
O que me trouxe de volta à mente esta lenda chinesa que me contaram na China quando os meus anfitriões me serviram um jantar em que o Pato de Beijing era o prato forte, é a polémica em torno das medidas que o nosso governo adoptou na última terça-feira, e que visam atenuar o impacto do custo de vida que aflige a maioria dos nossos compatriotas com um rendimento muito reduzido. Creio ser uma decisão que deveria ser aplaudida e apoiada por todos nós moçambicanos, independentemente de serem ou não adequadas para surtirem o efeito que delas se espera, porque pelo menos demonstram a intenção do governo de atenuar a crise que nos afecta. Só o facto de ter tomado esta decisão, deveria merecer a nossa aprovação e contribuições para que possam de facto ser eficazes.
Ao invés de condenarmos as medidas adoptadas pelo governo, e rotulá-las de “aspirina” ou simples “rebuçados para enganar o povo”, julgo que deveríamos dar o nosso voto de confiança, e apresentarmos propostas para torná-las num grande remédio para curar o grande mal que nos apoquenta.Espanta-me notar que entre os que as rotulam como “rebuçados envenenados” do governo, só se limitam a disseminar um calor intenso contra o governo, como se fossem esses foguetões que vão ao espaço que, como se sabe, nunca emitem também a luz que mostre o caminho que deveríamos seguir para a resolução desta crise que não só afecta Mocambique, bem como ao mundo inteiro. Ao agir assim, as suas críticas não contribuem em nada, porque limitam-se a produzir calor e não luz, que seria neste caso seriam sugestões para sairmos desta crise.Ora, assumindo que esta crise é universal, seria de esperar que todos os moçambicanos se unissem em torno do nosso governo, e cada um e todos nós apresentasse propostas concretas para o nosso país pode sair dela, e não nos limitarmos a condenar uma boa iniciativa porque apenas peca porque o governo carece de recursos suficientes para socorrer todos os cidadãos com renda baixa. Pessoalmente, não vejo nenhum mal em dar um pouquinho mais aos que quase nada têm, comparativamente aos que têm pouco. Um dos aspectos positivos desta medida, é que os beneficiários desta ajuda terão um pouco mais de capacidade financeira para suportar as suas famílias, incluindo aqueles membros que embora adultos, estão desempregados. Isto porque em Moçambique não há um serviço de segurança social com fundos suficientes para acudir todos os desempregados ou aqueles que estão incapacitados de trabalhar por causa da sua avançada idade, e quem garante a sua subsistência são exactamente os seus familiares (in)directos que trabalham. Este é o caso dos idosos sem forças para trabalhar e que recebem o seu pão de cada dia dos seus filhos ou mesmo netos. Sem essa ajuda, os idosos e outros que não conseguem empregar-se estariam condenados a uma verdadeira tragédia. E’ por isso que estas medidas, que visam garantir que as famílias mais vulneráveis tenham pelo menos uma cesta básica, são de louvar. É verdade que é muito pouco, e ainda muitos poucos os que vão receber essa ajuda em todo o país. Na vida é assim mesmo – a ajuda nem sempre chega para todos, daí que o que conta e’ a intenção. Mesmo no seio familiar é assim, quando um pai com muitos filhos e poucos recursos acaba optando por comprar, por exemplo, roupa de uma forma escalonada e não para todos de uma única vez. Até há casos em que os pais são forçados a optar por mandar alguns dos seus filhos à escola, e deixar outros por fora. É óbvio que não se pode condená-los e muito menos acusá-los de discriminarem os seus próprios filhos. O mesmo sucede com estas medidas que, no caso vertente, visam os habitantes menos abastados que vivem nos 11 dos 33 municípios que temos no país. Segundo o comunicado do Conselho de Ministros que deu a conhecer estas medidas, o número dos beneficiários destas medidas nos 11 municípios será de 1,8 milhões de pessoas, o que visto à luz dos dados estatísticos do site CountryStat, correspondem a 40 por cento dos habitantes das zonas urbanas do país. Fontes do governo asseguraram que o que ditou a exclusão dos restantes 22 municípios, foi a exiguidade dos recursos e não a falta de vontade de ajudar também os que vivem nessas cidades. Este não é o primeiro caso do género em Mocambique. De facto, durante os últimos anos, o governo vem dispobilizando os famosos “Sete biliões de meticais” (agora Sete milhões), uma medida que excluía as zonas urbanas onde também existem muitos pobres que gostariam de beneficiar desse fundo para dar corpo aos seus empreendimentos pessoais. Somente a partir deste ano é que o governo passou a contemplar também os referidos “Sete milhões” às zonas urbanas.Agora, que o governo optou pelos municípios das cidades capitais das províncias, pesou a exiguidade dos recursos e não uma discriminação maldosa. Creio que se baseou em factos e dados que pesam mais nestes municípios que nos restantes 22 que não estão agora contemplados. Por exemplo, não fazia muito sentido priorizar o subsídio de transporte para os habitantes de um município como o de Búzi ou Cuamba, onde os seus habitantes residem quase junto ao seu local de trabalho, contrariamente aos residentes de Maputo ou Beira, onde muitos cidadãos vivem a cinco, 20 ou mesmo 30 quilómetros dos seu local de trabalho ou escola. Creio que estes e outros factos são os que pesaram muito nesta opção dos 11 municípios. Foram estes e outros factos que levaram à exclusão de alguns municípios, e não porque o governo está discriminando negativamente os moçambicanos que vivem nesses 22 municípios, como alguns alegam, num claro oportunismo político.
Os críticos, que apenas se limitam a fazer da crítica um exercício de retórica, porque custa propor soluções, cometem um erro ridículo quando imputam as causas do elevado custo dos alimentos à incompetência do governo. Estes críticos limitam-se a fazer uma análise muito simplista e reveladora de que estão a confundir uma floresta com uma árvore. Esta crise que nos afecta é uma floresta enorme, que tem no nosso país como uma das suas árvores apenas. Ela afecta quase todos os países, tendo como principal causa o elevadíssimo custo do petróleo no mercado mundial.O preço recorde de petróleo, que neste caso tem como causa a ocorrência desde 1973 das guerras nos países ou zonas de maior produção como o Médio Oriente, como a que afecta agora a Líbia, está a catapultar os preços dos restantes bens de consumo, porque é do petróleo que se movem tanto as máquinas para produção dos bens que precisamos no nosso dia a dia, como é deste ouro negro, que se movem os meios que transportam os tais bens dos locais de produção aos consumidores. Para os que não sabem, o petróleo é o único produto que, quando sobe de preço, causa inflação que, em condições normais, só ocorre quando há maior procura de bens e pouca oferta, fazendo com que os oportunistas se aproveitem para a especulação de preços. O petróleo causa inflação, mesmo quando a oferta é maior que a procura, porque o seu custo elevado faz com que os produtores, transportadores e vendedores gastem mais em quase todas as operações e para recuperarem o que gastam pela aquisição do combustível têm que passar os custos ao consumidor. Por exemplo, há cerca de 10 anos, um camião cavalo transportando arroz podia ir de Maputo para Cabo Delgado ou Niassa gastando apenas 4.000,00 meticais em combustível, quando o seu preço era mais ou menos a 10 meticais o litro. Hoje, o mesmo camião gasta cerca de 20 mil meticais para percorrer a mesma distancia, porque o litro está a cerca de 40 meticais, ou seja quase quatro vezes mais caro comparativamente há uma década. Um dos dados estatísticos que consta no site CountryStat Mozambique lançado aqui em Maputo no dia 10 do mês passado, deixa tão claro quão o custo dos combustíveis disparou em espiral nos últimos 39 anos. Pouco antes da eclosão da guerra israelo-árabe em 1973, o barril custava uns meros três dólares, isso mesmo, três dólares, mas hoje está acima dos 115 dólares.
Isto faz com que se gaste muito mais dinheiro para abastecer os mesmos camiões, comboios, aviões e outros meios de transporte para a produção e transporte dos bens que consumimos. Isto explica porque é que o custo dos alimentos está, segundo o mesmo site CountryStat Mozambique da FAO, a atingir agora preços recordes nunca antes registados na história da humanidade.É, pois, errado dizer que esta crise deve-se à incapacidade do governo de Guebuza, porque se assumirmos que esta é a causa de facto, então o mundo estaria cheio de governos “Guebuzianos” ou ineptos, porque este custo dos alimentos ocorre em todos os países.Não podemos cometer esse grave erro de acusarmos o nosso governo por um problema do qual não é responsável, bem como também não é o único sem uma solução ideal para o mesmo. Até deveríamos nos congratular quando ainda opta por dar um pouco mais aos que têm muito menos, porque noutros países os governos têm estado diminuir os salários ou abolir os subsídios que pagavam aos seus cidadãos. Assim está sendo feito mesmo na Europa Ocidental, onde até há uns anos, os seus habitantes viviam tão folgadamente que pareciam estar num paraíso, onde existe tudo que é bom. Por exemplo, em Portugal, o governo decretou a redução dos salários superiores a 1.500,00 Euros, ao mesmo tempo que eliminou uma série de subsídios, tais como o 13/o vencimento. Imagine-se o que diriam os que são contra as medidas que se adoptaram aqui no nosso país se estes cortes fossem feitos entre nós.Devemos aplaudir a intenção do nosso governo tal como aquele chinês que gostou da visita do seu amigo não obstante ter chegado apenas com algumas penas. Devemos ainda deixar de viver numa permanente angústia, como bem o diz Mocumbi, o que só é possível se tomarmos em conta donde e como partimos nesta viagem pelo desenvolvimento do nosso país em que estamos, sob pena de morrermos crianças adultas, porque, segundo Cícero, assim ocorre com todos os que não se valem do passado para avaliar o presente e perspectivar o futuro. Se mesmo os países há centenas de anos na senda do seu desenvolvimento estão a braços com esta mesma crise, como é que não podemos compreender que esta é uma fatalidade universal e não resultado da incompetência do nosso governo ou das suas supostas políticas erradas.(Gustavo Mavie)
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