sexta-feira, julho 03, 2015

EMATUM,a recambolesca

Os principais factores por detrás do negócio como a emergência de Moçambique como um powerhouse (grande potência) do LNG, com investimentos multinacionais de mais de 100 biliões de dólares e a segurança do Canal de Moçambique como o corredor marítimo que vai escoar toda essa produção, a partir de 2018, bem como as perdas decorrentes da pesca ilegal, não regulada, da pirataria, do trafico ilícito de pessoas e drogas, são sempre, por conveniência político-jornalística, preteridos na analise, a favor de argumentos que não sendo menos importantes, como a consulta ao parlamento, a transparência na tramitação financeira do processo, etc, não são per se , e contudo, os únicos argumentos determinantemente válidos, - também gostaria de me recordar de um crédito externo que, no nosso caso, tivesse passado primeiro pelo parlamento, para aprovação.
O académico Louis Bergeron, consultor de segurança política, sugere no Riskintiligence, strategic insigths nr 54, novembro 2014 que a aquisição da frota de barcos de pesca da EMATUM deve ser vista no contexto de uma abordagem internacional coordenada da segurança da navegação no Canal de Moçambique. Em 2013 antes da conclusão do negócio, segundo Bergeron, era também essa a expectativa do The Economist.
A frota da EMATUM é uma combinação inteligente de oportunidades comerciais e vigilância marítima, militar. Do orçamento, o que na verdade vai para o atum são 350 milhões de dólares. Não foi por acaso que o ministro Maleiane afirmou, na Assembleia da República, que o governo vai pagar, da operação, apenas 500 milhões, cabendo o remanescente a EMATUM. Muitos países democráticos camuflam, na sua prática orçamental, os seus orçamentos da defesa nas rubricas que os cidadãos e as organizações da sociedade civil gostam de ver mais robustos.
Até este momento a costa moçambicana é patrulhada pela marinha de guerra da África do Sul ao abrigo da operação Cooper, acordada entre os governos dos dois países. Em 2013 o governo italiano expediu um porta-aviões (uma espécie de base militar) que permaneceu dois meses na Bacia do Rovuma, protegendo os interesses privados da ENI, porque Moçambique não consegue oferecer a segurança necessária.
Resultado de imagem para ematumAntes da frota da EMATUM, a pesca do atum no Canal de Moçambique era feita por concessionárias, principalmente da União Europeia, que pagavam uma receita anual combinada de 4.5 milhões de dólares ao governo sem que este pudesse sequer verificar se o concessionário pescou 10 ou 100 toneladas. O governo com os seus atuneiros pode produzir perto de 80 milhões de dólares ano. Em que é que se baseia o assessment segundo o qual a EMATUM nunca teria a capacidade de chegar a meta que nos propõe? Pode ser que as receitas dos primeiros 3 anos sejam deficitárias dado o pouco know how dos moçambicanos na pesca do atum, mas não é isso que deve perpetuar o status quo. Quanto a mercado, o Japão e a Coreia do Sul, que estão entre os maiores consumidores internacionais de atum fresco, já se posicionam como clientes potenciais. Notar que no conjunto dos seus interesses económicos geo-estratégicos no Canal de Moçambique o Japão e a Coreia do Sul adquiriram através da Mitsui e da Korea Gas Corp 25% das accoes da Anadarko, e 10% da ENI, respectivamente. Acontece o mesmo com outras potências emergentes do continente asiático preocupadas com fontes alternativas de energia. A India, na pessoa da India Oil and Natural Gas Corporation, da India Oil Limited e da Bharat Petroleum Corporation comprou, tambem, 30% das concessões da Anadarko a um custo de 5 biliões de dólares americanos. Em 2013, por sua vez, a China National Petroleum comprou à ENI 25% das suas accoes naquilo que foi o maior investimento chinês de sempre no estrangeiro em campos de gás, 4.2 biliões de dólares.
No seu artigo Bergeron sugere que os multi-bilioes investidos no gás devem ser acompanhados de accoes de empoderamento local que previnam o terrorismo. Cita os protestos e a desobediência civil que tomaram conta de Mtwara em 2013 quando o governo tanzaniano anunciou um acordo multi-bilionario com a China visando a construção de um pipeline de gás ligando o sul ao porto norte de Dar_es_Salam. Cita igualmente a emergência em 2000 do grupo armado para a emancipação do Delta do Niger que pôs em causa as receitas petrolíferas da Nigéria com raptos, sabotagem e pirataria. No negocio do atum nenhum moçambicano era parte até a EMATUM.
No Canal de Moçambique toda a logística de apoio, comercial e de segurança deve ser construída praticamente do nada e os imperativos orçamentais dos barcos da EMATUM, sem obviamente descurar as possíveis más praticas no processo da sua aquisição, podem ser um factor muito pequeno via-a-vis a multitude dos interesses em jogo no Canal de Moçambique. Uma leitura reiteradamente parcial ou distorcida dos nossos principais dossiers, bem assim o hábito de deixa-los difusos, turvos com suspeitas no ar que nunca são esclarecidas porque ou são especulação, ou são rumores podem levar-nos a situações de grande instabilidade social e política.
O barulho da EMATUM no nosso país é uma ressonância de um lobby comercial europeu, via organizações da sociedade civil suas financiadas, preocupado com o que perdeu no negócio do atum. Há obviamente outros aproveitamentos políticos locais que depois de apresentarem o processo como um escândalo sem precedentes implicam, com outros horizontes eleitorais e eleitoralistas, o anterior e o novo timoneiro do estado moçambicano. Nenhum país quer ser governado por um presidente que tira sono aos seus cidadãos. Lembram-se daquele pássaro que poe os seus ovos num lugar e faz o seu barulho noutro?

(Por Armindo Chavana Jr.)

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