A decisão foi reveladora de desconfiança na capacidade do governo em assegurar condições de desenvolvimento do projecto da Área 1. A resistência do regime perante pressões externas, no sentido de aceitar uma força regional militar para neutralização da ameaça, e a falta de entendimento entre os Estados-membros da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), vieram agravar a percepção de que não existe uma solução viável no curto prazo e aumentar externamente o “risco-país”. Penalizadora do crescimento económico, a suspensão do projecto Mozambique LNG pelo principal operador, Total, e a conclusão antecipada de diversos contratos por parte da multinacional francesa são factores de alto risco também para as finanças do Estado. O projecto de gás natural da Anadarko/ Ocidental, adquirido entretanto pela Total (Área 1), e da ExxonMobil/Eni (Área 4) na bacia do Rovuma foram, respectivamente, o primeiro e segundo maiores investimentos em Africa no período entre 2015-2020.
A queda do preço do petróleo em resultado da de pressão económica internacional resultante da pandemia da covid-19 veio obrigar as multinacionais do petróleo e gás a rever várias das suas opções estratégicas, privilegiando uma postura mais defensiva e cortando em vários investimentos previstos. As participações das “majors” na qualidade de nãooperadores representam perto de 1/3 do total das suas participações. As prioridades para venda dever-se-ão concentrar em posições de participação meramente financeiras, sem responsabilidade sobre a operação. Também algumas das posições enquanto líderes dos consórcios poderão igualmente ser alienadas, visando reduzir a exposição, tendo em conta prioridades estratégicas e compromissos ambientais relacionados com emissores poluentes. Se, para potenciais investidores, este cenário se apresenta como oportunidade para rentabilizar o investimento, para os Estados africanos as perspectivas poderão atrasar projectos ou mesmo resultar em desinvestimento com forte incidência sobre as receitas fiscais e projectos considerados estruturantes. Entre os países onde os portfolios poderão ser vendidos ou que já se encontram no mercado, referidos por especialistasdo sector, constam:
Angola, com a equacionada venda pela Exxon Mobil da participação em 3 blocos (15,17 e 32) devido ao facto de terem atingido a maturidade e dos custos de exploração se revelarem demasiado elevados face a um quadro de queda dos preços internacionais do petróleo;
Moçambique, com a venda pela Exxon Mobil e Eni da totalidade ou de parte das respectivas participações no consórcio da Área 4; Guiné Equatorial, com a venda pela ExxonMobil de 71% do complexo do Zaire, considerado não essencial e em declínio de produção; Zaire está a produzir c. 1/5 do que produzia em 2006, no inı́cio da exploração; Gabão, com a venda pela Total de 100% da sua participação, hoje reduzida após a venda de uma percentage à Perenco e Assala Energy.
Um cenário deste tipo para Moçambique poderá representar atrasos acrescidos no desenvolvimento do projecto Rovuma LNG (offshore), pertencente à Área 4, através do qual o consórcio iria produzir gás natural a partir dos blocos situados em Mamba. Se as perspectivas de inicio das operações continuam, em primeiro lugar, dependents das conclusões do processo de redefinição dos custos do projecto, em análise pelo operador (Exxon Mobil), cresce agora a possibilidade de a participação ser colocada no mercado para venda. Actualmente, é muito pouco provável que a Decisão Final de Investimento (FID) possa ocorrer antes do final do próximo ano (AM 1299), situação que é agravada pela persistente insegurança em Cabo Delgado que desvaloriza os activos do consórcio, à semelhança do que acontece com a Área 1, liderada pela Total, cujo desenvolvimento do projecto em Afungi está suspenso até haver condições de segurança para retoma.
O consórcio Mozambique Rovuma Venture S.p.A. (MRV), detido pela Exxon Mobil, Eni e CNPC - operadores, que controlam 70% da concessãode exploração e produção - e a GALP, KOGAS e Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH, pública) que detêm 10% cada, fechou em 2017 o FID, relativo à construção de uma plataforma de extração lutuante (Coral Sul), cujo início de produção está previsto para 2022. O Rovuma LNG, que funcionará a partir de Mamba, deveria produzir 4-5 vezes o estimado para o Coral Sul. Um cenário de desinvestimento nos dois principais parceiros da área 4, embora considerado improvável no curto prazo segundo fontes do sector no país, constituiria um forte revés para o “hub” de gás natural, pelos atrasos, eventual revisão em baixa de dimensão/investimento e perda de valor em geral que poderia implicar. Para já, este cenário coloca Moçambique refém de opções estratégicas das multinacionais do gás, na prática que comprometem a respective continuidade a prazo. Os actores asiáticos, sobretudo chineses, são considerados potenciais interessados, o que a confirmar-se alteraria igualmente as parcerias externas moçambicanas, acentuando a sua dependência da China. (Africa Monitor/Zambeze)
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