas?
RPM - O incômodo é porque sabem da potência, da
possibilidade desse grupo. Dois milhões de mulheres organizadas,
motivadas e discutindo são capazes de mobilizar suas mães, filhas,
amigas. Se dois milhões estão organizadas no Facebook, discutindo e
pensando em maneiras de como conversar com a sua vizinha, imagina o
impacto disso em um país com a quantidade de eleitores como o Brasil. É
muito grande. É muito possível criar mobilização e isso se faz a partir
do contágio. Vejo na minha rede de amigos e de pessoas que não são
mobilizadas politicamente que entraram para o grupo, e estão se sentindo
pertencendo a alguma coisa. Isso é fantástico. A gente não pode deixar
isso morrer. A gente tem que ir para rua e tem que mobilizar um milhão
de pessoas.
CC - A senhora acredita que essa mobilização feminina online pode gerar reflexos significativos no mundo “real”?
RPM - Acho que sim e creio que temos duas mobilizações
reais acontecendo. A primeira é que muita gente só dizia que não votaria
em Bolsonaro, mas passou a se mobilizar. Isso é um projeto clássico de
politização e já foi um ganho real. O segundo ganho real é quando uma
mulher vai chamado a outra. Se dois milhões conseguiram se juntar em
poucos dias, imagina se continuasse. Agora, o ganho real mesmo tem ser
na rua. Acredito que esse episódio da derrubada do grupo tem que ser um
processo de incentivo, a faísca para um processo de mobilização. Tem que
trazer raiva por esse ataque. A partir da injustiça desse ataque
brutal, temos que conseguir botar 1 milhão de pessoas na rua. Não nos
quiseram nas redes, agora terão que nos aguentar na rua.
•Atualizado às 13h16 de domingo 16 para informar que o grupo foi reabilitado pelo Facebook
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