sábado, março 05, 2011

USD250 milhões que cobririam o défice orçamental

A 20 de Agosto do ano passado, precisamente quando ainda nos faltavam 13 meses para a realização dos Jogos Africanos, escrevi, nesta coluna, que deveríamos renunciar à organização deste evento, justamente porque não estávamos preparados para o efeito. Quase sete meses depois, volto a reiterar que não estamos preparados para organizar devidamente os jogos africanos. Só que agora, já não temos margens de manobras. Temos que organizar, ainda que depois sejam históricas pelo nível de desorganização que iremos apresentar. Hoje, os nossos governantes e todos os que directa ou indirectamente beneficiam da organização desses jogos pedem à imprensa que dê destaque; que deve ser ela a dar visibilidade à prova, branqueando, desta forma, a péssima imagem que Moçambique começa a emitir para o mundo. Não restam dúvidas que a imprensa tem sido usada para branquear situações ilícitas, desorganizações e negligências. Porém, para este caso, torna-se difícil até de encontrar um lado por onde se toque. Não podemos esquecer que estará entre nós mais de uma centena de jornalistas de diversos órgãos de informação estrangeiros para cobrir o evento. São esses jornalistas que, dia-a-dia, irão transportar a imagem negativa de Moçambique para os seus países e para todo o mundo, caso não nos organizemos o suficiente para o evento. Quer dizer, a notícia do dia, à semelhança do que aconteceu recentemente com a Índia nos jogos da Commonwealth, não vai ser o próprio evento em si, mas a tremenda e incrível facilidade de aceitarmos organizar um evento desta natureza, mesmo reconhecendo os altos níveis de desorganização que em nós estão enraizados. Por outro lado, tal como escrevera na altura, o país está a viver uma crise, estando à beira de uma instabilidade social, devido ao agravamento constante de produtos indispensáveis para a sobrevivência de cidadãos da classes média e baixa. E advinham-se dias difíceis, dias em que o Governo terá de encontrar, em algum sítio, dinheiro para aumentar o subsídio de combustível aos transportadores sob pena de uma nova crise social. Hoje, o preço de barril ultrapassou a barreira dos 100 dólares (custa 115 dólares), no mercado internacional.Esta semana, os operadores de transportes privados ensaiaram novos preços, não tendo sido bem sucedidos. No entanto, deixaram um sério aviso de que num futuro próximo, mas bem próximo mesmo, poderão subir as taxas ou desencadear uma greve, o que também poderá criar uma situação de caos, num país em que o transporte público é nulo.Igualmente, o Governo será obrigado a aumentar as medidas de austeridade para reduzir os gastos públicos para, com base nesse valor, mexer, eventualmente, os subsídios de produtos da primeira necessidade, que estão a registar agravamentos substancial. Ontem, a imprensa internacional indicava que “os preços mundiais dos alimentos alcançaram um novo recorde em Fevereiro, subindo pelo oitavo mês consecutivo”, citando o Índice de Preços publicado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Escreviam que o índice da FAO de preços de alimentos alcançou 236 pontos, superando o resultado de 231 registado em Janeiro, uma subida de 2,2 por cento.O que me indigna é o facto de termos decidido, mesmo perante estes cenários negativos, forçar a organização dos Jogos Africano, cujo orçamento inicial é de 250 milhões de dólares. Os 250 milhões de dólares que se prevê gastar pela organização eram suficientes para cobrir o défice orçamental, que estava avaliado em 150 milhões de dólares, o que levou o Governo a emitir obrigações do tesouro (contracção de dívida) para o efeito.Quando defendi que “vamos entregar a organização dos jogos africanos a outros países” e que a África do Sul seria o país mais bem colocado para o efeito, até porque devia estar preocupado em rentabilizar as infra-estruturas construídas para o Mundial de Futebol passado, fui tido, não só como apóstolo de desgraça, como também anti-patriota.Estamos ainda a cerca de seis meses da organização dos referidos jogos. As pistas para os treinos dos nossos atletas e para as centenas de atletas da modalidade de atletismo ainda não estão reabilitadas. Os primeiros a ficarem agastados são os nossos atletas que dizem não haver condições para continuarem a treinar no Parque dos Continuadores. Essas queixam são lançadas na nossa imprensa. Quando os atletas estrangeiros chegarem, o barulho será maior do que se imagina, além de que já não será estampado apenas nos nossos jornais, mas também nos órgãos de informação dos países de origem desses atletas e nos meios para os quais esses jornalistas são colaboradores ou correspondentes. Não nos devemos esquecer que iremos receber atletas de cerca de duas dezenas de modalidades de todo o continente. Aliás, as estimativas são claras: são esperados cerca de 4 000 membros de apoio e 6 500 atletas para esses Jogos Africanos. Esta gente toda tem de ter transporte, alimentação, alojamento..., ou seja, o Governo deverá desembolsar dinheiro, num momento em que os países que financiam o nosso orçamento estão em jogo de austeridades, nós, os receptores, em jogo proporcionalmente inverso, em teoria de gastos.(Lazaro Mabunda)

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