domingo, abril 19, 2020

Nao apenas militar


Para o pesquisador João Feijó, do Observatório do Meio Rural (OMR), é tempo de se chamar as coisas com os próprios nomes, tratando os atacantes de terroristas e não insurgentes, uma designação que lhe parece simpática, até pela imprensa. Para João Feijó, que também vem estudando os ataques de Cabo Delgado, as incursões da semana passada foram uma mensagem de força, de musculatura e de provocação do Estado.

“Há ali uma situação de provocação ao Estado e se aproveitam da fragilidade do Estado”, observa. O pesquisador nota, igualmente, uma clara mudança de estratégia por parte dos atacantes.

João Feijó | Other - Academia.edu“Em vez de atacar à população, atacaram ao Estado”, sublinha, acrescentando que, desta vez, não houve cabeças da população decepadas.Para o pesquisador, se há uma vila que é atacada e ocupada e os “terroristas” saem porque lhes apetece sair, o Estado perdeu o controlo da situação. Mas não só. Há coincidências que, para João Feijó, são, simplesmente, estranhas, a exemplo de os dois adminis- tradores, de Mocímboa da Praia e de Quissanga, não terem estado com suas famílias, na altura dos ataques.

“É uma coincidência que nos levanta questões”, diz, questionando o papel da inteligência. Feijó entende que, sem ajuda internacional, as autoridades moçambicanas não irão conseguir resolver a situação. Mas também observa que não será a ajuda internacional, por si, que irá resolver a situação. Defende que, se há uma clara ingerência externa nos ataques de Cabo Delgado, também é preciso entender que há componentes internas por detrás do conflito, nomeadamente, contradições que não foram bem geridas e que, se não forem resolvidas, não vale a pena trazer gente de fora. Apontou, como exemplos, contradições etno-linguísticas, o tráfico de drogas, a pobreza e grupos económicos islâmicos suspeitos de financiar os “terroristas”, ao mesmo tempo que financiam campanhas eleitorais. Aliás, Feijó chama atenção a um discurso populista dos “terroristas”, que se aproveitam dessas tensões e contradições locais para obter uma base local de apoio.
“O problema é complexo e a solução não será só militar”, avisou.
Sobre uma eventual instituição de um Califado no norte de Cabo Delgado, o professor diz que o discurso parece ser esse. Contudo, até aqui os ataques ainda não se tornaram numa guerra de ocupação. “Neste momento, a estratégia deles é de destruição, terror e incidentes que sejam mediatizados pela imprensa”,  afirmou.


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